As elefantas velhas não se esquecem dos amigos... nem dos inimigos
Quando alguém não se esquece de nada, diz-se que tem memória de elefante. Pois esta expressão idiomática não anda longe da realidade, a crer nos resultados de um estudo realizado em elefantas africanas do Parque Nacional Amboseli, no Quénia. Por ano, cruzam-se com 25 grupos de elefantes, o que dá umas 175 fêmeas adultas. As elefantas velhas, as matriarcas que conduzem os grupos nesta espécie de elefantes que vive na África subsariana, conseguem distinguir imediatamente os amigos dos inimigos, diz hoje um estudo, feito ao longo de sete anos, publicado na revista "Science". Se assim não fosse, o resto da manada gastaria muitas energias a defender-se e não dedicaria tempo suficiente à reprodução.De facto, a matriarca funciona como uma espécie de guardiã dos conhecimentos adquiridos da manada de elefantes, concluiu o estudo: ouve os chamamentos de outros elefantes e, depois, assinala ao grupo quem é amigo e quem não o é e pode perseguir as crias ou iniciar disputas. Caso o chamamento seja de alguém pouco amigável, a manada, às ordens da matriarca, agrupa-se. Os autores do estudo, investigadores do Reino Unido e do Quénia, relacionaram ainda esse papel da matriarca - e a sua idade - com o sucesso reprodutivo das manadas.Tais conclusões têm implicações importantes na conservação dos elefantes africanos ("Loxodonta africana"), pois os animais mais velhos e maiores são os alvos preferidos dos caçadores furtivos. Matar estes animais pode, no entanto, enfraquecer a unidade da família durante anos e ter consequências graves na conservação dos elefantes africanos, uma espécie em risco de extinção (calcula-se que existam hoje entre 301 e 487 mil indivíduos).Os autores do trabalho - coordenados por Karen McComb, da Universidade de Sussex, em Brighton, no Reino Unido - basearam-se em dados recolhidos no âmbito do Projecto de Investigação de Elefantes de Amboseli. Usaram equipamentos de "hi-fi" para gravar os chamamentos das fêmeas e, mais tarde, voltaram a reproduzi-los em altifalantes colocados em cima de um jipe. Depois, ficaram a observar o comportamento dos animais: queriam verificar se se agrupavam uns à volta dos outros e se usavam a ponta da tromba para cheirar. Nas famílias de elefantes com fêmeas mais velhas, o olfacto era mais usado pelas avós do grupo para confirmar a identidade de quem emite os chamamentos. Nas famílias lideradas por fêmeas mais jovens isso não acontecia tanto.O elefante africano vive, geralmente, em grupos familiares de fêmeas e crias compostos por dez a 30 indivíduos. A fêmea mais velha, que conduz o grupo, tem uma muita influência sobre o comportamento da manada: se ela atacar um agressor, todos ficam a aguardar o desfecho; se ela fugir, todos fogem. Os machos têm tendência para viver sozinhos ou, temporariamente, em pequenos grupos. Neste caso, se forem atacados e tiverem de fugir, fazem-no sozinhos. Juntam-se às fêmeas quando alguma está com o cio, e então domina o macho mais forte. Para os cientistas, as famílias em que há matriarcas com 55 anos, ou mais, têm muitas probabilidades de se juntarem de forma defensiva em resposta a chamamentos de famílias que raramente encontram do que de famílias com quem costumam estar associadas. Em contraste, refere um comunicado de imprensa da entidade que edita a "Science", a Associação Americana para o Avanço das Ciências, as famílias onde a elefanta mais velha ronda apenas os 35 anos apresentam 1,4 vezes mais probabilidades de responder a estranhos do que as fêmeas mais velhas. A conclusão, frisam os cientistas, é que os conhecimentos sociais dos animais velhos são melhores, pois reconhecem mais facilmente os aliados. Em suma, sabem quem vem lá. No final, nos grupos conduzidos por paquidermes velhos nascem mais filhos, dizem no artigo os cientistas: "Superiores capacidades sociais podem resultar num maior sucesso reprodutivo per capita para as fêmeas dos grupos liderados por indivíduos mais velhos." O que não é de somenos, tendo em conta que a gravidez nesta espécie dura 22 meses."Pensamos que esta é a primeira ligação estatística entre conhecimento social e sucesso reprodutivo numa espécie. Os resultados sublinham o efeito que pode ter a caça em geral e a caça furtiva em particular de animais maduros nas populações de elefantes", remata Karen McComb.