Passos sonda acordo antes do fim do resgate, UGT rejeita participar no “folclore eleitoral”
Carlos Silva só está disponível para um acordo depois das europeias. CAP admite actualização do salário mínimo ainda este ano, CCP quer contrapartidas para futuro.
Mas rejeita fazê-lo durante o calendário que antecede a saída oficial da troika, a 17 de Maio, e as eleições europeias em Maio, dia 25 desse mês. Já a CGTP diz que é preciso separar o “trigo do joio” e garantir que a actualização da remuneração mínima avança sem outras contrapartidas.
À saída do encontro com Passos Coelho, Carlos Silva afirmou: “Temos todas as condições para conseguir um acordo” entre as eleições e o início do Verão.
Segundo o secretário-geral da UGT, o primeiro-ministro referiu que seria “importante” a celebração de um acordo antes da saída do fim do período oficial do empréstimo da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional.
“Se houver condições da parte dos parceiros sociais para haver um acordo antes da saída da troika, era importante como sinal à troika de que há um amplo consenso social e isso seria importante até para os mercados financeiros”, disse Carlos Silva, referindo-se à opinião transmitida por Passos Coelho. “Acordos de concertação: depois de 25 de Maio”, insistiu.
“A UGT reafirmou aquilo que já tem vindo a dizer nos últimos dias: nós não estamos em condições nem queremos participar no folclore eleitoral, entendemos que há eleições no dia 25 de Maio e que se é necessário haver um acordo até ao Verão, vamos ver qual é a disponibilidade do Governo”, insistiu, ironizando: “O Verão começa a 21 de Junho…”.
Durante o encontro, a confederação propôs a realização de uma reunião de concertação até ao final do mês, encontro a que, segundo Carlos Silva, o primeiro-ministro não fechou a porta.
Entendimento diferente sobre o momento da negociação de um acordo tem a Confederação dos Agricultora de Portugal (CAP), que pela voz de João Machado diz que nunca viu qualquer “impossibilidade de negociar com o Governo e com os outros parceiros sociais durante a vigência” do programa de resgate. Agora, com o fim do resgate à porta das eleições europeias, nada muda, diz o presidente da CAP. “Não vemos que, agora, até ao dia 17 de Maio haja alguma impossibilidade”.
A actualização do salário mínimo nacional (SMN), congelado desde 2011 nos 485 euros, foi um dos temas abordados na audição. Para a UGT, é preciso levar o tema à Concertação Social e, caso seja celebrado um acordo no início do Verão, a subida deve ser imediata. Quando questionado sobre a disponibilidade da central em negociar uma actualização apenas para 2015, como defendem as confederações patronais, Carlo Silva diz que “não faz sentido estar a discutir o aumento do salário mínimo nacional a seis ou a sete meses; não faz sentido”.
Nem a questão do salário mínimo, nem um compromisso de muito curto prazo foi abordado na reunião de Passos com a delegação da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), mas nem por isso António Saraiva deixou à saída do encontro de marcar posição sobre o tema. Sem se referir a um quadro temporal específico, o presidente da confederação patronal considerou importante definir “uma matriz de compromissos possíveis”, de acordos pontuais “nesta ou naquela matéria”, porque há pontos do acordo de 2012 que a CIP diz não terem sido cumpridos. Em causa, diz, estão matérias que têm a ver com a necessidade de recapitalização das empresas e medidas que assegurem a competitividade das empresas.
Questionado se Passos considerou importante haver um compromisso ainda antes da saída oficial da troika, como referido pela UGT, António Saraiva disse que em relação à CIP a questão “não foi suscitada, porque provavelmente cada parceiro tem o seu conteúdo de matérias para falar” com o primeiro-ministro.
CGTP afasta contrapartidas
Se confederações sindicais e patrões concordam em discutir o tema, divergem quanto ao valor e quanto ao momento da actualização. A CGTP reclama uma actualização do SMN para 515 euros a partir de 1 de Junho, enquanto a UGT admite que ficaria satisfeita com uma subida para os 500 euros e avisa que, a celebrar-se um acordo no Verão, as medidas que nele constarem devem entrar em vigor imediatamente.
