Costa junta câmaras da região de Lisboa para pedir intervenção do Provedor de Justiça nas 35 horas
Câmaras da Área Metropolitana de Lisboa pedem ao Provedor que requeira a inconstitucionalidade da lei que obriga Governo a participar na negociação dos acordos colectivos das autarquias. Cascais e Mafra ficam de fora.
A informação foi confirmada ao PÚBLICO pelo presidente do Conselho Metropolitano de Lisboa, o socialista António Costa, de quem partiu a iniciativa e a ideia de congregar apoios em torno dela. Segundo o autarca, 16 presidentes de câmara já manifestaram a concordância com o documento, estando a ser recolhidas as suas assinaturas. A expectativa de António Costa, que assinou um acordo colectivo (ACEP) com os sindicatos em meados de Janeiro, é que o pedido ao Provedor de Justiça possa ser entregue ainda esta quarta-feira.
As câmaras de Lisboa, Amadora, Montijo, Odivelas, Sintra, Vila Franca de Xira (todas do PS), as de Almada, Seixal, Alcochete, Barreiro, Moita, Loures, Palmela, Sesimbra, Setúbal (todas do PCP) e de Oeiras (independente) são aquelas que irão subscrever o documento. Os presidentes social-democratas dos municípios de Mafra e de Cascais optaram por não o fazer.
O presidente do Conselho Metropolitano de Lisboa, que é também presidente da Câmara de Lisboa e candidato a líder do PS, defende que, atendendo ao princípio de autonomia do poder local, os municípios não podem deixar de ter “liberdade de gestão e de contratação de recursos humanos”. E “liberdade de fixar horários”, acrescentou António Costa ao PÚBLICO, sublinhando que não faz sentido que uma câmara possa contratar ou despedir uma pessoa, mas não determinar o seu horário de trabalho.
Em causa está o artigo 364 da Lei 35/2014 na parte que determina que o Ministério das Finanças deve ser parte da negociação dos ACEP. O problema é que este diploma tem como destinatária a Administração Central e as autarquias contestam a interpretação que é feita pelo Governo (à luz do parecer da Procuradoria-Geral da República) “no sentido de impor a participação do membro do Governo responsável pela área das Finanças e da Administração Pública na negociação e na celebração dos acordos colectivos de entidade empregadora pública entre as autarquias locais e os seus trabalhadores”. Algo que - referem os autarcas na exposição que fazem ao Provedor de Justiça, e a que o PÚBLICO teve acesso - viola o princípio da autonomia do poder local consagrado na Constituição da República.
A iniciativa foi confirmada por municípios como Loures, Barreiro, Almada e Oeiras, que estão entre as que assinaram ACEP com os sindicatos e têm um horário semanal de 35 horas (em vez das 40 previstas na lei), mesmo sem que os acordos tenham sido publicados em Diário da República.
Também o Sindicatos dos Trabalhadores da Administração Pública (Sintap), já tinha pedido a intervenção do Provedor de Justiça, José de Faria Costa.
Cascais fora da iniciativa
Fora desta iniciativa está a Câmara de Cascais, liderada pelo social-democrata Carlos Carreiras. O autarca confirma que recebeu uma carta de António Costa “que ensaia uma posição concertada das autarquias” no que respeita aos ACEP, porém Cascais não vai aderir.
“Como a Câmara de Cascais desenvolveu um processo de uma natureza completamente distinta, na profundidade, inovação e abrangência, sempre no escrupuloso cumprimento da lei, não faremos parte dessa iniciativa”, justificou ao PÚBLICO. Cascais fez uma reestruturação dos serviços que tinha como base as 35 horas semanais e entende que não faz sentido pôr os trabalhadores a fazer mais cinco horas por semana.
Mas o facto de não aderir não significa que Carlos Carreiras concorde com a forma como o Governo tem conduzido todo o processo e exige a rápida publicação do acordo que assinou com vários sindicatos em Fevereiro.
Depois de o Governo ter homologado o parecer da PGR, Carlos Carreiras assegura que não foi contactado pelo executivo, ao contrário do que já aconteceu com outras câmaras e juntas de freguesia . Na segunda-feira, o autarca tomou a iniciativa e enviou uma carta à ministra das Finanças onde reitera que a autarquia convidou o Governo a participar nas negociações e lamenta a ausência de resposta a esse convite.
Na carta a que o PÚBLICO teve acesso, o autarca questiona Maria Luís Albuquerque sobre os pontos do ACEP com que não está de acordo “para que se possa tentar uma eventual reabertura do processo negocial”. E alerta que está nas mãos do Ministério a tomada de uma decisão para a aplicação “urgente” do ACEP em Cascais.
Um ano de impasse
Em Setembro do ano passado entrou em vigor um diploma que aumenta o tempo de trabalho no Estado de 35 para 40 horas semanais, deixando em aberto a possibilidade de os organismos públicos negociarem com os sindicatos horários inferiores. Foi o que fizeram centenas de câmaras, juntas de freguesia e outros organismos da administração local.
O problema é que o secretário de Estado da Administração Pública, José Leite Martins, recusou-se a mandar publicar esses acordos, pedindo um parecer à PGR sobre a participação do Ministério das Finanças neste processo. O parecer chegou em Maio, mas só foi homologado em Setembro pelo Governo, defendendo que as Finanças devem fazer parte do processo negocial.
Na semana passada, o secretário de Estado começou a devolver às câmaras e juntas de freguesia os ACEP, disponibilizando-se para participar no processo negocial. Na prática, isto significa que todos os acordos terão de ser renegociados.
Recentemente, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) aprovou uma deliberação onde exige que o Governo crie um regime transitório “célere e expedito” que permita resolver, até ao final do ano, a situação dos ACEP que estão no Ministério das Finanças à espera de uma decisão. Pede ainda a definição prévia dos critérios que o Governo irá utilizar quando se pronunciar sobre esses acordos, nomeadamente no que respeita às 35 horas semanais.