PSP abre processo disciplinar a subcomissário que agrediu adepto do Benfica em Guimarães
Também a IGAI abriu processo a polícia que deteve violentamente adepto do Benfica à frente dos filhos. Oficial garante que o adepto lhe cuspiu. Homem, indiciado por injúria e ameaça agravada, já foi ouvido pelo Ministério Público e nega versão do subcomissário.
O polémico episódio referido sinteticamente como “uma intervenção policial que resultou na detenção de um cidadão” no “final do jogo, nas imediações do estádio”, surge numa das alíneas de um longo comunicado que relata inúmeras outras ocorrências e 26 detenções relacionadas com os festejos do bicampeonato do Benfica em Guimarães, Lisboa e Porto. A polícia não respondeu, contudo, às questões do PÚBLICO, que pretendia saber se o oficial da PSP vai continuar ao serviço durante o processo.
A Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI), que fiscaliza a legalidade da actuação das forças de segurança e tem tutela disciplinar sobre os polícias, vai investigar o episódio em que um adepto do Benfica foi agredido violentamente por um agente da PSP no final do jogo entre aquele clube e o Guimarães.
Em resposta escrita enviada ao PÚBLICO, o subinspector-geral da Administração Interna, Paulo Ferreira, confirmou esta segunda-feira que "foi instaurado um processo de inquérito que irá ser tramitado na IGAI". Questionado sobre se a PSP já prestou esclarecimentos à IGAI sobre as razões que terão levado o agente a agir daquela forma, e se este continuará a exercer funções ou será suspenso no decorrer do inquérito, o mesmo responsável sublinhou que só no decurso do processo "serão investigadas e avaliadas todas as situações que tenham ocorrido e que, diga-se, podem ir para além das questionadas" pelo PÚBLICO.
O Ministério da Administração Interna já tinha anunciado nesta segunda-feira que iria ser aberto um inquérito ao caso, avançando que o agente da PSP envolvido na agressão já foi identificado. Numa nota enviada à agência Lusa, fonte do Ministério da Administração Interna garantiu que "irá decorrer inquérito aos incidentes ocorridos" e que "o agente em questão já foi identificado" e tratar-se-á de um subcomissário que é comandante da esquadra de investigação criminal da PSP de Guimarães.
"Não cuspi", garante o adepto
José Magalhães, o adepto, é um empresário de Matosinhos e foi esta segunda-feira ouvido por um procurador no Tribunal de Guimarães. O caso esteve para seguir para julgamento sumário, mas o magistrado considerou que necessitava de mais dados e decidiu, por isso, abrir um inquérito e interrogar o empresário, que está indiciado por injúria agravada e ameaça agravada, confirmou o PÚBLICO. O Expresso adianta que o detido terá cuspido no oficial da PSP, mas à saída do tribunal nesta segunda-feira, acompanhado da advogada, o empresário garantiu que não o fez.
"Não cuspi. Fui acusado de injúrias e de tratar mal a PSP. Com essas afirmações [acusação] fico muito preocupado. Tinha a imagem da PSP como sendo alguém que nos defende. Algum dia imaginei que ia ser agredido? Não quero ver esta situação repetida com mais ninguém. Aquele agente dirigiu-se a mim perguntando o que se passava. Eu estava a explicar. Ele não estava a perceber. E ele caiu em cima de mim à bastonada e o pânico foi geral. Estava numa aflição", disse o empresário. José Magalhães explicou ainda que o oficial da PSP o questionou porque foi com os "miúdos ao futebol".
Este caso está a causar polémica, não só pela força utilizada na detenção e mas também pelo facto de uma criança pequena ter assistido a tudo. Nas imagens transmitidas pela CMTV, vê-se um homem vestido com a camisola do Benfica, acompanhado por dois filhos e pelo pai, a discutir com um agente da PSP, nas imediações do Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, após o jogo entre o Vitória local e o Benfica que daria o bicampeonato à equipa de Lisboa.
O polícia acaba por deitar José Magalhães ao chão e agride o pai deste, avô das duas crianças presentes. De seguida, um outro agente deteve o homem, perante os gritos do filho mais novo do detido. Um elemento do corpo de intervenção da PSP acabou por agarrar a criança, tentando que ela não se apercebesse dos detalhes da detenção do homem.
