Dar
No dar que está o ganho. Porque “é dando que se recebe”.
A economia do dar está na moda. Dá-se de tudo, desde comida a quem tem fome, a arte a quem precisa de cultura. Dá-se de todas as formas, diretamente ao necessitado, ou através de intermediários como Fundações de carácter social, cultural e educativo. Dá-se voluntariamente através de donativos para IPSSs, ou à força através de impostos e contribuições para o sistema redistributivo estatal. Há quem “dê” para poder pagar menos impostos e ficar com o que “dá”, o que é esperto mas não tem mérito. Há quem dê do que lhe sobra, o que é bom, e há quem dê do que lhe faz falta, o que é excelente. E embora a economia do mercenário, do preço e do lucro, seja natural e, se regida por critérios de justiça, humana e benéfica para indivíduos e sociedade, é na economia da solidariedade e do mecenato que está o espirito e a alegria.
De facto, é no dar que está o ganho. Porque “é dando que se recebe” como dizia S. Francisco de Assis (1181/2-1226). A contradição lógica desta afirmação obscurece a realidade ontológica que ele exprime. É natural que quem se esquece que a lógica das primeiras causas é diferente da lógica das causas segundas, se sinta confuso com este principio, e embora querendo no seu coração que seja verdade, o acabe por negar intelectualmente e na vida do dia-a-dia.
A aplicação desta máxima na sua maior pureza é ilustrada por S. Martinho de Tours (316-397) ao dar a sua capa, num frio dia de Outono, a um indigente semi-nu e a morrer de frio que tinha encontrado numa estrada. Martinho podia-lhe ter dado uma moeda de ouro, que daria para comprar não só uma capa mas muitas outras coisas boas, e adicionalmente lhe teria poupado o incómodo a ele, Martinho, de passar frio. Mas esse seria um presente inútil no descampado em que estavam, se o mendigo entretanto morresse de frio. Martinho não só deu o que tinha, mas de entre o que tinha deu o que o outro precisava, sacrificando o seu próprio conforto. De modo semelhante procedia a Madre Teresa de Calcutá (1910-1997) que só tinha aquilo que ela podia dar e fosse desejado por aqueles a quem ela podia dar.
Qual deve ser a medida do nosso dar? S. Tomás de Aquino (1225-1274) propõe: “Não só devemos dar aos outros os nossos olhos, vendo por eles; os nossos ouvidos, ouvindo as suas angústias; as nossas bocas, pregando-lhes e aconselhando-os; os nossos pés, de modo que possam andar ao seu serviço; os nossos corações, para que possam meditar na sua ajuda; mas também lhes devemos dar tudo o que tenhamos de bens espirituais e temporais.” Que quantidade de problemas não resolveríamos em Portugal se seguíssemos este padrão no nosso dar…
Professor de Finanças, AESE