Criação de emprego subirá 2,5% mas não travará desemprego
O Governo calcula que os custos do trabalho vão cair 5,23% com o Código do Trabalho que entra hoje em vigor. Tribunal Constitucional, que encontrou sempre problemas nas mudanças recentes à lei laboral, está a analisar o diploma
Mesmo que as alterações à legislação laboral que entram hoje em vigor tenham um impacto positivo no mercado de trabalho, este será insuficiente para contrariar a evolução negativa do desemprego prevista pelo Governo e pelas instituições internacionais para os próximos anos.
Já quanto à redução dos custos salariais, outro dos objectivos do novo Código do Trabalho, os efeitos serão nítidos. O Governo estima que os custos do trabalho sofram uma quebra de 5,23%, tornando-se o principal motor da competitividade da economia.
Segundo um estudo do Ministério da Economia, divulgado ontem pelo Jornal de Negócios, a redução dos feriados e das férias, conjugada com os cortes na remuneração do trabalho extraordinário e nas indemnizações por despedimento, terão um efeito positivo e permitirão aumentar em 2,5% o emprego no curto prazo e em 10,5% no longo prazo.
Contudo, esse impacto não terá reflexos imediatos na taxa de desemprego, que em 2013 continuará a subir até aos 16%, nem na recuperação do desemprego estrutural.
António Dornelas, que em 2008/2009 ajudou Vieira da Silva a desenhar a segunda revisão do Código do Trabalho, não tem qualquer dúvida: "No curto prazo, espero uma degradação dos números do desemprego e do emprego, como os dados mais recentes têm demonstrado".
A posição do professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCTE) está em sintonia com a de Luís Gonçalves da Silva, que em 2002/2003 assessorou Bagão Félix quando este avançou com o primeiro Código do Trabalho. "Um Código do Trabalho não é um elemento decisivo para o combate ao desemprego e não é expectável que a alteração de um diploma resolva os problemas estruturais ao nível do desemprego", destaca.
Ambos defendem que a recuperação do emprego depende de outros factores. A recuperação económica, como destaca Dornelas, ou o combate à economia paralela e a formação dos trabalhadores e dos empregadores, diz Gonçalves da Silva.
Do lado do Governo, as expectativas quanto aos efeitos do Código do Trabalho no mercado laboral são grandes. Em entrevista recente ao PÚBLICO, o secretário de Estado do Emprego, Pedro Martins, destacava que a lei dará mais confiança às empresas na hora de contratar.
Essa confiança advém sobretudo dos impactos das alterações legislativas nos custos suportados pelas empresas. Gonçalves da Silva considera que a diminuição do custo da mão-de-obra é "um objectivo que perpassa todo o diploma". Para esse objectivo contribuem o trabalho suplementar mais barato, os bancos de horas individuais, os sete dias a mais de trabalho por ano à custa da redução das férias e dos feriados ou o corte das indemnizações por despedimento (ver caixa).
António Dornelas não tem dúvidas de que estas mudanças terão efeitos rápidos e eficazes nos custos unitários de trabalho com efeitos positivos na competitividade. Mas "uma coisa é a eficiência, outra é a justiça", sublinha.
É que a economia ganha competitividade essencialmente por via dos custos salariais, esquecendo-se o resto das medidas previstas no acordo de Concertação Social, onde o Código do Trabalho nasceu.
Mas para a troika ainda é preciso ir mais longe. Na última avaliação, o Fundo Monetário Internacional e a Comissão Europeia voltaram a pressionar o Governo para definir os critérios para alargar os efeitos dos contratos colectivos à generalidade dos trabalhadores ou então para eliminar de uma vez por todas estes mecanismos automáticos, que fazem dilatar os custos das empresas. Mas só em Setembro se conhecerão as regras para a publicação das portarias de extensão.
Este é apenas um dos vários ajustamentos à legislação laboral que deverão ocorrer até ao final do ano. Cavaco Silva pediu estabilidade legislativa. Gonçalves da Silva subscreve o apelo, até porque as mudanças constantes "têm custos ao nível da conflitualidade e da aplicabilidade do direito". Mas até Novembro as indemnizações por despedimentos vão voltar a baixar para a média europeia e será criado o fundo para os despedimentos.
Isto sem contar com eventuais alterações decorrentes da análise que o Tribunal Constitucional (TC) está a fazer do diploma. Apesar das dúvidas que o seu assessor para a área do trabalho colocou num debate público - nomeadamente sobre a imposição do banco de horas individual - o Presidente da República acabou por promulgar o diploma.
Cavaco Silva não encontrou "indícios claros de inconstitucionalidade" no diploma. Já o PCP, o Bloco de Esquerda e os Verdes vêem na lei atropelos aos princípios constitucionais e a 12 e Julho pediram a fiscalização sucessiva das normas que criam os bancos de horas individuais, alteram os despedimentos e reduzem as férias, os feriados e a remuneração do trabalho extra.
Resta agora esperar pela decisão dos juízes, que encontraram problemas constitucionais em todas as alterações recentes à legislação laboral. Foi assim em 2003, quando o TC chumbou as normas do Código de Bagão Félix que permitiam ao patrão aceder a dados pessoais do trabalhador e limitavam o direito à greve. E foi também o que aconteceu em 2009, quando o TC pôs em causa o aumento do período experimental e a eliminação do processo disciplinar em caso de despedimento.