Governo propõe lista de critérios para justificar o despedimento por extinção de posto de trabalho

Sindicatos contestam critérios “à la carte” para aumentar os despedimentos e especialista alerta para inconstitucionalidade da proposta do Governo.

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A taxa de desemprego para o conjunto do ano foi de 12,4%. Miguel Madeira

De acordo com a proposta elaborada pelo ministério do Emprego e da Segurança Social, a que o PÚBLICO teve acesso, quando na mesma secção houver vários postos de trabalho, a escolha do trabalhador a despedir “deve observar critérios relevantes e não discriminatórios, designadamente: habilitações académicas e profissionais, experiência profissional, avaliação de desempenho, custo do trabalhador para a empresa, antiguidade, situação económica e familiar”.

Estes critérios pretendem responder às exigências do Tribunal Constitucional (TC) e foram apresentados durante esta sexta-feira a alguns dos representantes dos parceiros sociais pelo secretário de Estado do Emprego, Octávio Oliveira. As confederações sindicais ainda não foram convocadas.

Para Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, a proposta de que tomou conhecimento pela comunicação social é “uma provocação”, que “vai contra o entendimento do Tribunal Constitucional e que abre uma estrada de critérios para que as entidades patronais tenham critérios à la carte para despedir quem entendem”.

Também Sérgio Monte, dirigente da UGT; contesta os critérios, por serem “demasiado latos”. “A proposta não resolve a questão da subjectividade colocada pelo Tribunal Constitucional e os critérios não têm qualquer hierarquia. O empregador pode escolher o que mais jeito lhe dá”, realça, acrescentando que, além disso, a proposta permite que tanto sejam esses, como outros critérios.

Para António Monteiro Fernandes, professor do ICSTE e especialista em legislação laboral, a proposta não passará o  teste da constitucionalidade. “No essencial, mantém-se a solução anterior – a mera exigência de que a escolha do trabalhador a despedir obedeça a “critérios relevantes e não discriminatórios” definidos pelo empregador”. Contudo, lembra, “o Tribunal Constitucional considerou essa referência vaga, com uma abertura a subjectivismos e eventuais arbítrios do empregador”.

Para o especialista, a alteração agora proposta acrescenta “apenas um conjunto de exemplos que, claramente, deixam ampla margem de indeterminação para a definição de critérios relevantes. O empregador pode escolher um exemplo ou nenhum, e decidir de outra maneira”, alerta.

Monteiro Fernandes levanta uma preocupação, que é partilhada pelos sindicatos: “Antiguidade significa o quê? Que se despede o mais antigo ou o mais recente? Experiência profissional quer dizer prioridade aos mais experientes ou aos que se encontram em início de carreira?”.

O professor da Universidade Católica, Pedro Furtado Martins, admite que a proposta que o Governo colocou à discussão poderá não corresponder às exigências do acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que chumbou vários artigos do Código do Trabalho, nomeadamente as novas regras para despedir por extinção de posto de trabalho.

O especialista diz que se o TC voltar a ser chamado a pronunciar-se sobre as alterações legislativas pode ter um de dois entendimentos. “Ou entende que os exemplos ajudam a compreender o que são critérios relevantes e não discriminatórios. Ou continua a achar que deve haver critérios fixos”, disse ao PÚBLICO, reconhecendo que na sua opinião o primeiro seria o entendimento mais correcto.

Nesta proposta de alteração aos artigos chumbados pelo TC, o Governo repõe também a obrigatoriedade de o empregador procurar posto de trabalho compatível com o perfil do trabalhador antes de decidir despedir, tanto no caso da extinção de posto de  trabalho como da inadaptação.

Até Agosto de 2012, a lei determinava que em caso de despedimento por extinção de posto de trabalho, saíam primeiro os trabalhadores mais recentes na empresa e no posto de trabalho. Mas com a revisão do Código do Trabalho que entrou em vigor no ano passado, os critérios de selecção dos trabalhadores passaram a ser determinados pela empresa, desde que fossem “relevantes e não discriminatórios” e deixou de ser obrigatório procurar posto de trabalho compatível antes de formalizar o despedimento.

A norma acabou por ser chumbada pelo TC que considerou que essa nova redacção violava a proibição do despedimento sem justa causa. Os critérios, referia o acórdão publicado em finais de Setembro, são “vagos” e “indeterminados”. Em resultado desse acórdão, a norma desapareceu do CT e passou a vigorar o critério anterior da antiguidade e a obrigatoriedade de procurar posto de trabalho compatível.

O PÚBLICO tentou contactar os representantes das confederações patronais, mas até ao fecho da edição tal revelou-se impossível.

Notícia actualizada 21h23 com mais informação e reacções

 

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