As Árvores Que Comiam Papel foram fotografadas por crianças

Livro electrónico reúne imagens feitas por alunos no Douro nas quatro estações do ano.

Fotogaleria
Capa do ebook As Árvores Que Comiam Papel DR
Fotogaleria
Chão coberto de folhas de plátano e carvalho americano, na Quinta da Pacheca, em Cambres Susana Neves
Fotogaleria
Mapa do percurso realizado até chegar aos locais onde se fotografaram as árvores durienses: Cambres, Valdigem, Fontelo DR
Fotogaleria
A cerejeira ou “cerdeira” no Outono, Eirados, Valdigem Susana Neves
Fotogaleria
Castanheiros no Alto de São Domingos, Armamar Pedro Costa
Fotogaleria
Pinheiro tombado, Alto de São Domingos Nuno Araújo
Fotogaleria
Pinha, ouriço de castanheiro e folhas de eucalipto, Alto de São Domingos Cláudia Silva
Fotogaleria
Líquen, Alto de São Domingos Vanessa Rodrigues
Fotogaleria
Mimosas, Alto de São Domingos Cláudia Oliveira
Fotogaleria
Sementes de mimosa, Alto S. Domingos Ricardo Carvalho
Fotogaleria
Camélia ou Japoneira florida na Quinta das Brôlhas, Valdigem Ana Fonseca
Fotogaleria
Ácer dos elfos, “a árvore maravilhosa” da Quinta das Brôlhas Coroliano Carvalho
Fotogaleria
Fotogaleria
Crianças tocam no tronco delicado de uma árvore-de-júpiter ou lagerestroémia, Quinta da Pacheca, Cambres Susana Neves

Pôr a comunidade a valorizar as árvores que tem na região, levar as crianças a descobrir a origem das diferentes espécies, ensiná-las a respeitar e a agradecer o que a natureza nos dá são alguns dos objectivos da autora, Susana Neves. “Porque o Douro não é só vinha”, diz ao PÚBLICO. E acrescenta: “Temos de criar uma nova consciência, uma nova atitude relativamente à natureza e às árvores em particular. É um projecto que se deve expandir. É regional, mas é universal.”

Por proposta do Museu do Douro, duas turmas de crianças de dez e 11 anos fotografaram, no ano lectivo de 2010-2011, as árvores que cada uma escolheu em cinco locais nas proximidades de Peso da Régua: Alto de São Domingos (Armamar), Quinta da Pacheca (Cambres), Quinta das Brôlhas, Quinta das Leiras e Eirados (Valdigem). Uma selecção de lugares justificada pela diferenciação de espécies.

“Cada miúdo tinha direito a uma máquina fotográfica digital já baptizada com o nome de uma árvore da região”, conta a investigadora de etnobotânica. Cada criança passou então a ter como novo apelido a árvore correspondente à sua máquina. A aluna Patrícia Ferreira, por exemplo, acrescentou “Freixo” ao seu nome de família. É dela a frase que se segue imediatamente ao prefácio: “Quando fui fotografar [era] como se pertencesse à vida das árvores, senti uma emoção, como se estivesse mais perto de descobrir o que nos querem dizer, o que devemos fazer, como se não houvesse amanhã.” Também é a principal entusiasta em recuperar os contactos dos participantes nos passeios fotográficos, para que não faltem ao lançamento no Museu de Lamego. Porque a espera para verem o resultado durou dois anos, já que a exposição dos trabalhos que estava prevista inicialmente nunca aconteceu.

Não desistir
“Este é também um projecto de boa vontade. Quero mostrar-lhes que não se desiste das coisas, mesmo quando se atravessam momentos de crise e contenção. O Museu do Douro acompanhou-nos até um certo ponto, mas surgiram problemas orçamentais. Então, passámos a contar com o apoio da Direcção Regional de Cultura do Norte. Como o objectivo é dar continuidade a este trabalho, quanto mais agentes culturais estiverem envolvidos, melhor. Pode ser que agora mais alguns se juntem a nós”, diz a também fotógrafa.

