Governo vai retirar da lista património protegido por lei

Foto
O prazo de apreciação termina em Janeiro de 2011 Foto: Enric Vives-Rubio

A partir do momento em que ficam a aguardar classificação patrimonial, os edifícios ou zonas beneficiam de uma protecção legal idêntica à dos já classificados. Ou seja, se os seus proprietários quiserem transformá-los, precisam de autorização do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (Igespar), e a demolição só pode ser autorizada em circunstâncias especiais.

Acontece que, nalguns casos, os processos em vias de classificação se arrastam há três e quatro décadas, sem que tenha sido tomada uma decisão final. Daí que um decreto-lei de Outubro passado com novas regras para a classificação tenha, nas suas disposições finais, imposto o prazo de Janeiro de 2011 para os serviços do Ministério da Cultura (MC) darem por concluídos os processos, sob pena de caducarem. A legislação prevê que, excepcionalmente, esse prazo possa ainda ser prorrogado por mais um ano, até Janeiro de 2012.

Apesar da falta de pessoal que algumas delas enfrentam, as direcções regionais da Cultura estão neste momento a fazer um levantamento do estado dos imóveis que se encontram nesta situação. Se entenderem que a classificação ainda se justifica, terão de acabar de instruir os respectivos processos antes que caduquem.

Algarve fechou 14 processos

É já certo que muitos perderão a protecção legal de que usufruíam até aqui. "Não reúnem as características de autenticidade e originalidade que exige a lei de bases de protecção do património cultural", explica o director regional da Cultura de Lisboa e Vale do Tejo, João Soalheiro, que diz ainda não ter noção de quantos processos vai deixar caducar por este motivo. Admite, no entanto - tal como a sua colega do Algarve, Dália Paulo -, ser impossível concluir no prazo previsto todos os processos, razão pela qual terá de recorrer ao prorrogamento excepcional.

Por que razão não foi simplesmente ordenado aos serviços do MC que tratassem dos processos, sem a ameaça da caducidade e da consequente perda de toda a protecção legal? O PÚBLICO tentou obter explicações sobre estas matérias junto do Igespar, sem sucesso. Liderada pelo antigo director do Instituto do Património, Elísio Summavielle, a Secretaria de Estado da Cultura também não quis prestar qualquer esclarecimento. "Não é matéria para o senhor secretário de Estado", observou um porta-voz deste organismo, alegando tratar-se de um assunto técnico e não político.

"Se a ameaça de caducidade pode ser perigosa para o património? Também pode constituir uma oportunidade de conhecer o estado dos edifícios, pois obriga-nos a concentrar esforços", diz a directora regional da Cultura do Algarve, Dália Paulo. Nesta região, das três dezenas de imóveis em vias de classificação, este organismo já concluiu 14 processos, todos com parecer favorável à obtenção da categoria de imóveis de interesse público. São os casos do Mercado de Escravos, em Lagos, dos menires de Vila do Bispo ou da villa romana de Alcoutim. Outros imóveis, como o Teatro Mascarenhas Gregório, em Silves, ou o edifício da alfândega de Olhão, tornar-se-ão de interesse municipal, uma classificação de menor prestígio que é dada pelas autarquias e implica uma protecção patrimonial menor. Dália Paulo quer ainda ver reconhecido como monumento nacional o Forte de São Sebastião, em Castro Marim.

Já na região de Lisboa e Vale do Tejo, são 200 os imóveis em vias de classificação. "Destes processos, 62 já estão homologados", descreve João Soalheiro. Outros, como o Hotel Ritz, esperam a ida ao conselho consultivo do Igespar, um grupo de "notáveis" e especialistas que a tutela chama a pronunciar-se quando tem dúvidas sobre a decisão a tomar. A Igreja do Sagrado Coração de Jesus, de Teotónio Pereira e Nuno Portas, deverá ver reconhecido o seu valor. Por classificar, embora com todo o processo instruído de forma favorável, continua a estar a Fundação Calouste Gulbenkian, que aguarda decisão do Governo.

Em Maio passado, o secretário de Estado da Cultura considerou "um exagero" os 4500 imóveis classificados existentes em Portugal, e sublinhou que a protecção que a lei lhes confere não é real. Antes disso, já havia defendido a partilha de responsabilidades com as autarquias na gestão deste tipo de património.

Sugerir correcção
Comentar