Os miúdos também podem ser escritores

Associação Atrevida promove concurso literário para crianças lusófonas. Os textos deverão ser entregues até 30 de Dezembro

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Querem tão-só promover a escrita junto dos miúdos e dar-lhes voz Paulo Pimenta

É a terceira edição do Concurso Internacional de Escritores Infanto-Juvenis Lusófonos, que já tem duas antologias editadas: Ler É Bom, Escrever É Melhor e A Pátria É a Infância.

Não andam à procura de meninos-prodígio, querem tão-só promover a escrita junto dos miúdos e dar-lhes voz. “As crianças não têm espaço para comunicar, para escrever as suas histórias, para nos contar o que é que lhes vai na cabeça, no seu imaginário. Considerávamos que era uma lacuna não haver uma edição conhecida de literatura infanto-juvenil de escritor. Isto é, feita por eles próprios”, diz Paulo Madrid, um dos fundadores da associação, que começou em Espanha, em 2009 (Projeto La Atrevida), em parceria com Javier Betemps, ambos professores. Agora, já contam com mais cinco elementos na equipa.

“Não é que a literatura infanto-juvenil tal como está não seja adequada às crianças, mas não é criada por elas”, prossegue, dizendo ainda que a ausência de ilustrações é propositada, “para dar peso à palavra, em contraposição ao que se vê hoje em dia na literatura infanto-juvenil, em que a palavra está a ser devorada pelo macrodesenho”.
 
Catarina Ferreira de Castro, 12 anos
“Sempre que escrevo, sinto que estou a voar e não posso cair” (in O diário)

Maria Maravalhas, 14 anos
“Levo tudo na mala: desilusões, angústias e solidão. Mas sobretudo as boas recordações! Apenas espero ter uma boa viagem” (in Último dia)

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Antologia Atrevida: Ler É Bom, Escrever É Melhor Vários autores Livraria Luso-Hispânica La Atrevida, 93 págs., 10€

Os autores dos três melhores textos, além de os verem editados em livro, “recebem um computador portátil e um lote de livros” (1.º prémio), “uma caneta de aparo e um lote de livros” (2.º prémio) e “um lote de livros” (3.º prémio), explica Paulo Madrid, que diz que os títulos oferecidos são uma escolha dos jurados do concurso.

Para a edição de 2014, o júri ainda não está totalmente definido, mas o de 2013, de cuja selecção resultou a II Antologia Atrevida (Autêntica Literatura Infanto-Juvenil): A Pátria é a Infância, foi composto pelos escritores Alice Vieira (Portugal), Ondjaki (Angola) e Delmar Maia Gonçalves (Moçambique), por Fernando Pinto do Amaral (Plano Nacional de Leitura), António Carlos Cortez (professor e crítico literário), Isabel Garcez (Associação Cultural Prado), Margarida Silva (professora) e Clara Palma, a jovem vencedora do I Concurso Internacional de Escritores Infanto-Juvenis La Atrevida, com o texto Gotinha medrosa.

Presença garantida entre os jurados deste ano terá Marta Baptista Amaral (14 anos em 2013), que venceu o 1.º prémio no ano passado com Breve conto do cantor mudo.

“(…) um dia de um Outono ameno a dissolver-se num Inverno gelado, um dia salpicado de luzes antecedentes do tão ansiado Natal, um dia de lareiras acesas, um dia de luva e cachecol, nesse dia, das suas há muito adormecidas cordas vocais, soltou-se um som claro e melodioso que fez o público suster a respiração (…)”

No conjunto das duas edições, a associação recebeu textos de 1170 crianças. Como algumas enviam mais do que um, foram avaliados cerca de 1350 originais. No primeiro ano, candidataram-se 350 autores, mas no ano seguinte a participação foi de mais do dobro (820 autores). Geografia: chegaram candidaturas de todas as antigas colónias portuguesas, de comunidades portuguesas e de luso-descendentes do Centro da Europa e de todo o território nacional – mais de Lisboa e Norte interior, com alguma representação do Algarve.

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II Antologia Atrevida (Autêntica Literatura Infanto-Juvenil): A Pátria É a Infância Vários autores Livraria Luso-Hispânica La Atrevida, 112 págs., 10€

Há total liberdade quanto à extensão, temática e formato dos textos. “Não queremos limitar em nada o processo criativo do autor. Pode ser um poema, a letra de uma música, uma frase solta, o que quiserem. A partir daí, os procedimentos são iguais aos de qualquer concurso”, diz Madrid, também explicador de Matemática “e de tudo e mais alguma coisa”. Além da idade dos candidatos, a única condição é a de escreverem em português, “nem têm de ser portugueses, apenas lusófonos”. Obrigatória também é a autorização de um adulto responsável pela criança.

João Pedro Barbosa, 14 anos
“Para os mais lentos, estou a falar dos políticos do País Perdido. Já foram homens honrados, verdadeiros e, a fim de contas, boas pessoas. Mas, hoje em dia, os políticos são completamente o oposto: tornaram-se corruptos, homens e mulheres sem alma nem coração. Cheios de dívidas por pagar, e roubam-nos a nós, povo, para poder pagá-las. Fomos enganados” (in País perdido)

Como é que têm a certeza de que foi a criança que escreveu e não contou com a ajuda de um adulto? “É sempre um risco, mas queremos confiar nas boas intenções de toda a gente. Principalmente dos pais, irmãos e professores. Mas isso nunca se vai conseguir em nenhum concurso com um autor, seja adulto ou criança.”
Mais fácil é detectar eventuais plágios, que às vezes acontecem: “Há textos de que suspeitamos, pela sua elevada qualidade, terem sido retirados de algum sítio. Tentamos descobrir a origem e, normalmente, conseguimos.”

Com vários parceiros institucionais ligados à educação, como o Plano Nacional de Leitura, a Rede de Bibliotecas Escolares, as Bibliotecas Municipais de Lisboa, a Geste (Gestão de Estabelecimentos Escolares) ou o Instituto Camões, a Associação Atrevida faz por marcar presença em encontros de professores, educadores e bibliotecários. Por isso participa nesta sexta-feira no 12.º Encontro de Professores e Educadores do Concelho de Sintra sobre Bibliotecas Escolares (Eterna Biblioteca), no Centro Cultural Olga Cadaval, às 11h30.

A associação quer demonstrar com este concurso que, “assim como os adultos podem escrever uma história mais infantilizada, uma criança pode escrever uma história um pouco mais adulta”. Sobre os textos já publicados nas duas antologias, Paulo Madrid conclui: “Não são histórias engraçadinhas, que são muito queridas, mas que não entretêm ou não chegam a ser válidas para os adultos. Muitos destes textos são boa literatura e boa literatura infanto-juvenil. E não apenas para crianças.”

Regulamento no site da Associação Cultural Atrevida: http://www.culturaatrevida.com/

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