Investigadores analisam resíduos das minas de urânio portuguesas

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A perigosidade destes terrenos devia ser incluída como informação no Plano Director Municipal das Câmaras PÚBLICO

Com o fim da exploração de urânio em Portugal, em 2001, ficaram desprotegidos os resíduos acumulados desde 1912, quando teve início a extracção e tratamento químico deste metal radioactivo.

Agora, uma equipa disciplinar do Instituto Tecnológico e Nuclear, do Instituto Geológico e Mineiro e do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge vai estudar os efeitos no ambiente e na saúde da acumulação destes milhões de toneladas de detritos radioactivos em escombreiras que ficarão ao abandono. O projecto Minurar, assim se chama, durará até 2005 e é pago pelo Ministério da Saúde.

A exploração de urânio em Portugal iniciou-se em 1912, na mina da Rosmaneira, não muito longe do Sabugal. O urânio era então visto como um resíduo da extracção do rádio. Primeiro explorado por empresas francesas, depois pela Companhia Portuguesa do Rádio, o rádio era o metal procurado, numa altura em que se falava dos benefícios que trazia para o diagnóstico e terapêutica médica. A primeira fábrica de sais de rádio, onde era feito o tratamento químico do metal, surge pouco depois, na aldeia do Barracão, junto à Guarda. Muito deste rádio tinha como destino Paris, onde Marie Curie inaugurara o famoso Instituto do Rádio.

Mais tarde, durante a II Grande Guerra, a ordem de interesse em relação ao rádio e ao urânio inverteu-se. Com a descoberta dos usos militares do urânio, foi o rádio, juntamente com outras substâncias radioactivas originadas pela purificação do urânio, que passou a ser encarado como um resíduo e passou a engrossar as escombreiras perto de minas e fábricas espalhadas pelos distritos de Coimbra, Viseu e Guarda. "Estes metais, altamente radioactivos, eram abandonados porque ainda não havia noção do que era a protecção radiológica", explica Fernando Carvalho, director do Departamento de Protecção Radiológica e Segurança Nuclear do Instituto Tecnológico e Nuclear.

O aparecimento de grandes explorações no Canadá, França e China, entre outras, fizeram com que a exploração do urânio em Portugal, então uma das mais abundantes a nível mundial, não conseguisse fazer face ao aumento da oferta.

Com o fim da exploração de urânio em Portugal, em 2001 - a última mina a encerrar foi a da Urgeiriça, perto de Canas de Senhorim - surge o problema do que fazer para garantir a segurança dos terrenos das minas, das escombreiras e terras circundantes. O Governo solicitou a ajuda das instituições agora reunidas no projecto Minurar para estudar os efeitos provocados pelos resíduos radioactivos enterrados nas escombreiras.

"Os terrenos, propriedade então da Empresa Nacional de Urânio, encerram, nas escombreiras, os resíduos de rádio, bismuto, polónio e chumbo radioactivo, entre outros elementos. Além disso, o rádio liberta para a atmosfera um gás, o radão, que é altamente perigoso", explica Fernando Carvalho.

A empresa Exmin, criada então pelo Ministério da Economia para tratar dos problemas das minas, assegurou a colocação de placas amarelas com avisos nos terrenos das minas e escombreiras. Mas tal não será suficiente para garantir que o terreno, mais cedo ou mais tarde, não seja vendido para construção ou usado para o cultivo, sem se saber se a segurança radiológica das pessoas está ou não ameaçada: "Deixa de haver quem faça a vigilância e manutenção dos terrenos. O isolamento tem de ser garantido", alerta Fernando Carvalho.

A perigosidade destes terrenos devia ser incluída como informação no Plano Director Municipal das Câmaras, defende o investigador. Os ministérios da Economia e do Ambiente deveriam também desenvolver um programa financiado pela União Europeia para garantir a segurança destes locais.

Até 2005, a equipa fará prospecção da contaminação dos solos, atmosfera e águas e inquéritos e análises de sangue e do cabelo (onde metais e elementos radioactivos se fixam facilmente) das populações expostas em Canas de Senhorim, Moreira de Rei, Rio de Mel, perto de Trancoso, e Satão, perto de Viseu. Depois fará as mesmas medições a populações de controlo em Seia, Queira, Vouzela, Celorico da Beira e Campo, perto de Viseu, regiões graníticas, onde surgem estes minérios, mas que não estiveram expostas aos resíduos.

O trabalho, iniciado em Maio, ainda não reuniu dados suficientes para apurar conclusões, diz Fernando Carvalho: "Temos ainda só uma parte dos resultados, mas tudo indica que os materiais são muito radioactivos e que os terrenos das escombreiras têm de estar encerrados. Quanto ao impacte na saúde, temos de esperar pelos resultados das análises."

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