Crescimento potencial português ameaçado por falta de investimento
Portugal tem um nível de capital acumulado que fica bastante abaixo dos outros países periféricos da zona euro. E o nível de investimento previsto não chega para reduzir a diferença no médio prazo.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) e a agência de notação financeira Fitch revelaram estar mais pessimistas em relação ao crescimento potencial da economia portuguesa, esperando agora, em vez de taxas de crescimento a caminhar progressivamente para os 2%, variações do PIB de 1,25%. E dão uma mesma explicação para este cenário prolongado de crescimento lento: o investimento não está e não vai crescer o suficiente para evitar a continuação da queda do capital acumulado na economia portuguesa.
O capital acumulado – ou stock de capital – é aquilo que a economia tem à sua disposição, para além do capital humano, para produzir bens e serviços. São por exemplo as máquinas, os equipamentos e as infra-estruturas que são usados pelas empresas na sua actividade. Quanto maior este capital acumulado for, maior é o potencial de produção de uma economia.
A questão é que para que o capital acumulado atinja um valor elevado, é preciso que haja investimento. E é isto que o FMI e a Fitch não vêem a acontecer em Portugal.
“Apesar do forte impulso cíclico, o investimento deverá continuar a ser demasiado baixo para manter o stock de capital da economia”, defendeu a missão do FMI que esteve no início do mês de Março em Portugal para preparar uma avaliação ao país. A consequência, avisou o fundo, é que “o crescimento do produto no médio prazo deve ficar-se apenas pelos 1,25%”.
A Fitch também reviu em baixa, de 1,5% para 1,25%, a sua estimativa para o crescimento potencial português, dando a mesma explicação: “o investimento começou a crescer, mas permanece demasiado baixo para manter o stock de capital”, afirmou no relatório em que decidiu prolongar a atribuição de um rating de nível “lixo” a Portugal.
Os números publicados pelas autoridades estatísticas confirmam que o capital acumulado em Portugal está efectivamente a um nível bastante baixo quando comparado com o dos seus parceiros europeus, não se notando para os próximos anos quaisquer sinais de alteração da tendência.
O stock de capital por pessoa empregada em Portugal foi em 2014, de acordo com dados da Comissão Europeia, pouco mais de metade da média dos outros países da zona euro. E, ainda mais preocupante, ficou claramente abaixo do registado por outras economias da Europa periférica que sofreram nos últimos anos quebras acentuadas de investimento, como a Irlanda, Espanha, Itália ou mesmo a Grécia.
Seria necessário uma aceleração muito forte do investimento para recuperar este diferencial. É verdade que as previsões para a evolução do investimento nos próximos dois anos apontam para uma melhoria. O Banco de Portugal está a apontar para uma variação de 4% este ano que acelera para 5,3% em 2016.
No entanto, estes números pouco mais do que servem para começar a compensar a queda de investimento que se registou de forma muito acentuada em anos anteriores. Em 2014, o investimento não representou mais de 15,1% do PIB português, um valor que fica abaixo dos 20,5% que se registavam antes da crise e da média de 19,5% que se verifica nos países da zona euro. Ainda mais longe estão os cerca de 30% do PIB que eram atingidos em Portugal nos anos 80 do século passado.
Um dos problemas, assinalam muitos economistas, foi não se ter conseguido aproveitar os níveis elevados de investimento do passado para fazer crescer de forma significativo o capital acumulado da economia. Culpa, em larga medida, de uma má alocação dos investimentos (muito centrados na construção, por exemplo).
Agora, o problema é que não há sequer capacidade nem vontade para investir. As empresas e os particulares ainda estão excessivamente endividados, as perspectivas de crescimento da economia não convidam a arriscar e os próprios bancos são muito mais prudentes a emprestar dinheiro. Pelo meio, o Estado também ajuda cada vez menos com investimento público.
Os efeitos deste cenário são previsíveis, como tem escrito o Banco de Portugal em diversos relatórios. “A redução estimada do stock de máquinas e equipamentos na economia portuguesa, associada a uma limitada formação bruta de capital fixo, condiciona a capacidade para incorporar novas tecnologias no processo produtivo”, afirmou o banco central num documento publicado no ano passado, lembrando ainda que “os países com menores rácios de capital por trabalhador tendem a ser penalizados quando o progresso tecnológico se concentra em sectores que utilizam mais intensamente este factor produtivo”.