Espanha recebe chanceler alemã, que vem à procura de engenheiros
Apesar de oficialmente não constar da agenda, existe a expectativa de que na reunião, na qual também participam entidades patronais e sindicatos dos dois países, seja abordado o envio de licenciados e quadros técnicos de Espanha para a Alemanha. Com o desemprego mais alto da União Europeia, 20,3 por cento da população activa, e a mais elevada taxa de desemprego juvenil, 40 de cada 100 jovens até aos 25 anos, os espanhóis agradecem a Ângela Merkel. Com o mesmo furor com que os figurantes recebiam os norte-americanos na paródia do realizador Garcia Berlanga, Bienvenido Mister Marshall.
"Estamos contentes por os nossos profissionais estarem tão cotados num país como a Alemanha", confessa, ao PÚBLICO, Amaya Pesquera, da Ordem dos Engenheiros de Telecomunicações de Espanha. Não é para menos. A colaboração iniciada em 27 de Janeiro entre os serviços públicos de emprego de Espanha e Alemanha levou à elaboração de uma lista. Na página electrónica da Embaixada alemã em Madrid lá estão os engenheiros, como os médicos e enfermeiros. Outros sectores com défice na Alemanha são os profissionais da Educação e os cozinheiros. Os primeiros licenciados e os "mestres" de cozinha titulares de currículos de formação profissional.
O contentamento de Pesquera tem ainda outro motivo. Na feira tecnológica de Hanôver em Abril de 2010, a chanceler alemã ficou surpreendida ao saber que o tráfego aéreo do seu país é em parte dirigido por engenheiros espanhóis, da empresa Indra. A competência dos técnicos espanhóis instalada no país da tecnologia é uma referência para preencher as 48.800 vagas de engenheiros que, segundo a Associação de Engenheiros Alemães, já existiam em Dezembro do ano passado.
Portugal interessadoA necessidade de importação de mão-de-obra altamente qualificada para a Alemanha não é nova. Desde 2004 que vários especialistas têm alertado para a falta de mão-de-obra especializada na Alemanha e para as consequências do envelhecimento populacional. Em Outubro passado, o presidente do Instituto Alemão de Economia, Klaus Zimmerman, voltou a alertar para o problema. "A partir de 2015 perderemos por ano 250 mil trabalhadores", avisou Zimmerman.
Esta é uma oportunidade para a Espanha, onde a mão-de-obra qualificada encontra dificuldades: 19 por cento dos licenciados entre os 25 e os 29 anos estão desempregados e 44 por cento têm uma ocupação inferior à sua qualificação, segundo a OCDE.
Por isso não espanta saber que, segundo um estudo da Adecco, empresa de trabalho temporário, entre Abril de 2008, com a confirmação da crise, e Abril do ano passado, 110 mil espanhóis saíram do país. O mesmo trabalho refere um aumento de 9,2 por cento no número dos que residem no estrangeiro, a maioria entre 25 e 35 anos, e altamente qualificada. Os seus destinos de trabalho têm sido os Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália, Alemanha e Portugal.
O interesse alemão em recrutar desempregados altamente qualificados estende-se também a Portugal. A 25 de Janeiro, o Der Spiegel destacava que o país seria outro dos eleitos pelo Governo alemão na tentativa de preencher o seu défice de mão-de-obra especializada.
No entanto, por cá parece que o desconhecimento reina sobre a questão e a Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã fez questão de emitir um comunicado em que afirma não ter "conhecimento de quaisquer iniciativas concretas neste sentido".
Já o bastonário da Ordem dos Engenheiros, Carlos Matias Ramos, em declarações ao PÚBLICO, disse que nas relações bilaterais que estabelece com a Alemanha através da Associação dos Engenheiros Alemães (VDI) ou mesmo através da Federação Europeia de Associações de Engenharia Nacionais (FEANI) foi "transmitido o sentimento que a Alemanha está a precisar de engenheiros".
Aquele país "tem um défice nas engenharias mais avançadas, onde os seus alunos apresentam algumas dificuldades nas ciências base como a matemática e a física e nas quais os engenheiros portugueses estão muito bem preparados", disse o bastonário. Carlos Ramos dá relevo à boa preparação dos engenheiros portugueses, conseguido através de um ensino de "qualidade e exigente". "Os engenheiros portugueses adaptam-se com facilidade e podem criar condições para o desenvolvimento económico na Alemanha, do qual as engenharias são grandes impulsionadoras, tal como na construção civil e telecomunicações", sublinha.
O PÚBLICO tentou apurar junto do Governo português se houve contactos oficiais no sentido de incentivar a mobilidade dos licenciados portugueses para o mercado de trabalho alemão, mas até ao momento nada foi divulgado. Também o Instituto de Emprego e Formação Profissional remete para os jovens interessados para o Eures - Portal Europeu da Mobilidade Profissional, onde os cidadãos europeus podem candidatar-se a trabalhar em vários países europeus.