Descobertas 120 espécies novas para as ilhas Berlengas
Estibaliz Berecibar chegou a mergulhar duas vezes por dia nos mares das Berlengas, arquipélago de ilhas e rochedos com encostas escarpadas, a dez quilómetros de Peniche. Esta bióloga, especializada em algas marinhas, foi um dos 29 cientistas-mergulhadores que participaram na expedição às Berlengas, de 18 a 30 de Setembro, a bordo do Creoula. O navio fez-se ao mar para se conhecerem as espécies marinhas destas ilhas, no âmbito do projecto Marbis, criado em 2007 para ajudar a identificar as zonas do mar off-shore português que devem ser protegidas na extensão da Rede Natura 2000 ao oceano.
"Vi imensas coisas", conta Estibaliz Berecibar, poucos dias depois de ter regressado e já nos laboratórios da Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC), em Paço de Arcos. Recorda especialmente um mergulho: "Estava perto de uma parede com 25 metros de altura, cheia de corais cor-de-rosa e lilás. Espectacular!" Contudo, acrescenta, estava à espera de encontrar mais ouriços e estrelas-do-mar: "Mas, como apanhámos mau tempo, com correntes fortes e muitas ondas, os pequenos animais esconderam-se debaixo de pedras e em fendas nas rochas."
Em metade dos 11 dias de mergulhos, o estado do mar não facilitou a vida aos cientistas. "Havia momentos em que éramos empurrados de um lado e para o outro e não conseguíamos ficar parados a observar o fundo do mar."
Ainda assim, em 64 mergulhos - num total de 195 horas debaixo de água, até aos 35 metros de profundidade - foram feitos 10.000 registos de organismos nas Berlengas, 120 dos quais são espécies que não se sabia existirem naquela região marinha. Pensa-se que algumas serão novas para a ciência. A maioria dos 10.000 registos são briozoários, organismos invertebrados parecidos com plantas e que formam colónias de animais, onde cada um tem uma função específica e depende dos outros.
"Há uma diversidade muito grande, a riqueza é enorme", diz Frederico Dias, da EMEPC e responsável pelo projecto Marbis. "Se estivéssemos lá mais duas semanas, provavelmente teríamos encontrado outras 100 espécies novas para as Berlengas."
A expedição contou, ao todo, com 69 cientistas de 24 instituições, incluindo seis estrangeiras. "Enquanto uns investigadores mergulhavam para recolher amostras biológicas, daquilo que fosse novo ou diferente, outros registavam o que viam, em fotografias ou vídeos", explica Frederico Dias. Outros ainda ficavam no convés do Creoula, a fazer uma primeira análise e triagem do que era trazido do fundo do mar.
"A bordo do navio vimos as espécies a olho nu, em tabuleiros. Agora estamos a abrir os frascos com as amostras e a olhar para elas à lupa", explica Estibaliz Berecibar.
Nos armazéns de Paço de Arcos estão 5000 amostras trazidas das Berlengas. "A maioria está em frasquinhos, umas com álcool, outras com uma mistura especial para preservar a estrutura das células. Já as algas, foram desidratadas e colocadas em herbários", conta Frederico Dias.
Primeiro serão estudadas as algas. "Uma amostra pode ter mais do que uma espécie", explica Estibaliz Berecibar. "Por exemplo, uma alga pode ter dez espécies em cima, bichos pequenos a morar nela." Por isso, os 10.000 registos podem aumentar facilmente. O número de algas identificadas nas Berlengas pode chegar às 300 espécies.
Segundo a bióloga, o arquipélago pode mesmo ser um hotspot para espécies de águas mais mornas a estas latitudes. "Mas ainda não conhecemos a razão para termos encontrado nas Berlengas espécies de águas mais quentes, do Mediterrâneo e da região da Macaronésia. Como é que essas espécies lá chegaram? Ainda há muito para estudar", diz Estibaliz Berecibar.
Ainda assim, esta campanha permitiu conhecer melhor as Berlengas. Para já, pode dizer-se que os 10.000 novos registos vão juntar-se aos já 30.000 da base de dados do Marbis, que incluem as expedições às ilhas Selvagens em 2010 e, em 2011, às Desertas, Porto Santo, Formigas e Santa Maria.