Governo promete, mas "não garante" redução gradual da sobretaxa de IRS
Ministra das Finanças deixa promessas para a próxima legislatura, embora reconheça que não as pode dar como garantidas. Governo quer reposição gradual dos cortes na função pública, baixa progressiva da sobretaxa e redução do corte da CES para metade em 2016.
A ministra das Finanças, que divulgou esta tarde as linhas de orientação a enviar à Comissão Europeia, reconheceu, porém, que o executivo não se pode comprometer com as medidas que está agora a apresentar, uma vez que são para aplicar na próxima legislatura. Ao abrigo das novas regras da governação económica na União Europeia, o Governo tem de enviar o seu programa de reformas plurianual à Comissão Europeia até ao fim de Abril, para que Bruxelas se pronuncie em Maio.
Na proposta para a sobretaxa de IRS, que vigora desde 2013, os contribuintes só deixam de a pagar em 2019. Neste cenário, a descida começa no próximo ano e prolonga-se pelos três anos seguintes. O impacto negativo na receita fiscal é de 760 milhões de euros em quatro anos.
Maria Luís Albuquerque explicou, em conferência de imprensa, que a redução da sobretaxa em 2016 é uma medida separada daquela que foi incluída no Orçamento de 2015 prevendo que, no próximo ano, haja um reembolso (parcial ou total) da sobretaxa relativamente ao valor pago pelos contribuintes este ano, caso as receitas do IVA e do IRS fiquem acima da previsão inscrita no orçamento.
Para 2016, a redução prevista é de 0,875 pontos, ou seja, um quarto da sobretaxa (para 2,625%), o mesmo ritmo de corte programado para cada um dos anos seguintes até a taxa extraordinária desparecer, adiantou Maria Luís Albuquerque. Por si só, o impacto anual é de 190 milhões de euros. Mas as contas não estão feitas em relação ao impacto orçamental das duas medidas no próximo ano: o reembolso que possa vir a acontecer e a descida da sobretaxa.
Questionada sobre esse efeito nas contas públicas, a ministra disse não ter um valor calculado, tendo em conta que não se sabe se o crédito fiscal da sobretaxa se concretiza. “Neste momento não temos estimativa”, afirmou, mostrando-se, no entanto, convicta de que o reembolso vai acontecer. Embora o impacto nas contas do Estado se faça sentir no mesmo ano, a ministra distinguiu a natureza das duas medidas (crédito fiscal e redução de taxa) e garantiu que, em termos orçamentais, uma “não prejudica a outra”.
Em relação aos cortes na função pública, o Governo prevê a reposição gradual da redução remuneratória a um ritmo de 20% ao ano, à semelhança do que já está a acontecer em 2015. A medida, afirmou Maria Luís Albuquerque, será integrada no Orçamento do Estado para 2016 e deverá custar 150 milhões de euros por ano.
Em 2015, os trabalhadores do Estado que têm salários ilíquidos acima de 1500 euros já viram revertidos 20% dos cortes e a medida agora apresentada prevê que o ritmo de reversão se mantenha nos anos seguintes.
Confrontada sobre como pode o executivo assegurar que as medidas agora prometidas vão para a frente, tendo em conta que são para aplicar em 2016, numa próxima legislatura, a ministra reconheceu: “O Governo não garante estas medidas. Mas com este Governo os portugueses sabem com o que contam”. E aproveitou para deixar uma farpa ao PS, criticando o que considera ser a ausência de propostas do maior partida da oposição. “Até agora não sabemos nada”.
“Aquilo que vincula o país [nas medidas a apresentar à Comissão Europeia] é o cumprimento das regras [orçamentais]”, afirmou. E voltaria a criticar o Partido Socialista. O contributo do PS, disse, é “demasiado vago para ter utilidade” para a estratégia apresentada pelo Governo, embora a posição da ministra seja de convite ao envolvimento do PS e de “abertura para acolher propostas que venham a ser apresentadas na Assembleia da República” pelos vários partidos.
A diminuição da sobretaxa, que o CDS queria ver já incluído no orçamento deste ano mas que ficou adiada, estará ainda dependente da avaliação da reversão dos cortes dos funcionários públicos, esclareceu o ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, Luís Marques Guedes.
“Se, por exemplo – e estou a colocar como mera hipótese –, a opção do país for repor mais depressa os salários, provavelmente não vai poder retirar a sobretaxa tão depressa”, afirmou, lembrando a decisão do Tribunal Constitucional sobre os cortes nas remunerações do sector público, que apenas viabilizou o modelo de reposição de 20% dos cortes em 2015, porque não havia ainda informação orçamental suficiente sobre os anos seguintes.
“Da mesma maneira que teve que haver um mix na colocação das medidas para encontrar resoluções para tirar o país da situação de emergência orçamental em que estava – e o Tribunal Constitucional sempre apontou para que as medidas fossem transversais a toda a sociedade e não se entrasse em grupos exclusivos [funcionários públicos] –, o desmontar de todas essas medidas de austeridade também de assistir a todos os sectores da sociedade portuguesa”, argumentou Luís Marques Guedes.
No plano de reformas a enviar a Bruxelas, o Governo confirma o que vai acontecer à contribuição extraordinária de solidariedade (CES), que este ano se aplica às pensões acima de 4611 euros (valor bruto). A ministra das Finanças confirmou que o corte vai reduzir-se para metade no próximo ano e que “em 2017 já não se aplica”.
No próximo ano, a taxa de redução a aplicar sobre o valor que excede os 4611,2 euros passa a ser de 7,5% (em vez de 15%) e a taxa aplicada ao valor acima de 7126,7 euros será de 20% (em vez dos acuais 40%).
TSU é uma ideia
Se se confirmar que Portugal consegue atingir um défice inferior a 3% no fim do ano, saindo do procedimento por défice excessivo, a intenção do Governo é “vir a utilizar” a chamada cláusula de flexibilidade orçamental prevista nas regras europeias para poder lançar investimentos ao abrigo do Plano Juncker em infraestruturas energéticas e pôr em marcha medidas que “reduzam a carga fiscal e contributivo sobre o trabalho”, anunciou Maria Luís Albuquerque.
Mas, para já, não há qualquer medida concreta que passe por uma redução da Taxa Social Única (TSU) paga pelas empresas, assegurou a ministra das Finanças. A ideia do Governo, disse, é que “uma das hipóteses que pode ser considerada para a utilização dessa cláusula é uma redução dos custos sobre o trabalho”. E é nesse cenário que a reforma pode vier a ser equacionada.
“Não houve uma discussão em Conselho de Ministros desta medida em particular”, referiu, vincando depois que “não há nenhuma medida para propor a Comissão Europeia sobre a TSU” e que o Governo está apenas a sinalizar uma intenção. O que há, disse, é uma ideia que “parte de observação empírica” e de “muitos estudos” sobre os impactos positivos da redução dos custos do trabalho.
Questionada sobre qual a observação empírica e os estudos concretos em que se baseia o Governo para elencar esta reforma, Maria Luís Albuquerque explicitou que foram feitas “avaliações de impacto” por parte do FMI, do BCE e da Comissão Europeia, e disse haver uma “múltipla evidência sobre esta matéria” em relação ao impacto da medida no mercado de trabalho.
A ministra fez questão de frisar que a descida da TSU não é uma cópia da medida apresentada por Pedro Passos Coelho em Setembro de 2012 – e que sob forte contestação social não chegaria a sair do papel – prevendo uma descida das contribuições das empresas e um aumento das quotizações dos trabalhadores. “Não será uma reedição da medida que foi pensada em 2012. Ou seja, não estamos a equacionar haver uma compensação”, vincou.