O novo Acordo Ortográfico começou a ser aplicado nos documentos do Estado a 1 de Janeiro, vigorando em todos os serviços, organismos e entidades na tutela do Governo português. No entanto, existem ainda instituições que não o aplicaram, como a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa ou o Centro Cultural de Belém, que voltou atrás na decisão depois do novo presidente Vasco Graça Moura ter ordenado que todos os conversores – ferramenta informática que adapta os textos ao acordo – fossem desinstalados dos computadores da instituição. Desde então, a discussão tem estado em aberto, tendo surgindo cada vez mais vozes contra a aplicação do acordo.
Agora o tema chegou às páginas do jornal angolano de capiatis públicos, depois da reunião, em Lisboa, dos ministros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), onde se pode ler que “nenhum país tem mais direitos ou prerrogativas só porque possui mais falantes ou uma indústria editorial mais pujante”. No editorial, o jornal escreve que a questão do Acordo Ortográfico foi um dos temas debatidos na reunião de ministros, uma vez que a Angola e Moçambique ainda não o ratificaram.
O jornal, dirigido por José Ribeiro, escreve que é importante que todos os países “respeitem as diferenças e que ninguém ouse impor regras só porque o difícil comércio das palavras assim o exige”, arrebatando assim o argumento de que o Acordo Ortográfico servirá para aproximar as comunidades de língua portuguesa.
“Escrevemos à nossa maneira, falamos com o nosso sotaque, desintegramos as regras à medida das nossas vivências, introduzimos no discurso as palavras que bebemos no leite das nossas Línguas Nacionais”, defende o editorial, acrescentando que “do ‘português tabeliónico’ aos nossos dias, milhões de seres humanos moldaram a língua em África, na Ásia, nas Américas”.
Exemplificando, o jornal recorre ao quotidiano dos jornalistas. “Ninguém mais do que os jornalistas gostava que a Língua Portuguesa não tivesse acentos ou consoantes mudas. O nosso trabalho ficava muito facilitado se pudéssemos construir a mensagem informativa com base no português falado ou pronunciado. Mas se alguma vez isso acontecer, estamos a destruir essa preciosidade que herdámos inteira e sem mácula. Nestas coisas não pode haver facilidades e muito menos negócios. E também não podemos demagogicamente descer ao nível dos que não dominam correctamente o português”, escreve o jornal, defendendo exactamente que os mais sábios ensinem os que menos sabem.
Para o “Jornal de Angola”, o português falado neste país tem características específicas, “uma beleza única e uma riqueza inestimável”, que devem ser mantidas, assim como tem o português do Alentejo ou o português da Bahia. “Todos devemos preservar essas diferenças e dá-las a conhecer no espaço da CPLP”, atesta, concluindo que não é aceitável que através de um qualquer acordo a grafia seja esquecida. “Se queremos que o português seja uma língua de trabalho na ONU, devemos, antes do mais, respeitar a sua matriz e não pô-la a reboque do difícil comércio das palavras.”
A decisão de adopção do Acordo Ortográfico (AO) foi tomada em Conselho de Ministros a 25 de Janeiro de 2011, e começou oficialmente a ser adoptado a 1 de Janeiro de 2012, estando prevista a aplicação generalizada do acordo para 2014.