Fisco e EDP discutem em Maio nos tribunais indemnização de 1,4 milhões
O processo movido pela EDP contra o Estado já tem a primeira audiência marcada. Ministério Público argumenta que não há conduta ilícita, nem lugar a indemnização.
O processo deu entrada em Fevereiro de 2014 e a contestação do Ministério Público (MP) chegou ao Tribunal Administrativo de Lisboa já depois do Verão. A primeira audiência está marcada para 19 de Maio e o Estado irá defender que não houve conduta ilícita, nem há lugar a indemnização, de acordo com o processo consultado pelo PÚBLICO.
A EDP-Serviço Universal acusa o fisco de, vendo-se confrontado com o pedido de reembolso no dia 7 de Dezembro de 2011, e sabendo que não o conseguiria pagar em 30 dias, ter avançado com o pedido de garantia para interromper a contagem de juros indemnizatórios. Uma acusação que o MP (representante legal do Estado) refuta, adiantando que o procedimento foi o normal tendo em conta que o pedido da EDP (relativo a reembolsos de compras de energia em Espanha entre Março de 2007 e Outubro de 2011) reunia vários “critérios susceptíveis de constituir risco acrescido ao reembolso solicitado”.
Foi por isso que foi seleccionado para inspecção pela matriz de risco do sistema informático do fisco, para se perceber se reflectia “de forma verdadeira e apropriada as operações praticadas pela empresa”, explica o MP. A inspecção ficou concluída no final de Maio e, durante o processo, a EDP recebeu 14 notificações para apresentar esclarecimentos adicionais.
Segundo a AT, foram vários os critérios que levaram a que o pedido da EDP fosse seleccionado para análise de risco. Além de se tratar de um primeiro pedido de elevado valor, tratava-se também de um reembolso não gerado essencialmente por aquisições de imobilizado, relativo a reportes há mais de três períodos (fiscais), que continha erros como números de identificação fiscal inexistentes ou errados e provinha de um contribuinte com “crescimento significativo em operações isentas com direito à dedução”.
Tratava-se por isso de uma análise complexa, que obrigava a diversos procedimentos de auditoria, pelo que os serviços de inspecção concluíram que jamais estaria fechada no prazo de 30 dias (até 6 de Janeiro) e que justificaria a exigência de garantia face ao elevado montante de crédito acumulado de há vários anos. Por outro lado, o MP recorda também que a possibilidade de o fisco exigir garantia, caução ou fiança “quando a quantia a reembolsar for maior que 30 mil euros” está prevista na lei.
Já os advogados da EDP estranham que a notificação para a “garantia indevida” tenha chegado a 5 de Janeiro, um dia antes do fim do prazo de reembolso, e só dez dias depois de ter sido emitido o despacho da Direcção-geral dos Serviços de Reembolso do IVA (DGSR) a confirmar a exigência de garantia. Falam mesmo numa “leitura perversa da lei”, pois quanto mais próximo do fim do prazo do reembolso for pedida a garantia, mais o fisco fica salvaguardado dos juros indemnizatórios.
Três garantias bancárias
Assim, a eléctrica diz ter-se visto obrigada a negociar com várias instituições de crédito, acabando por entregar, a 20 de Janeiro, três garantias constituídas junto do BCP (40 milhões de euros), do BES (40 milhões) e do Banco Popular (48 milhões). São os custos das garantias (737 mil euros) e os prejuízos sofridos com a mora no reembolso de IVA (684 mil euros), que a empresa agora reclama. Este dinheiro que esteve indisponível poderia ter sido utilizado para amortização parcial de financiamentos decorrentes da compra de electricidade, dizem os advogados da EDP.
Notam ainda que a eléctrica deveria ter sido dispensada da obrigação pelo facto de o reembolso não representar um risco para o Estado, tendo em conta o património da empresa e o facto de a AT estar ciente do motivo do atraso do pedido (que inclusive tinha motivado uma carta enviada em 2010 por Mexia ao secretário de Estado das Finanças) e de em 2010 a empresa já ter sido alvo de uma inspecção (relativa à actividade de 2008) em que nenhuma questão sobre o IVA foi suscitada.
O MP diz reconhecer a idoneidade e valor económico da EDP, mas entende que a empresa “não goza de qualquer privilégio especial (…) pelo que o pedido de garantia foi efectuado à luz dos normativos legais”. Defende ainda que a inspecção de 2008, por ser de âmbito geral, não implicou uma análise exaustiva ao IVA que permitisse a validação automática do reembolso.
Por haver diferenças nas regras de facturação dos códigos do IVA espanhol e português, a EDP entende que só em meados de 2011 a AT terá fixado as condições em que admitia a dedução do IVA com compras em Espanha, permitindo-lhe avançar para o pedido de reembolso. Já o MP diz que a EDP, sabendo que estava e continuaria a estar em situação de crédito de imposto, deveria ter pedido reembolsos mensais, com valores muito menores, com análises mais fáceis e rápidas. Se não o fez, foi por opção, defende a representante do Estado.
A procuradora do MP sustenta que não se verifica a existência de qualquer conduta ilícita por parte da AT, nem há dever de indemnização, contestando o meio processual utilizado pela empresa – uma acção de responsabilidade civil. Diz o MP que “não se verifica o nexo de causalidade entre a conduta [da AT] e o dano já que foi a autora [EDP] que deu causa ao mesmo”, pois não requereu o pagamento das quantias referidas através de um processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial.
“A impropriedade do meio processual constitui excepção dilatória e determina a absolvição” do réu (Estado), refere a contestação do MP. Uma interpretação que entretanto já foi contestada pela EDP, que entende que o regime de responsabilidade civil é aplicável à determinação de responsabilidade civil extracontratual da AT.