CIP quer reabrir discussão sobre férias e trabalho extraordinário
Parceiros sociais discutem proposta do Governo que fixa vários critérios para o despedimento por extinção de posto de trabalho, muito criticados pelos sindicatos.
“Torna-se urgente que haja propostas também nestas matérias”, disse ao PÚBLICO Gregório Rocha Novo, dirigente e jurista da CIP, que defende que deve haver uma leitura “abrangente relativamente aos desequilíbrios resultantes do acórdão do Tribunal Constitucional, face ao acordo para a competitividade e o emprego” assinado em 2012. Se não for possível chegara um acordo global sobre a matéria, Rocha Novo admite que estes assuntos sejam alvo de negociação colectiva.
No acórdão onde analisou as alterações ao Código do Trabalho, o TC entendeu que a lei geral não se pode sobrepor à contratação colectiva, mantendo em vigor os contratos colectivos que estabelecem regimes mais favoráveis de descanso compensatório e de pagamento de trabalho suplementar e que prevêem mais dias de férias.
O dirigente da CIP considera que a decisão teve impactos significativos na vida das empresas e, por isso, a confederação quer recuperar o tema, com o objectivo de encontrar “soluções equilibradas”.
Contudo, nem o Governo propôs qualquer alteração sobre o assunto, nem as confederações sindicais estão disponíveis para o abordar. “Não faz sentido nenhum recuperar essas matérias”, reage Armando Farias, dirigente da CGTP. “Neste momento não estamos abertos a essa discussão. Enquanto a troika estiver no país, não vamos abrir qualquer diálogo”, diz por seu turno o secretário-geral da UGT, Carlos Silva.
Proposta muito criticada pela CGTP
Em cima da mesa estará ainda a alternativa encontrada pelo Governo para ultrapassar o chumbo das normas relativas ao despedimento por extinção de posto de trabalho. A lei previa que a empresa pudesse escolher “critérios relevantes e não discriminatórios face aos objectivos subjacentes à extinção do posto de trabalho”, eliminando o critério da antiguidade. A norma acabou chumbada pelo TC. O ministro do Emprego e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, reformulou a norma que agora prevê que, quando houver vários postos de trabalho na mesma secção, a escolha do trabalhador a despedir “deve observar critérios relevantes e não discriminatório” como as habilitações académicas e profissionais, experiência, avaliação e desempenho, custo do trabalhador, antiguidade e situação económica e familiar”.
A proposta é muito criticada pela CGTP. No parecer que enviou ao Governo em Dezembro, a Intersindical entende que a nova redacção “viola claramente o artigo 53.º da Constituição, porquanto não procede à determinação rigorosa dos parâmetros que devem condicionar e limitar cada um dos critérios que poderão ser utilizados e não permite ao trabalhador apreciar e controlar a aplicação dos fundamentos invocados”.
A CGTP lembra que o despedimento por extinção de posto de trabalho não tem natureza disciplinar, por isso “os critérios de selecção devem ser objectivos e claros”. “Acontece – acrescenta – que os critérios elencados na proposta são vagos, imprecisos e ambíguos”. A confederação já avisou que vai pedir ao Presidente da República que peça a fiscalização da norma, caso ela vá por diante,
Também a UGT considera que a norma agora proposta corre o risco de continuar a ser inconstitucional, devido à "subjectividade e discricionariedade de critérios". Carlos Silva adiantou ao PÚBLICO que defende a eliminação dos critérios relacionados com o custo e com a situação económica e familiar do trabalhador e uma hierarquização dos restantes. "Se o Governo não alterar a proposta não contem com o nosso acordo", ameaçou, lamentando que os contributos não tenham sido levados em conta.
Na convocatória enviada aos parceiros sociais, o Governo anexa a proposta que já tinha sido apresentada em Dezembro, sem ter incluído qualquer contributo dos parceiros. O PÚBLICO questionou o ministério de Pedro Mota Soares sobre se alguns dos contributos dos parceiros seriam incluídos na proposta, mas fonte oficial preferiu não fazer comentários.
A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) vai para o encontro com abertura para a "procura de consensos". Na reunião desta quarta-feira, a CCP propõe que os critérios de escolha tenham uma ordem: “a pior avaliação de desempenho, menor experiência na função, piores habilitações académicas e profissionais, maior custo do trabalhador para a empresa, menor antiguidade e, por fim, menos débil situação económica e familiar”.
Já a CIP defende que a proposta do Governo “é equilibrada” e não deve haver qualquer ordem na organização dos critérios.
As normas que o tribunal constitucional chumbou
Despedimento por extinção de posto de trabalho
No Código do Trabalho em vigor desde Agosto de 2012, o Governo eliminou o critério da antiguidade para a selecção dos trabalhadores a despedir quando pretende extinguir um posto de trabalho. Em vez disso, deixava nas mãos do empregador a definição de critérios “relevantes e não discriminatórios”. O TC entendeu que isso violava a proibição do despedimento sem justa causa. Os critérios, refere o acórdão, são “vagos”, “indeterminados” e “desprovidos de um mínimo de precisão eficácia”, pelo que não se pode esperar “que balizem suficientemente a margem de disponibilidade do empregador”.
O TC chumbou ainda a eliminação da obrigatoriedade de o empregador procurar um posto de trabalho compatível com as características do trabalhador antes de o despedir.
Férias e descanso compensatório
O TC deixou passar a norma que elimina a majoração das férias em função da assiduidade. Mas chumbou o artigo que anulava as normas dos contratos colectivos que previam mais dias de férias (além dos 22 dias) e descanso compensatório por prestação de trabalho suplementar. O acórdão diz que o Governo viola o direito à contratação colectiva sem que isso se justifique. Em consequência do chumbo, os trabalhadores abrangidos por contratos colectivos que tinham estas “regalias” pudessem reclamar a reposição destes direitos.
Trabalho suplementar
O TC aceitou o corte para metade do pagamento do trabalho extraordinário durante dois anos. Mas chumbou o artigo que determinava que, se as normas que previam pagamentos mais generosos de trabalho suplementar ou de trabalho normal prestado não fossem revistas ao fim de dois anos, então esses valores caíam automaticamente para metade. Na prática, isto significa que a partir de Agosto deste ano, os trabalhadores abrangidos por convenções colectivas que prevejam regimes mais favoráveis verão resposto esse mesmo regime.
Corrige declarações de Gregório Rocha Novo. Onde se lê que "se não for possível chegara um acordo global sobre a matéria, Rocha Novo admite que estes assuntos sejam alvo de negociação ao nível das empresas", deverá ler-se ao nível da contratação colectiva.