The Bravest Man in the Universe

Foto

Quer na sua vertente mais orquestral, quer na sua vida mais eléctrica, soul e funk pareciam repentinamente obsoletos - num movimento que acompanharia o jazz - e a tentativa de sincronização com a produção de então far-se-ia acolhendo elementos de uma crescente hegemonia da música de dança via electrónica (primeiro disco, depois tudo o resto) ou numa colagem clara a uma pop que colocava a soul clássica em suspensão e abria espaço para uma geração de malibarismos vocais. Womack seguiu, em esforço e desamparado, essa tentativa de comunicar com o presente após "The Poet", em 1981, afundou-se em edições cada vez mais irrelevantes e o seu nome regressou para o sítio de onde viera: ficou trancado nos anos 70, como fazedor de uma soul pungente e detentor de um orgulhoso currículo onde se conta a sua guitarra para um dos mais brilhantes discos da História da música: "There''s a Riot Going On", o psicadelismo afro de Sly and the Family Stone. A partir desse momento, o insucesso e o esvaziamento artístico passaram a confundir-se enquanto causa e consequência do uso desbragado de drogas. Até ao dia, num passado muito recente, em que Damon Albarn fabricou uma canção para os Gorillaz sobre a qual começou a ouvir uma voz sonhada demasiado familiar. Quando ligou para Womack, confessou entretanto a lenda soul, este receou que fosse alguém a tentar sacar-lhe um punhado de dólares. Mas, afinal, era a oferta para cantar em "Stylo", um dos singles de Plastic Beach. Foi altura para o google informar muita gente sobre quem era este Bobby Womack e para a relação entre os dois resultar no empenho de Albarn em voltar a gravar o seu herói com a garantia tanto de um justo mediatismo como também, mais importante ainda, de um conjunto de canções inteligentes (na forma como não forçam Womack a sair de casa e não tentam emular os clássicos "Understanding", "Across the 110th Street" e "The Facts of Life".) E é por isso que se há uma Lana del Rey a emprestar a sua sedução austera a "Dayglo Reflection" - original de Sam Cooke, confirmando que o passado, a estar presente, não é culpa de Womack -, há por outro uma co-autoria quase total de Albarn partilhada com Harold Payne, eterno colaborador de Womack. Ao classicismo destes responde depois Richard Russell com batidas de r & b contemporâneo, mas sem lhes injectar um fogo que consuma a primeira linha da voz em plena forma (e com os anos a darem-lhe uma belíssima rugosidade) de Womack. Bobby Womack volta mas não em modo “museu de cera”. "The Bravest Man in the Universe" declara precisamente a coragem de ser de hoje. Não é disco de pescoço torcido para trás.

Sugerir correcção
Comentar