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Morreu Rita Levi-Montalcini, a grande dama da ciência italiana

Aos 103 anos, a Prémio Nobel da Medicina de 1986, co-descobridora do factor de crescimento NGF, morreu na sua casa em Roma

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"s meus únicos méritos foram empenho e optimismo”, dizia Levi-Montalcini DR

Infatigável, a cientista nascida em Turim a 22 de Abril de 1909 numa família judia sefardita (pai engenheiro, mãe pintora), foi nomeada em Agosto de 2001 senadora vitalícia pelo então Presidente da República italiana Carlo Ciampi, pelos seus “grandes méritos no campo científico e social”. Ela não parava. “Vou muito bem, física e moralmente, e nunca trabalhei com tanto entusiasmo como neste último período da minha vida”, garantia no seu 101º aniversário, meses depois de ter partido um fémur.

Membro das mais prestigiadas academias científicas internacionais, como a Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos ou a Royal Society no Reino Unido, Rita Levi-Montalcini foi a primeira mulher italiana galardoada com um Nobel científico e também a primeira a ser admitida na Academia Pontifícia de Ciências.

A investigação científica que lhe valeu o Nobel da Medicina de 1986, partilhado com o norte-americano Stanley Cohen, que com ela trabalhou na década de 1950 na Universidade Washington em St Louis (Missouri, EUA), foi a descoberta de uma proteína importante para o crescimento, manutenção e sobrevivência dos neurónios – um factor de crescimento. Na verdade, foi o primeiro de muitos outros factores de crescimento a ser descrito, e recebeu o nome de NGF (nerve growth factor).

Esta proteína evita ou pelo menos reduz a degeneração celular, e problemas na sua produção podem estar relacionados com várias doenças em que são afectadas as células nervosas, como Alzheimer, esclerose múltipla, demências e esquizofrenia. O factor de crescimento NGF pode também desempenhar papéis importantes nas doenças cardiovasculares.

“A minha inteligência? Um pouco acima de medíocre. Os meus únicos méritos foram empenho e optimismo”, disse Rita Levi-Montalcini, cujo leve sorriso era uma imagem registada. Foi a galardoada com o Nobel que mais tempo viveu, até agora.

Rita Levi-Montalcini, no entanto, teve de enfrentar a vontade do pai para se tornar cientista: não era uma coisa comum uma rapariga inscrever-se em Medicina na Universidade de Turim. Mas ela conseguiu e saiu de lá com o curso feito em 1936.

Pouco tempo depois, no entanto, teve de deixar Itália, por causa das leis raciais do ditador Mussolini, porque a sua família era judia. Foi para a Bélgica, e ainda voltou para Itália, mas não tinha condições para trabalhar, e arriscava a deportação para os campos da morte. Após a guerra, recebeu um convite para trabalhar nos EUA – onde fez a sua carreira científica. Só voltou a viver em Itália em 1977, depois de se reformar.

Esteve na origem da criação, em 2002, do Instituto Europeu de Investigação sobre o Cérebro (EBRI, na sigla em inglês), com sede em Roma; presidia a uma fundação com o seu nome, criada em 1992 e que tinha por objectivo financiar os estudos de mulheres africanas, na Etiópia, no Congo e na Somália.

No regresso a Itália e ao continente europeu, foi coberta de elogios, que ontem se repetiram em Roma. Muitos políticos recordam-na com palavras bonitas. Mario Monti, o primeiro-ministro cessante, fala de uma mulher carismática e tenaz, que lutou toda a vida para defender os valores em que acreditava. “Representou a consciência civil, a cultura e o espírito de investigação do nosso tempo. Soube juntar o rigor científico com o nível máximo de humanidade”, disse Gianni Alemanno, presidente da Câmara de Roma. 
 
 

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