Governo envia para o Parlamento proposta de lei para taxar dispositivos electrónicos
Aparelhos capazes de armazenar ficheiros poderão ter um acréscimo de preço para compensar os detentores de direitos de autor.
A taxa, que já existe desde 1998 para suportes como CD, DVD e cassetes, seguirá agora para discussão no Parlamento.
Numa conferência de imprensa, no final do Conselho de Ministros, o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, afirmou que a “obsolescência do conjunto de equipamentos” que já são actualmente taxados “levou a uma quebra de 90%” nas receitas conseguidas com esta taxa entre 2006 e 2013, que no ano passado rondaram os 600 mil euros. Esta situação levou o Governo a querer rever a tabela dos equipamentos abrangidos pela lei, explicou Barreto Xavier.
O valor é acrescentado ao preço do aparelho antes do IVA e dependerá da natureza dos equipamentos e da respectiva capacidade de armazenamento. O Governo não divulgou os valores que propõe, mas, em versões anteriores da proposta, as taxas oscilavam entre os cinco e os 25 cêntimos por gigabyte, com limites máximos para cada tipo de dispositivo.
A lei determina que a taxa não é paga pelos consumidores, mas por quem introduz os produtos no mercado português, o que na maioria das vezes significa um importador, como uma marca de aparelhos de electrónica ou um grossista que depois coloca os produtos no retalho. No entanto, Ana Isabel Morais, directora da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição, diz não ter dúvidas de que o acréscimo será repercutido no preço para os consumidores.
A aplicação da taxa aos equipamentos digitais tem vindo a ser pedida há anos pelos representantes dos detentores de direitos de autores, mas é duramente criticada por importadores e distribuidores, com o argumento de que terá efeitos nocivos na economia.
Ana Isabel Morais critica o princípio de taxar os aparelhos capazes de armazenar obras. "Estamos a insistir nos modelos do século XX, do mundo analógico". Para a directora da APED, esta taxa levará a que os consumidores entendam que não devem pagar pelos conteúdos, uma vez que já pagaram mais pelo aparelho. Por outro lado, fará com que "o mercado fique distorcido", com as empresas em Portugal a enfrentarem a concorrência de empresas de vendas online, onde os consumidores poderão encontrar produtos mais baratos. "No final, não haverá pagamento de taxas nem de impostos em Portugal."
A taxa é cobrada pela Associação para Gestão de Cópia Privada, que depois distribui o dinheiro pelas várias entidades que representam os autores e outros detentores de direitos, entre as quais a Sociedade Portuguesa de Autores. Das receitas, 20% destinam-se ao Fundo de Fomento Cultural, um fundo estatal de apoio a actividades culturais.
O presidente da Agecop, João David Nunes, congratulou-se com a aprovação em Conselho de Ministros. "Finalmente foi feita esta correcção da cópia privada em Portugal, que se adequa ao mercado".
Notando não conhecer a versão final do documento, David Nunes duvidou da possibilidade de as novas taxas representarem receitas anuais entre os 15 e os 20 milhões de euros, valores avançados pelo secretário de Estado da Cultura. "Essas estimativas são muitas vezes feitas em função de cobrar 100% do mercado, o que não acontece."
A ideia de compensar os autores pela cópia privada, que é uma actividade legal, é tudo menos consensual. A notícia de que o Governo estava a voltar à carga na revisão dos aparelhos abrangidos pela taxa foi nos últimos dias tema frequente de discussão acesa nas redes sociais, numa reedição dos debates de 2012 (quando a deputada socialista e ex-ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, levou ao Parlamento um projecto de lei semelhante) e de 2013, quando Barreto Xavier anunciou querer levar a proposta ao Parlamento. Um argumento frequente no Twitter e no Facebook é o de que os utilizadores podem comprar aparelhos para outros usos que não o de fazerem cópias de material protegido por direitos de autor.