Governo prepara cortes nos salários se Orçamento derrapar no próximo ano

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Comissão Europeia elogia esforços do Governo, mas enuncia riscos Daniel Rocha

Na sexta avaliação ao programa de ajustamento português, a Comissão Europeia alerta para os riscos de derrapagem orçamental durante este ano e no próximo. Mas para 2013, o Governo tem já um plano de contingência, no valor de 0,5% do PIB, que inclui cortes adicionais na factura salarial dos funcionários públicos

Caso o défice orçamental previsto para 2013 comece a derrapar, o Governo tem preparado um plano de contingência que passará por reduzir ainda mais a factura salarial do Estado. Essa redução não implica apenas mexidas nos salários dos funcionários públicos, mas poderá passar pela combinação de várias medidas que permitam fazer cair as despesas com pessoal ainda mais do que aquilo que já está previsto no Orçamento do Estado para 2013.

No relatório da sexta avaliação do programa de ajustamento português, a Comissão Europeia destaca que as autoridades portugueses estão a preparar um plano de contingência no valor de 0,5% do PIB (850 milhões de euros), que passará em grande medida por "reduções adicionais na factura salarial e por um aumento da eficiência no funcionamento da Administração Pública".

O PÚBLICO apurou que o Governo tem em cima da mesa várias opções. Uma delas passa por reduzir algumas componentes dos salários - suplementos por exemplo - dos trabalhadores do Estado. Além disso, o Ministério das Finanças, em conjunto com a consultora internacional Mercer, está a fazer um estudo comparativo entre os salários e o ganho médio na Função Pública e no sector privado. Trata-se de uma exigência da troika, que servirá de base a uma reformulação da tabela remuneratória do Estado e cujos resultados serão apresentados já no início do próximo ano.

Em cima da mesa poderá estar também um reforço das saídas de pessoal, através da redução dos contratos a prazo, ultrapassando as metas definidas no OE 2013, que obriga os serviços a reduzir para metade este tipo de contratação.

As aposentações também poderão dar um contributo para a redução da factura salarial, assim como as rescisões amigáveis. Desde a apresentação do OE 2013, a Caixa Geral de Aposentações (CGA) tem recebido inúmeros pedidos de reforma, bastando ao Governo pedir aos serviços para acelerarem as respostas, conseguindo assim um emagrecimento do número de trabalhadores. A partir de Janeiro também estará em vigor a regulamentação das rescisões amigáveis no Estado, embora um programa alargado de saídas por acordo implique uma despesa em indemnizações.

Outra das hipóteses em cima da mesa é o eventual aumento da carga horária semanal das 35 para as 37,5 ou 40 horas por semana. Se a medida for por diante sem o respectivo aumento salarial, também aqui o Governo conseguirá poupanças, se aproveitar para reduzir mais o número de efectivos.

As despesas com pessoal têm vindo a cair de forma significativa. Os dados mais recentes da execução orçamental - relativos a Novembro - dão conta de um recuo de 18,7% desde Janeiro, conseguido sobretudo graças aos cortes nos salários e à redução ou suspensão dos subsídios de férias e de Natal. A diminuição do número de funcionários públicos também contribuiu para a redução dos gastos. Segundo o relatório da CE, a redução de pessoal está a progredir a um ritmo mais rápido do que inicialmente previsto e deverá ficar acima de 3% no final de 2012 (a meta inicial era de 2%).

O corte de despesa de 0,5% do PIB em 2013 para responder a uma eventual derrapagem orçamental é autónomo do plano de cortes de 4000 milhões projectados pelo Governo para os próximos dois anos, que será colocado em prática independentemente de se verificar ou não uma derrapagem no défice do próximo ano.

Os receios de Bruxelas

Para 2013, Portugal comprometeu-se a colocar o défice público em 4,5% do PIB, o que compara com os 5% deste ano (6% sem receitas extraordinárias.

No relatório da sexta avaliação ao programa de ajustamento português, que ontem publicou na Internet, a Comissão Europeia conclui que a execução da estratégia definida pelo Governo e pela troika está globalmente a ser cumprida com sucesso, elogiando em particular o esforço do Executivo ao nível das reformas estruturais. No entanto, revela uma grande preocupação em relação à possibilidade de se verificarem derrapagens face às metas definidas para o défice público. Tanto em 2013 - o que poderá motivar a entrada em vigor do plano de contingência -, como já este ano.

"Os riscos para o cumprimento do objectivo de défice para 2013 são elevados", afirma o relatório. E enumera algumas das principais ameaças. A redução mais forte do que o esperado da procura interna, com a consequente quebra da receita fiscal, é a principal preocupação. Outro risco assinalado é a eventual necessidade de o Estado ter de emitir mais garantias para as empresas públicas, se estas não conseguirem financiar-se nos mercados.

A comissão repete também o aviso de que existe uma dependência demasiado grande das medidas de consolidação feitas do lado da receita, nomeadamente através do IRS, que contribui com 42,3% do esforço orçamental planeado.

Por fim, o último risco assinalado pela Comissão Europeia está nas decisões futuras do Tribunal Constitucional. "Existe um risco geral de que algumas das medidas de poupança incluídas no Orçamento de 2013 possam ser desafiadas pelo Tribunal Constitucional".

Para este ano, a Comissão alerta que a queda maior do que o previsto da receita fiscal nos últimos meses do ano e a lenta aplicação de algumas medidas estão a colocar em risco o objectivo de défice de 5% . "O rápido declínio na cobrança fiscal coloca riscos ao cumprimento do objectivo de receita para 2012 que foi incluído na proposta de OE para 2013", afirma.

O relatório lamenta ainda que, para 2012, "a implementação de medidas adicionais no valor de 0,3% do PIB para cobrir as insuficiências de receita, como acordado na quinta avaliação, não esteja ainda totalmente feita". A Comissão refere-se em particular à aplicação antecipada de algumas medidas na Segurança Social previstas para 2013 (cortes nas prestações sociais), aprovados pelo Conselho de Ministros de 11 de Dezembro.

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