Explicações sobre o título do livro-CD As Árvores Que Comiam Papel: “É uma posição irreverente face à maneira como se interpretam as árvores. Quis desviar a atitude antropocêntrica e utilitarista que habitualmente temos face aos nossos recursos. As árvores não estão aqui numa posição comum. Não é a partir delas que se faz papel. Não. Elas têm de ser vistas de maneira completamente diferente. Estimulei muito nos miúdos uma atitude de respeito. A natureza existe por si e para si. É cidadã e é livre. Nós temos de ser bastante gratos (é uma atitude muito índia, eu sei) para com a natureza. Não exaurir os nossos recursos.”

A iniciativa integrou “oficinas de construção e iconografia de herbários de diferentes proveniências (incluindo o Grand Herbier, de Lourdes Castro) e de confecção de tintas vegetais, a partir de frutos e legumes, como a romã e a couve rouxa”.

As Árvores Que Comiam Papel, com mais de 300 páginas, foi “concebido como uma espécie de diário de viagem colectivo, (…) inclui a memória dessas descobertas, citando diálogos, sonhos, algumas receitas, pesquisa botânica e poemas sobre árvores, uns originais outros de poetas portugueses, como António Ramos Rosa, Ruy Belo e José Gomes Ferreira”, lê-se no prefácio. Susana acrescentou ao diário “apontamentos sobre a origem etimológica dos locais fotografados e excertos de textos de vários autores que datam sobretudo dos séculos XVI e XIX, e permitem compreender a história das árvores durienses, sejam elas autóctones ou exóticas”.

Há ainda depoimentos de proprietários das quintas e de professores que acompanharam os miúdos, como Ana Gouveia e Jorge Filipe, que falam do projecto como “uma experiência transformadora”.

Susana Neves, autora também de Histórias Que Fugiram das Árvores — Um Arboretum Português (edição BytheBook, 2012), assume para si a expressão “uma mulher de árvores”, em vez de “uma mulher de armas”, e elege como sua favorita a paineira: “É irreverente, não dá fruto, dá sumaúma.”


Espécies fotografadas
Alto de São Domingos: castanheiros, pinheiros e medronheiros (associados à economia e cultura tradicionais), mimosas e eucalipto (árvores australianas).
Quinta da Pacheca (Cambres): choupo branco, olaias, ciprestes, plátanos, bambu, um ácer, um tulipeiro da Vírginia e carvalhos americanos.
Quinta das Brôlhas (Valdigem): camélias não topiadas (esculpidas), cujas flores caducas muito impressionaram as crianças, e a ameixoeira de origem asiática.
Quinta das Leiras e Eirados (Valdigem): figueiras, pereiras, laranjeiras, diospireiros, damasqueiros, cerejeiras, pessegueiros e oliveiras centenárias. E a “árvore maravilhosa”, Acer negundo Variegatum, uma espécie de origem norte-americana associada a um dos mais antigos instrumentos de sopro índios.

As Árvores Que Comiam Papel
Fotografia e etnobotânica com crianças do Douro*
Edição e Produção de Susana Neves (http://quando-o-rei-era-sabao.blogspot.pt/)
Design Inês Sena
Edição Lunar Horse
CD, 13,5€
Subsidiado pela Direcção Regional de Cultura do Norte
Lançamento no dia 23 de Março, no Museu de Lamego, às 16h


*Agrupamento de Escola João de Araújo Correia, EB2,3 Peso da Régua. Professoras: Ana Gouveia e Lídia Florisa dos Santos Coutinho.
*Agrupamento Vertical da Escola Monsenhor Jerónimo do Amaral, EB1. Andrães. Professores: Jorge Filipe e Teresa Carriço.
 
 

Sugerir correcção
Comentar