Museu das Marionetas do Porto abre para mostrar 25 anos de histórias

João Paulo Seara Cardoso, fundador do Teatro de Marionetas do Porto, já não pôde ver concretizado o seu sonho, que a partir de domingo fica registado na Baixa portuense.

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Galeria com as personagens do espectáculo "Vai no Batalha", uma das mais populares produções do TMP Rui Farinha

Quem vai abrir as portas do novo museu, que ocupa três pisos de um renovado edifício na histórica Rua das Flores, é Isabel Barros, coreógrafa do Balleteatro, viúva de João Paulo Seara Cardoso, sua parceira de aventuras artísticas em ambas as companhias, e que entretanto “herdou” a direcção do TMP. A companhia está a comemorar os 25 anos, com um programa lançado já no passado mês de Dezembro com a abertura de uma primeira exposição-instalação na galeria da Rua das Flores, mas também com a reposição das suas principais produções.

“O museu resume-se a um sonho que o João Paulo tinha de partilhar o espólio da companhia, de todas as criações que foram feitas ao longo de 25 anos, com ele durante 23 anos”, resume, em declarações à Agência Lusa, Isabel Barros, que assume esta abertura “contra a corrente” do que se vive na cultura neste momento.

Isabel Barros lembra que “o espaço alugado há 10 anos” por João Paulo “estava completamente a cair e que precisou de obras muito profundas, com uma intervenção do arquitecto João Gigante”. Esse foi “um esforço feito inteiramente à custa da companhia e de esforço pessoal, sem apoios, que esperemos que cheguem depois de o museu estar aberto”, afirma a coreógrafa.

Para os muitos espectadores que aprenderam a apreciar as peças do TMP no exíguo espaço da Rua de Belomonte, bem ali ao pé, o novo museu oferece-se como oportunidade para um reencontro diferente com as personagens, porque o objectivo, segundo Isabel Barros, “é trabalhar a proximidade com as marionetas que não estão fechadas, apelando ao toque e a uma visita muito dinâmica, onde nós podemos explicar técnicas de manipulação”.

Os visitantes vão aí poder encontrar-se com os bonecos que fizeram as personagens de Miséria, Macbeth, Paisagem Azul com Automóveis, Bichos do Bosque, Cinderela, algumas das 38 peças que constituem o património do TMP e um percurso iniciado, na segunda metade da década de 1980, com o Teatro D. Roberto, cujo teatro de pano também está exposto.

“É muito emblemático o Teatro D. Roberto, porque é o mais tradicional, e é um espectáculo que foi feito por todo o país pelo João Paulo e que nós recuperámos agora para ser feito por uma actriz da companhia”, lembrou Isabel Barros.

No novo espaço da Rua das Flores vai ser também possível reencontrar Fredo Brilhantinas, o arrumador que, com uma série de personagens políticas locais e nacionais da época, fazia parte do elenco da emblemática revista Vai no Batalha (1993), que permaneceu em cena durante meses e se afirmou um dos maiores êxitos da companhia.

O Fredo Brilhantinas, que celebrizou frases como “não me bata na cabeça que eu ando a estudar à noite”, foi uma personagem criada por Seara Cardoso a partir da figura real de um arrumador do Largo de São Domingos, perto do Teatro de Belomonte, a quem o encenador entregava a chaves do carro. “Um dia chegámos lá e perguntaram ao João Paulo: ‘O senhor é que é o dono do Volvo? Olhe que esse carro caiu ao Douro’. Ainda chegámos a tempo de ver tirar o carro do rio. O arrumador tinha ido dar uma volta com ele e despistou-se; valeu 50 contos na sucata, e João Paulo nunca apresentou queixa contra ele”, recorda Isabel Barros.

Estas e outras recordações podem ser revisitadas a partir deste domingo, num museu que deverá mudar os bonecos expostos duas a três vezes por ano, “numa relação sempre dinâmica entre a companhia e o museu”, e que já iniciou um programa para visitas para escolas.