A Triunfo fecha hoje as portas em Coimbra
"Deslocalização" é uma palavra que há um ano não dizia nada aos trabalhadores da Triunfo. Três meses antes de a ouvirem pela primeira vez, tinham aceitado aumentos inferiores aos reivindicados, para que se pudessem fazer, na fábrica, investimentos de cerca de cem mil contos. Por isso, demoraram a compreender, quando a administração anunciou, em Junho, que resolvera fechar as portas naquela cidade para concentrar a sua actividade em Mem Martins.
"Quando há uma falência, é diferente. As pessoas sentem o volume de trabalho a diminuir, vão-se preparando...", explica Armindo Carvalho, dirigente do Sindicato das Indústrias de Alimentação do Norte. Sabe do que fala: quando a fábrica encerrar, hoje, ele (que ali trabalhava há 28 anos) e a mulher (que empacotava bolachas na Triunfo desde os 13 anos de idade) ficam desempregados. Com 46 e 45 anos, respectivamente, ambos sentiram, ao longo dos últimos meses, como é difícil aceitar o encerramento de uma empresa onde nunca houve um salário em atraso e que até ao último minuto laborou em três turnos, 24 horas por dia, com recurso a meia centena de subcontratados, "na força máxima".
Primeiro, os trabalhadores recusaram-se a acreditar. Apelaram à autarquia, ao Governo Civil de Coimbra e à própria Secretaria de Estado da Indústria, em defesa dos postos de trabalho. Mas todos os esforços esbarraram na irredutível administração da Triunfo. Passaram então para a negociação das indemnizações, numa batalha que durou até às últimas horas. Anteontem, Armindo Carvalho viu-se obrigado a anunciar a última derrota: não conseguira que os valores fossem rectificados em função dos aumentos a que teriam direito em 2001 e dos salários que as mulheres recebem na fábrica de Lisboa, superiores aos pagos em Coimbra.
"O máximo que lhes posso prometer é que serão tratados com dignidade: criámos uma escala, de modo a que sejam bem atendidos quando forem tratar do subsídio de desemprego. E isso é muito pouco para quem dedicou a vida toda a esta casa", lamentava Armindo Carvalho, enquanto os trabalhadores abandonavam o plenário.
Mais do que de tristeza, as palavras eram de revolta. "Dentro de mim só há ódio, ódio...", afirmava Cidália Carvalho. Diz que entrou ali "uma jovem para sair uma velha, desempregada e com uma indemnização de miséria". Mas o ódio maior é não saber em quem o descarregar: "Quando para aqui entrei, éramos uma família. Agora não conheço, sequer, a cara do meu patrão".
Mesmo na década de 70, quando na empresa trabalhavam cerca de 1200 trabalhadores, o ambiente era familiar: "Os patrões estavam connosco, na fábrica, e tanto nos consolavam quando tínhamos um problema como nos davam ralhetes quando era preciso", recorda Cidália.
A maior parte entrou ali adolescente e guarda na memória o dia em que o fez: "Era uma data importante: o emprego era para toda a vida e a empresa segura", explica Armindo Carvalho. Como todos os outros, não sabe o que irá fazer quando deixar de ter direito ao subsídio de desemprego.