O GES era “um castelo de cartas”, os reguladores tinham “cara de póquer” e as irmãs de Salgado que fazem “bolos para vender”

O maior industrial do país, Pedro Queiroz Pereira, foi o contraponto à tensão de terça-feira na comissão de inquérito. Aqui se fala, também, de desavenças familiares mas, sobretudo, conta-se como o empresário resolveu “levantar a caça, como se diz na gíria”, para impedir Salgado de tomar conta do seu grupo.

Foto
Pedro Queiroz Pereira durante a audição desta quarta-feira Miguel Manso

Pedro Queiroz Pereira é, como o descreveu Fernando Negrão, presidente da comissão parlamentar de inquérito, “um homem de acção”. Um “industrial, comerciante e empresário”, como o próprio se definiu. Alguém que produz coisas tão sólidas como o cimento. Naturalmente, procurou distanciar-se das “operações de natureza financeira muito imaginativas” e dos off-shores que concentram a atenção dos deputados no caso BES.

Para Ricardo Salgado estavam guardadas subtis avaliações: “Ele não lida maravilhosamente com a verdade. Tem outras qualidades, certamente. E se o grupo chegou onde chegou a ele o deve muito”. E onde chegou o grupo? Bom… “Eu já percebia que as coisas não corriam bem no GES há muitos anos. Desde o início do século [XXI] já sentia que algo não corria bem.”

“PQP”, como é conhecido o industrial, só enfrentou as hostilidades há cerca de dois anos. Quando Salgado tentou (coisa que nega e ainda na terça-feira o fez nesta mesma comissão) controlar o grupo Semapa, da família Queiroz Pereira. Através das irmãs de PQP, Maude e Margarida: “Ele já tinha comprado a uma, às escondidas, e preparava-se para comprar a outra”, explicou o industrial aos deputados, usando também o verbo “seduzir” para transmitir a mesma ideia.

Salgado apresentou uma ideia diferente. Disse que apenas serviu de intermediário entre PQP e as suas irmãs, procurando defender os interesses destas. Perante isto, o industrial dobrou a aposta (como no póquer, de que falaremos de seguida): “As irmãs do doutor Ricardo Salgado ficam à noite em casa a fazer bolos para vender e ele nunca se preocupou em defendê-las”.

Família à parte, os negócios também não aproximavam PQP de Salgado. “Os bancos em Portugal eram donos de tudo. Compravam 3, 4 ou 5% e depois mandavam. […] Naturalmente, não achava muita graça que uma empresa nesta situação comprasse a minha e depois a usasse como usou a PT”, afirmou. Mesmo assim, demorou seis meses a escrever a primeira carta ao Banco de Portugal, dando conta dos problemas que encontrou (através de uma análise financeira e fiscal das holdings do GES). Os reguladores, com que só se reuniu por uma vez, mostraram uma “cara de póquer”, sem emoções.

Mas agiram (tarde ou a tempo, as opiniões dividem-se). PQP preferiu enterrar o machado de guerra, com um acordo que acabou com a histórica ligação entre os grupos familiares. “Imagino que o facto de eu ter ido ao BdP certamente terá assustado o Dr. Ricardo Salgado. Dessa via poderá ter contribuído para fazermos um acordo em Novembro [de 2013]”, disse.

O acordo obrigou-o a afastar-se do palco no GES. “Tenho que dançar ao som da música que toca…”. Mas continuou a falar com um dos primos, Ricciardi, que descreve como vivendo “em pânico”. E, até o acordo ser celebrado, recebeu um estranho telefonema… “O doutor [Eduardo] Catroga… Ficámos muito curiosos por saber a título de quê e de quem é que vinha… Deveria vir de algum lado. Mas sempre disse que era uma “iniciativa pessoal”. Seria da parte de Salgado, como PQP desconfia, ou da parte do primeiro-ministro? Queiroz Pereira não esclareceu.

Sugerir correcção
Ler 5 comentários