Crowdfunding já atingiu quase 1,2 milhões em Portugal, mas continua aquém da Europa
Em apenas três anos, o financiamento através da multidão teve um forte crescimento e as plataformas nacionais acreditam que continuará a ganhar adeptos. Ainda assim, Portugal é um dos mais atrasados nesta área em comparação com outros países europeus.
O número de plataformas na internet destinadas ao financiamento colectivo, que permite a qualquer cidadão propor uma ideia com o objectivo de obter apoio financeiro de terceiros, está em crescimento desde 2011. Actualmente, serão menos de uma dezena, que diferem muito entre si: há algumas que apoiam todo o tipo de projectos e outras mais direccionadas a temas específicos. As pioneiras, a PPL e a Massivemov, têm um lugar de destaque, por liderarem em termos de investimento. Já a Zarpante dedica-se a apoiar projectos culturais, a Nós Queremos segue também essa lógica e destina-se a eventos, a Olmo e a BES Crowdfunding, esta última pertencente ao Banco Espirito Santo e ligada à PPL, focam-se essencialmente na área da solidariedade social
Desde 2011, a PPL e Massivemov já financiaram 270 projectos, tendo angariado no seu conjunto cerca de 925 mil euros. A este valor juntam-se 120 mil euros de financiamento a 38 ideias da BES Crowdfunding. E ainda os 100 mil euros aplicados através da Zarpante e repartidos por 90 projectos culturais, especialmente em Portugal e no Brasil. Ou seja, no total, o investimento destas quatro plataformas já atingiu 1145 milhões de euros. O PÚBLICO contactou com outras entidades, mas não obteve respostas.
Em três anos de actividade, a PPL já angariou cerca de 525 mil euros através da multidão. No ano passado, a plataforma alcançou quase 200 mil euros, valor que até Maio de 2014 já tinha crescido mais 20 mil euros. De acordo com Yoann Nesme, um dos fundadores, a PPL “espera um crescimento exponencial continuado nos próximos anos”. O responsável considera que “o crowdfunding é um conceito relativamente recente, sobretudo em Portugal, pelo que a adesão tem vindo a ser gradual, à medida que vai sendo conhecido e compreendido por uma maior parte da população”.
Por sua vez, a Massivemov angariou desde a sua origem (2011) cerca de 400 mil euros em financiamentos. Esta plataforma analisa em média 18 projectos por semana. João Pereira, um dos fundadores, considera que as pessoas passam a confiar neste tipo de financiamento “quando entendem que é mais um canal de venda”. Na opinião do empresário, o crowdfunding é “uma forma extremamente interessante de interagir com os clientes e de os aproximar dos produtos/serviços para obterem o financiamento que necessitam”.
Abaixo da média europeia
De acordo com um relatório publicado pela European Crowdfunding Network, uma organização não-lucrativa dedicada a este tipo de financiamento, em Abril deste ano existiam 230 plataformas de crowdfunding acreditadas na Europa. Até essa data já tinham sido angariados aproximadamente 126 mil milhões de euros através de dois dos principais tipos de apoio: recompensa (em que os impulsionadores dos projectos oferecem algo a quem ajudar no financiamento da sua causa) e de equity (neste modelo, quem apoia o projecto torna-se sócio ou accionista da causa, não sendo permitido em Portugal).
Apesar de, em três anos de actividade, o financiamento colectivo a nível nacional ter aumentado, Portugal ainda está muito atrás dos níveis alcançados na Europa, ficando, a par da Irlanda, em oitavo lugar na lista compilada pela European Crowdfunding Network, de um total de 14 países. O relatório coloca a Alemanha no topo da lista como o país onde mais projectos são financiados através de crowdfunding (recompensa e equity), com uma taxa de 24%. Segue-se Espanha, com percentagem de 17%, e França, com 16%. A taxa em Portugal é de 2%, ficando apenas à frente da Suíça, Dinamarca e Áustria, que registam uma percentagem de 1%.
Yoann Nesme, da PPL, considera que, “comparativamente com o resto da Europa, Portugal está ainda um pouco atrás, uma vez que não existe neste momento a possibilidade de investir, através do crowdfunding numa óptica de retorno financeiro”. O responsável acredita que “novos tipos de crowdfunding estão prestes a aparecer no país”.
João Pereira, da Massivemov, atribui ao Estado parte da culpa pelo facto de Portugal se situar atrás do resto da Europa. “Ficamos claramente atrás por falta de massa critica e visão estratégica por parte do Estado”, afirmou. O fundador desta plataforma sugere uma série de medidas que, na sua opinião, ajudariam a dinamizar o crowdfunding em Portugal: “criar incentivos, como por exemplo deduções fiscais, custos reduzidos para a criação de novas empresas, especificas para quem usa este tipo de financiamento e para quem financia”, afirmou.
Regra geral, existem quatro formas de financiamento através do crowdfunding: o sistema de recompensas, os donativos (mais comum nas plataformas destinadas à solidariedade social), os empréstimos e o equity. Em Portugal, apenas são permitidos os sistemas de recompensas e de donativos. No seu estudo, a European Crowdfunding Network concluiu que, na maioria, os empreendedores europeus optam pelo crowdfunding de recompensas. Por outro lado, há ainda outros países europeus (44%), que preferem o crowdfunding equity.
Tal como Portugal, também a Dinamarca, França, Irlanda, Itália e Suíça praticam um modelo de crowdfunding totalmente através de recompensas. Contrariamente, a Áustria, a Finlândia e a Suécia dedicam-se inteiramente ao crowdfunding equity. A Alemanha, o Reino Unido e a Holanda, por sua vez, adoptaram regime misto, mas o segundo modelo é o mais utilizado nestes países.
Henrique Andrade, um dos responsáveis por a plataforma portuguesa Zarpante, acredita que, se Portugal adoptasse o modelo de crowdfunding equity, “isso ajudaria muito a alcançar o patamar já conseguido noutros países da Europa e da América do Norte”, afirmou.
A organização europeia concluiu que 66,7% dos projectos conseguem obter o valor a que se propuseram no início da candidatura. Na plataforma nacional PPL, a taxa de sucesso encontra-se nos 49% – praticamente metade dos projectos publicados conseguiram alcançar o seu objectivo. Na Massivemov, esse valor situa-se ligeiramente abaixo (42%). Nesta plataforma, João Pereira, explicou que “90% dos projectos costumam ultrapassar o valor inicialmente pedido e 50% ultrapassam o seu objectivo em mais de 25%”.
Texto editado por Raquel Almeida Correia