"Eu estava desesperado com a segurança dos miúdos. Já estávamos há meia hora, três quartos de hora parados dentro do estádio. Tivemos a compreensão de quatro agentes à porta do estádio que nos deixaram sair, mas depois o comandante da Esquadra de Investigação Criminal da PSP de Guimarães, o senhor agente Filipe Silva, veio perguntar o que estava ali a fazer", explicou José de Magalhães, de 43 anos, à CMTV.
O empresário de Matosinhos disse que respondeu ao agente que as autoridades estavam a fazer um "mau trabalho" por não deixarem as pessoas sair do estádio, adiantando que estava a socorrer o filho quando foi abordado pelo agente que o agrediu e que a seguir agrediu o seu pai, enquanto as crianças choravam e gritavam, como se pode ver nas imagens. José Magalhães disse ainda que o agente da PSP lhe perguntou porque é que tinha levado as crianças para o estádio e que ele lhe terá respondido que "levava os miúdos para onde quisesse, onde houvesse festa e onde se sentissem bem". Ainda segundo a CMTV, o homem foi libertado cerca da meia-noite, tendo sido constituído arguido.
Este foi um dos incidentes relacionados com a festa de campeão do Benfica, que ficou ainda marcada por confrontos entre adeptos e polícia no Marquês de Pombal, em Lisboa.
13 detidos em Lisboa
Em Guimarães, a PSP diz ter detido seis pessoas por desobediência, injúrias, ameaça com réplica de arma de fogo e posse de artigos pirotécnicos. “Foram assistidos por equipas da Cruz Vermelha dois polícias por ferimentos resultantes de intervenções policiais, desconhecendo-se o número de cidadãos que igualmente possam ter sido assistidos”, acrescenta a PSP.
De acordo com o relato da PSP, os problemas começaram antes do jogo logo pelas 17h45, altura em que foram “detectados vários focos de tensão” com “especial relevo para o que ocorreu nas imediações do estádio e que envolveu cerca de 500 adeptos afectos ao Benfica e cerca de 300 adeptos do Vitória Sport Clube de Guimarães”. Nesse confronto, os adeptos terão arremessado garrafas, pedras, artefactos, very lights, petardos além das agressões entre os dois grupos. Também o autocarro do Benfica ficou com os vidros partidos depois de ser atingido por vários objectos.
Já no final do jogo, um grupo de adeptos “provocou diversos danos no mobiliário” no interior do estádio “com destruição parcial de WC e do bar e o arrombamento de uma arrecadação de material e consequente furto de merchandising afecto a outro grupo de adeptos”.
Em Lisboa, nas imediações do Parque Eduardo VII, 16 polícias ficaram feridos “com escoriações graves, devido sobretudo ao arremesso de pedras, garrafas de vidro e material pirotécnico, havendo um veículo da divisão de trânsito com um vidro partido”, acrescenta a PSP. Na capital, a PSP deteve 13 pessoas e recebeu 13 queixas por roubos. Já no Porto, foram detidas sete pessoas no âmbito de desacatos ocorridos durante os festejos.
O presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, já reagiu nesta segunda-feira aos incidentes, numa mensagem publicada no site oficial do clube onde começa por agradecer o apoio dos adeptos.
"Devo um agradecimento muito especial a todos os benfiquistas que, de norte a sul do país, de Timor a Luanda, de Paris a Toronto, festejaram a conquista deste título", escreve Luís Filipe Vieira, para depois acrescentar: "Devo confessar igualmente alguma frustração. A frustração de quem já viu as imagens da criança que em Guimarães assistiu à detenção do pai de forma violenta e sem razão aparente, a frustração de quem viu os incidentes que interromperam os nossos festejos no Marquês nesta madrugada", referiu.
O presidente do Benfica considera que "o futebol não pode pactuar com qualquer tipo de violência e que é preciso apurar responsabilidades", advertindo que "é preciso que os responsáveis pela violência da noite passada sejam identificados e punidos". com Lusa