Defender o livro, assegurar o futuro europeu

Não pode haver uma política consistente de defesa do livro e do seu futuro que não coloque a tónica no direito de autor.

A iniciativa teve na sua origem o presidente do Centro Nacional do Livro de França, Vincent Monadé, e visa garantir o respeito efectivo dos direitos de autor e, simultaneamente, os direitos dos leitores, num período em que cresce o número dos que, erroneamente, supõem que uma coisa só será possível com a anulação da outra. Mas defender o livro e o seu futuro é, ao mesmo tempo, garantir a redução da taxa do IVA para os livros impressos e digitais e assegurar a plenitude da liberdade de escolha para o leitor, a quem deverá ser garantido o acesso às obras no dispositivo que se adeque à sua conveniência e escolha.

Esta declaração assinada a 9 de Outubro começa por recordar e enfatizar o facto de que “o livro é a primeira indústria cultural da Europa”, o que nos leva, retrospectivamente, a pensar na enorme revolução desencadeada pelo invento de Gutenberg quando transformou o livro de bem muito dispendioso e praticamente inacessível num instrumento de informação e ampla partilha do conhecimento, o que provocou profundas alterações na forma de pensar e organizar a sociedade e os direitos do Homem nos séculos seguintes.

Noutra passagem do texto afirma-se que “o digital e o comportamento dos consumidores criam ocasiões inéditas e novos mercados para difundir a criação. Os actores do livro, autores, tradutores, editores, livreiros, bibliotecários e as instituições que os suportam procuram encontrar os novos modelos capazes de proteger a transmissão da literatura, das ideias e da educação, oferecendo aos consumidores a oferta mais diversificada e a mais acessível possível, preservando ao mesmo tempo milhões de postos de trabalho”.

Depois de acentuarem que este assunto deverá estar “no coração do projecto político europeu”, os autores do documento salientam que “em toda a Europa e no seio da União Europeia, os Estados defendem o sector do livro”, por serem subscritores da Convenção de Berna para a protecção das obras literárias e artísticas e da convenção sobre a protecção e a promoção da diversidade das expressões culturais.

A declaração define o direito de autor “como a condição essencial do desenvolvimento da diversidade cultural” e “um dos elementos fundamentais da criação, da inovação e do emprego para a Europa, e a condição sine qua non da valorização do pensamento e das línguas europeias”. “A prioridade – sublinham os autores da declaração – é a defesa do direito de autor, a luta contra a pirataria de conteúdos, o combate pela remuneração justa da criação e da facilitação dos usos legais no coração das nossas acções comuns”. Fica assim claro que não pode haver uma política consistente de defesa do livro e do seu futuro que não coloque a tónica no direito de autor.

Para além de se baterem pela continuidade do debate sobre estas matérias, com vista à criação de uma verdadeira rede dos organismos europeus do livro, os autores e difusores da declaração, combinando sempre numa frente comum os interesses dos autores e dos leitores, consideram inadiável a luta pela redução da taxa do IVA, seja qual for o suporte contemplado, na União Europeia e em toda a Europa, acentuando a urgência de se defender o livro e o valor civilizacional a ele associado de “certas práticas comerciais de algumas multinacionais da Internet que falseiam a concorrência”.

Defender hoje o livro e o seu futuro, numa Europa que se interroga sobre o seu futuro, é preservar valores de cultura, de cidadania, de ética e de civilização que são essenciais para que o diálogo e a vitalidade das ideias prevaleçam, numa clara alternativa às formas de terror que não cessam de se avolumar, sejam elas as impostas pelos mercados e pelas suas agências sem rosto, sejam as resultantes dos modelos de radicalismo religioso que fazem da crença extremada uma ideologia feroz que deixa o mundo à beira de um verdadeiro abismo.

Escritor, jornalista e presidente da Sociedade Portuguesa de Autores

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