Para um dia internacional da extinção
A extinção é um problema nosso, não só porque como espécie estamos a interferir directamente na taxa de extinção, mas também porque seremos directamente afectados por isso.
Ainda assim, reconheço em vários sectores da sociedade um real aumento do interesse e preocupação sobre esta temática. A nível internacional, destaco o esforço feito para atribuir um valor económico à biodiversidade e aos serviços que presta à humanidade, sendo possível fazer comparações de cenários de protecção, exploração, destruição e recuperação de vários ecossistemas, utilizando a mesma unidade – o dinheiro. Este processo revelou-se bastante eficaz para muitas decisões que temos de tomar, mas certamente não resolveu tudo no que à biodiversidade diz respeito.
O problema mais difícil, e que a abordagem da valoração económica da biodiversidade não irá certamente resolver, é o da extinção. A extinção é o fluxo de saída do reservatório que se chama biodiversidade. Este reservatório vive do balanço entre a evolução de novas espécies, o fluxo de entrada, denominado especiação na gíria científica, e a extinção. Acontece que actualmente estes dois fluxos estão muito desequilibrados e operam a escalas de tempo muito distintas. O resultado é que o reservatório está a esvaziar-se, ou seja, estamos a perder muito mais espécies do que as que vão surgindo. Ao contrário do orçamento do Estado – outro reservatório com entradas e saídas – em que existem opiniões opostas e discutíveis sobre se o caminho é cortar na despesa ou aumentar a receita, na gestão da biodiversidade não nos é conhecido o poder de criar novas espécies, pelo menos em grande escala, sendo certamente mais sensato cuidar o melhor possível das que por cá estão.
A extinção não será certamente um problema da vida na Terra, que já sofreu vários períodos de extinções em massa muito antes de a nossa espécie existir. É sim um problema nosso, não só porque como espécie estamos a interferir directamente na taxa de extinção, mas também porque seremos directamente afectados por isso. Aqui poderemos voltar aos serviços que alguns ecossistemas degradados e com espécies extintas podem deixar de nos prestar, e à atribuição de um valor em dinheiro, mas era bom que não fosse necessário. Era bom que conseguíssemos entender que a taxa de extinção actual é má só por si.
A meu ver não existe uma verdadeira consciência colectiva de que a extinção é para sempre. No fundo, há uma centelha de esperança de que “os cientistas”, mais cedo ou mais tarde, ressuscitam as espécies que extinguimos, pelo menos as mais giras ou mais úteis. Por agora, o tigre da Tasmânia já só existe num museu, embalsamado, num frasco, ou em peles para tapetes. O Solitário Jorge, a última tartaruga gigante das Galápagos proveniente da Ilha Pinta morreu o ano passado. Esta ainda tive a felicidade de ver viva, ou morta-viva, que foi o que senti.
Face ao exposto, e apesar das minhas reservas, talvez um dia da extinção não fosse inoportuno, se ainda existirem dias vagos. Talvez assim pudéssemos, uma vez por ano, ver anunciada alguma medida proactiva que visasse a tomada de consciência colectiva da irreversibilidade da extinção.
Biólogo, professor auxiliar na Universidade Lusófona em Lisboa