Os melhores filmes de 2012 para o Ípsilon (lista completa)
Estes são os melhores filmes de 2012 para os críticos do Ípsilon.
1. Tabu – Miguel Gomes
Este é o filme que em 2012 fez uma parte do mundo sonhar de olhos abertos. Vendo nele uma "colossale ambition sur la construction et le déclin de l'imaginaire occidental" (Le Monde) ou sinais de um país "home to one of Europe's richest film cultures" (New York Times) - e essa parte do mundo sonhou com macacos peludos pendurados. Ele figura aqui como "o filme do ano", na lista resultante das somas de três votações individuais, e permitimo-nos delirar com um sonho colectivo. No cinema de Miguel Gomes foi-se alargando o intervalo entre o desejado e o possível, sobrando cada vez mais espaço para fantasmas - como se os filmes existissem só para eles. O paraíso reencontrado - ou seja, coisa perdida - é a "nossa" África de King Kong, e é o "nosso" cinema. A suspensão em graça do quase "silent film" na segunda parte, a dos jovens, foi uma dança do ventre com que o realizador dominou o espectador e talvez tenha subvalorizado a ternura com que, na primeira parte,olhou para os velhos. Gomes nunca tinha dado sinais, no seu cinema fixado nos calções da infância prolongada, de que podia chegar aí. Chegou. V.C.
2. O Cavalo de Turim – Béla Tarr
Tarr vai-se embora (diz que não filma mais) mas faz questão de deixar a porta fechada e a luz apagada. O Cavalo de Turim fecha a porta e apaga a luz, num retrato da desolação humana que tem mil e um pontos de contacto com a realidade contemporânea, sem deixar de se articular com a "metafísica" de Tarr, e a sua preocupação com um mundo nietszcheanamente "pós-Deus", onde os homens estão mais abandonados do que nunca. Filme enorme, e quase out of time. L.M.O.
3. (ex-aequo) Vergonha – Steve McQueen
A relação com uma estirpe de personagens e com uma atitude (as duas, adultas) já extinta: a de, sob a capa de uma explicitação física e sexual, um cineasta estar interessado, sobretudo, no silêncio das personagens. Um filme de um vigoroso pudor, afinal, como O Último Tango em Paris (Bertolucci, 1972), uma possível "linhagem" europeia para Vergonha. É que não são só os americanos que perderam a mão para o cinema adulto. It's a shame. V.C.
3. (ex-aequo) 4:44 Último Dia na Terra – Abel Ferrara
Alguns dos filmes de Ferrara parecem correr o risco de se extinguirem durante a projecção. Como se nesse momento se tornasse manifesta a sua impossibilidade. Como se um sentimento de catástrofe, se tivesse agarrado ao (seu) cinema, a uma forma de o produzir. Eis o que ele faz com um apartamento e com dois actores: sinais do que foi uma vez o cinema na terra. V.C.
5. Oslo, 31 de Agosto – Joachim Trier
Ninguém sai daqui incólume porque o que aqui se faz é pôr as perguntas "que interessam". As mais simples, que cabem numa frase, e que são as mais complexas porque não se respondem em duas palavras - e o que Trier faz é encenar esse questionamento com uma notável capacidade de não o reduzir a banalidades, numa corda bamba perfeitamente delineada entre o real e o fantasmagórico. É uma obra-prima. J.M.
6. (ex-aequo) Amor – Michael Haneke
A câmara, em Amor, está dentro do apartamento de Georges e Anne, à espera, sabendo que os pode assaltar. Mas sabendo-o, vai aprendendo a não o fazer. O que é leal em Amor, filme que começa com o cinema a arrombar as portas de uma intimidade, é a permanente negociação de uma intromissão. V.C.
6. (ex-aequo) O Gebo e a Sombra – Manoel de Oliveira
Quando a pobreza e a honradez entram em curto-circuito. Dois homens nascidos há mais de cem anos (o texto de um, Raul Brandão, o filme de outro, Oliveira) trazem-nos uma reflexão, de insuperável complexidade, sobre a pobreza como desígnio moral e ideológico, altamente perturbante quando sobreposta ao pano de fundo de Portugal 2012. Na suave severidade, e meticulosa austeridade, da mise en scène de Oliveira, tudo se liga a tudo, tudo rima com tudo, e isso é o trabalho de um génio.i. J.M.
8. (ex-aequo) Holy Motors – Leos Carax
O regresso de Léos Carax, num filme que impressiona por imensas razões, a menor das quais não sendo certamente a maneira como inventa uma maneira - de um burlesco quase circense - de falar de cinema. Sem ser um filme-puzzle - tem-se aquilo que se vê - desafia o espectador, faz-lhe exigências, pede-lhe que dê o melhor (ou o pior) de si próprio, faz por sacudi-lo do seu conforto. Cinema de "mau sangue", coisa de que estávamos bem precisados. Ainda por cima, belíssimo. Um filme do Carax. L.M.O.
8. (ex-aequo) É na Terra, Não é na Lua – Gonçalo Tocha e Dídio Pestana
Como estar perto da violência que é observar um mundo a acontecer? Arregalar os olhos, assombro verbalizado por sussurros? É o que fazem Gonçalo Tocha e Dídio Pestana, entrando na Ilha do Corvo como exploradores, o pudor, perante o colossal como num livro de aventuras ainda por escrever. Este filme, na verdade, pôs-nos na lua. V.C.
8. (ex-aequo) Jovem Adulta – Jason Reitman
É daqueles títulos que resume tudo o que se esconde nas entrelinhas do filme: Jovem Adulta é sobre gente que nunca cresceu (porque não quis) ou que cresceu cedo demais (sem querer). Comédia amarga sobre o teatro quotidiano da crueldade social, desespero e solidão a esconder-se por trás de uma desconstrução ácida da comédia romântica, estereótipos subvertidos dentro do respeito absoluto das regras: filme adulto a fingir-se de adolescente, tragédia a fingir-se de comédia, farsa a fingir-se de drama. J.M.
8. (ex-aequo) Le Havre – Aki Kaurismaki
O início de uma nova trilogia, que levará Kaurismaki a outras duas cidades portuárias da Europa. No porto do Havre não há marinheiros que dancem, mas há um engraxador que se mexe para salvar um miúdo africano da deportação. Tudo é "habitual" em Le Havre, até o humanismo estilizado, feito de um bricabraque referencial, e tudo é, por isso, tipicamente kaurismakiano. Mas está em ponto de rebuçado, perfeito. O grande filme idealista (e por isso, fantasioso) de 2012. L.M.O.
Escolhas de Jorge Mourinha, Luís Miguel Oliveira e Vasco Câmara
Artigo actualizado no dia 30/12 às 14h51: Lista actualizada com as primeiras escolhas