Direito de autor, o único capital dos criadores

Falta encontrar soluções que tornem este direito consagrado mais defensável e reconhecido.

Os primeiros dias de Junho costumam ser, há muitos anos, o tempo de encontro das sociedades de autores para fazerem o balanço das dificuldades que defrontam e definirem estratégias programáticas para os combates futuros, designadamente na reunião máxima da CISAC (Confederação Internacional das Sociedades de Autores e Compositores), com sede em Paris. Uma vez mais foi declarado que nunca as sociedades de gestão colectiva enfrentaram tantas dificuldades e incompreensões, em particular na Europa, onde as condições políticas e o avanço da revolução tecnológica são geradores de novos desafios e barreiras há mais de uma década inimagináveis.<_o3a_p>

Como é habitual, fizeram-se ouvir durante dois dias, também na assembleia geral do BIEM e numa importante reunião do Writers and Director Worlwide, as vozes da inquietação, da combatividade e da criatividade organizativa, com destaque para as de grandes autores como Jean-Michel Jarre, famoso compositor, intérprete e presidente da CISAC, onde sucedeu a Robin Gibb, compositor e cantor dos “Bee Gees”, e a de Paul Williams, grande criador de canções e presidente da poderosa ASCAP, sociedade dos autores de música dos Estados Unidos da América. A SPA esteve presente também na sua condição de membro da Direcção do Grupo Europeu de Sociedades de Autores, do Comité Executivo do Writers and Directors Worldwide e de presidente, desde finais de abril passado, do Comité Europeu da CISAC, o que lhe permitiu intervir sobre o programa em marcha para assegurar a cooperação entre sociedades de autores do espaço lusófono, em África e em Timor Leste.<_o3a_p>

Em Londres, também para comemorar o centenário de fundação da PRS, uma das mais importantes sociedades de autores mundiais, os dirigentes vindos de todo o mundo não puderam deixar de reflectir sobre as seguintes palavras de Leslie Boosey, presidente daquela sociedade em 1922, que se interrogou nesse ano: “Porquê toda esta conversa sobre a música gratuita? E não sobre a comida ou a roupa gratuita? Na verdade, os compositores também de viver.” Tornou-se assim evidente que o combate contra o fenómeno da gratuitidade é antigo e profundo, vindo de uma época em que ninguém poderia imaginar a chegada da Internet e as suas consequências para uma gestão eficaz e abrangente do direito de autor.<_o3a_p>

Acabado de chegar do Japão, Jean-Michel Jarre apelou aos autores de todo o mundo para “fazerem mais barulho”, recordando que empresas como a Google “tudo farão se não as pressionarmos para não nos fazerem mal, a nós que somos accionistas virtuais dessas companhias”.<_o3a_p>

Depois de recordar que “uma das nossas prioridades totais é a luta pela defesa da Cópia Privada”, o compositor francês apelou também no sentido do estreitamento das relações de cooperação e diálogo entre a UNESCO, a CISAC e a OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual, agência da ONU com sede em Genebra) e pediu aos autores para “ se unirem e intervirem muito mais nas redes sociais em defesa dos seus direitos”. Na mesma linha, sempre com grande criatividade e alegria, interveio Paul Williams, recordando que é “porque a criação não tem preço que é tão valiosa na vida das pessoas e dos países”.<_o3a_p>

Por sua vez, o compositor italiano Lorenzo Ferrero, presidente do Conselho Internacional de Autores de Música (CIAM), sublinhou que “temos de sair de reserva dos índios e valorizar cada vez mais o que fazemos pela cultura e não falar apenas de dinheiro, definindo com clareza que são os nossos amigos”. E logo houve quem acrescentasse que “ as pessoas têm a nossa música no coração, mas não os autores. Vivemos numa cultura industrial de produção em que os autores são esquecidos. Mas eles não criam “comodities” mas sim produtos de excelência que nos trazem felicidade”. E Jean-Michel Jarre concluiu dizendo que “ainda não conseguimos fazer chegar a nossa mensagem às ruas”.<_o3a_p>

Nestas reuniões de Londres tudo foi dito e definido, no quadro da grande diversidade cultural e política que as sociedades de autores representam. Porém, falta encontrar as soluções estratégicas e de cooperação que tornem este direito consagrado mais defensável e reconhecido contra os interesses das indústrias dos grandes operadores que os poderes políticos, por indiferença ou conveniência eleitoral, teimosamente favorecem.

Escritor, jornalista e presidente da Sociedade Portuguesa de Autores<_o3a_p>

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