A CGTP, que foi recebida depois da UGT, acusa o Governo de querer introduzir a discussão do salário mínimo nesta altura “como moeda de troca de novas concessões dos sindicatos e dos trabalhadores às entidades patronais”, nomeadamente com a “alteração da lei dos despedimentos”.
“Não se pode passar por um processo” de negociação sobre outras matérias “sem encerrar este”, disse, referindo-se ao facto de os parceiros sociais terem assinado, em 2006, um acordo ainda com o Governo de José Sócrates, sobre o SMN. “O que está em desenvolvimento é uma tentativa de reduzir o valor do pagamento do trabalho extraordinário, reduzir o valor dos subsídios, reduzir o valor dos abonos…”, afirmou Arménio Carlos, garantindo que a CGTP “não entra nesse processo”.
Ao contrário da abertura à negociação revelada pela UGT, o secretário-geral da CGTP diz que “não há nada a conceder para um acordo que já foi estabelecido” e que “está a ser incumprido”.
Acordos por cumprir
Do lado dos patrões, embora as confederações não fechem a porta a uma actualização do SMN este ano, apontam para uma mudança apenas no próximo ano, com a CIP a considerar “razoável” que a discussão se situe numa subida para os 500 euros. Este era o valor previsto no acordo de 2006, para a actualização do salário mínimo em 2011, compromisso que acabou por ficar na gaveta. Não só a actualização para os 500 euros não se concretizou, como desde aí ficou congelado nos 485 euros.
A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), por seu lado, defende que a actualização aconteça apenas em Janeiro de 2015, para que as empresas com contratos anuais tenham tempo para se adaptar, exige contrapartidas para que seja negociado um compromisso prevendo um aumento faseado depois desta actualização. “Um primeiro aumento deverá ser para os 500 euros para encerrar um capítulo do acordo anterior. Aumentos posteriores, estamos abertos a negociar de uma forma escalonada, de modo a podermos ter um projecto para vários anos” relacionado com a competitividade e com a economia", disse.
A CAP admite, no entanto, não ser “impossível” que o aumento produza efeitos ainda este ano e rejeita que as medidas viradas para as empresas e para a competitividade sejam uma “moeda de troca” para a actualização do salário mínimo. Embora o presidente da CAP, João Machado admita que as duas matérias se coloquem em conjunto, diz que em causa não estão “contrapartidas”, porque há dois acordos “que não estão cumpridos”: o de 2006 sobre o salário mínimo e o de 2012, assinado entre os patrões, a UGT e o Governo. O “momento de cumprir um deles é também o momento de falarmos sobre aquilo que [o acordo mais recente] traz de vantagens às empresas” e que não foram cumpridas desde aí, reforçou.
E referindo-se em particular a este último compromisso, considerou que são necessárias medidas concretas para baixar os custos da energia, da água e de outros “custos de contexto”. Quanto a questões de medidas na área do mercado de trabalho, João Machado diz que a “grande reforma” está feita e que são apenas precisos “pequenos afinamentos”, nomeadamente quanto ao pagamento das horas extraordinárias.
Em Maio do ano passado, num debate parlamentar, Passos Coelho considerou que, quando um país enfrenta um elevado nível de desemprego, a “medida mais sensata” a tomar seria “exactamente a oposta [ao aumento do salário mínimo]”.
Quase um ano depois, quando no último domingo veio abrir a porta a uma negociação desta matéria em conjunto com outros temas na Concertação Social, o PSD veio defender a posição do primeiro-ministro, com Marco António Costa a justificar que a situação económica é diferente, porque na altura “o desemprego estava a crescer e havia uma recessão económica”.
A ronda de audições com os parceiros sociais acontece um dia depois de Passos ter recebido as delegações dos partidos com assento parlamentar. Do lado do Governo, a acompanhar Pedro Passos Coelho nos encontros desta quarta-feira estão o ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, Pedro Mota Soares, e o secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, Carlos Moedas.
Notícia actualizada às 18h24