Governo avança com nova reforma laboral mas desta vez sem a UGT

Mudanças nos critérios para o despedimento por extinção de posto de trabalho não convenceram a UGT e foram recebidas com pouco entusiasmo pela CIP. Antes da troika sair de Portugal, UGT diz que não faz mais acordos.

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Ministro Mota Soares disse que algumas sugestões da UGT foram integradas na reforma Enric Vives-Rubio

“O papel do Governo na concertação social é aproximar os parceiros. Não foi possível neste caso em concreto, daí a necessidade de respeitar o espírito do acordo [para o Crescimento e o Emprego] de 2012”, justificou.

Do lado da UGT, Carlos Silva acusa o Governo de abrir a porta aos despedimento à la carte e diz que não haverá mais acordos até que a troika saia do país. A Confederação Empresarial de Portugal (CIP) também não recebeu a proposta com entusiamo. O presidente, António Saraiva, diz que não se revê na proposta e que os critérios não são adequados. A aposta da confederação é nos aspectos “com impacto permanente na vida das empresas”, como o pagamento do trabalho extraordinário, matéria que quer levar à concertação social “o mais breve possível”.

A redacção final da proposta que será enviada para o Parlamento não foi divulgada, mas a julgar pelas declarações de Mota Soares as alterações face à proposta que saiu da concertação social no final de Janeiro foram poucas. Da lista de critérios, desapareceu a situação económica e familiar do trabalhador, tal como a UGT exigia, e os restantes seguem uma ordem. O primeiro continua a ser a pior avaliação de desempenho, a novidade é que passa a referir-se que os trabalhadores têm de conhecer previamente os parâmetros dessa avaliação. “Dessa forma são afastadas quaisquer simpatias”, garantiu o ministro, referindo referir que esta era também uma exigência da central sindical.

Seguem-se as menores habilitações académicas e profissionais, a onerosidade pela manutenção do vínculo laboral (na versão anterior da proposta falava-se em menor custo), a menor experiência na função e a menor antiguidade na empresa, que actualmente é o principal e único critério a seguir pelas empresas quanto têm de escolher o trabalhador a despedir.

Avaliação continua a levantar dúvidas
As mudanças no critério relacionado com a avaliação não foram suficientes para dissipar todas as dúvidas, que o próprio ministro também não escalreceu. Questionado sobre se a proposta diz em concreto quanto tempo antes o trabalhador tem de conhecer os parâmetros, Mota Soares limitou-se a responder que “a avaliação de desempenho tem de ser feita com base em critérios fixados previamente e conhecidos”. “Não é no momento do despedimento que a empresa vai fazer avaliação de desempenho”, acrescentou.

Filipe Fraústo da Silva, advogado da Uría Menéndez - Proença de Carvalho, diz-se apreensivo com este critério, ressalvando que não conhece o texto final da proposta. “A relevância do resultado da avaliação de desempenho deveria depender pelo menos de dois factores: a sua prévia regulamentação em convenção colectiva ou regulamento interno, e a pré-existência de um ciclo completo de aplicação do processo de avaliação”, recomenda. “Não sei se não reclamaria mesmo um intervalo de tempo entre o encerramento desse ciclo e o início do procedimento de despedimento por extinção de posto de trabalho que pretendesse fazer uso do seu resultado como critério de escolha”, acrescenta.

O avogado lembra que a avaliação “tanto pode ser algo da maior seriedade, mesmo nas margens de subjectivismo que sempre comporta, como um meio de colocar a jusante os receios que o Tribunal Constitucional (TC) demonstrou ter em face da devolução ao empregador da eleição de critérios relevantes e não discriminatórios, porque a avaliação pode ser menos rigorosa, nada rigorosa ou até manipulável”.

Sandra Silveira, advogada da Cuatrecasas, Goncalves Pereira, também reconhece que poderia haver a referência a um ciclo de avaliação para tornar o critério mais objectivo.

Tanto a UGT como a CGTP, central que desde o início se demarcou da proposta do Governo, consideram que o critério da avaliação continua subjectivo e pouco “densificado”. As organizações consideram que a proposta não respeita o acórdão do TC e garantem que tudo farão para que o despedimento por extinção de posto de trabalho volte a ser apreciado pelos juízes.

Já o Governo entende que as alterações ao Código do Trabalho agora aprovadas “visam, por um lado, dar cumprimento aos compromissos assumidos com a maioria dos parceiros sociais no Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego, e suprir as declarações de inconstitucionalidade” do TC.

Entendimento semelhante tem Tiago Cortes, advogado da PLMJ: “Do ponto de vista jurídico, a proposta continua a ser à prova de bala. São critérios identificados claramente e se houver utilização abusiva temos os tribunais”.

Também Sandra Silveira, da Cuatrecasas, lembra que um dos principais problemas apontados pelo TC foi o desaparecimento dos critérios. “Voltamos a ter a lista de critérios e essa questão foi ultrapassada”, diz, embora admita que alguns não são totalmente objectivos. “Antes bastava olhar para datas, agora não”, refere.

Esta foi a terceira vez que o Conselho de Ministros apreciou a questão dos despedimentos por extinção de posto de trabalho. A aprovação da proposta de lei, que agora seguirá para a Assembleia da República, foi adiada por duas vezes na tentativa de conseguir um acordo com todos os parceiros que assinaram o acordo para o Crescimento e o Emprego em 2012. Apenas a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal apoiou publicamente a medida.

A proposta de lei agora aprovada é o culminar de um processo que se iniciou em Agosto de 2012, quando entrou em vigor a terceira alteração ao Código do Trabalho que eliminava o critério da antiguidade no despedimento por extinção de posto de trabalho. Em vez disso, a empresa poderia escolher os critérios, desde que fossem “relevantes e não discriminatórios”. O TC, em resposta a um pedido de fiscalização sucessiva da oposição, chumbou o artigo, repescando-se o critério da antiguidade. Porém, o Governo entendeu que havia margem para reformular o artigo e propôs um conjunto de critérios, sem qualquer ordem obrigatória. Perante os alertas de que isso poderia voltar a suscitar questões constitucionais, moderou a proposta.

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