Apresentados resultados finais (ou quase) da avaliação da FCT aos centros de investigação
Ainda estão a ser analisadas, por um novo painel de peritos constituído para o efeito, 53 “reclamações científicas”. Os resultados mesmo finais deverão ser conhecidos em Novembro.
Este processo de avaliação, que suscitou – e ainda suscita – muitas críticas por parte da comunidade científica, estava estruturado em duas fases.Logo na primeira fase, 154 (cerca de 48%) dos 322 centros que se candidataram à avaliação tiveram uma nota insuficiente para passarem à segunda fase – que era aquela que daria acesso à maior parte do dinheiro para despesas de investigação –, ficando portanto com a vida, no mínimo, dificultada. Apenas 52% dos centros deverão assim dispor de verbas que lhes permitam não só continuar a funcionar, mas também a desenvolver os seus projectos de investigação, durante os próximos cinco anos.
No balanço agora tornado público e apresentado em Lisboa por Nicolas Walter, responsável científico da ESF, dos 154 centros “chumbados” na primeira fase, 32 tiveram nota Insuficiente, 33 nota Razoável e 89 nota Bom. Só os que tiveram Bom terão direito a algum financiamento. Pelo seu lado, entre os 168 centros que passaram à segunda fase – e que vão partilhar a maior fatia das verbas disponíveis –, 97 tiveram nota Muito Bom, 60 nota Excelente e 11 nota Excepcional.
Quanto ao montante total do financiamento anual orçamentado para 2015-2020, era inicialmente de 71 milhões de euros. Mas passou entretanto para 77 milhões de euros com o acrescento de um “fundo de reestruturação estratégica” destinado a permitir a alguns centros reorganizarem-se. Como explica a FCT num resumo dos resultados da avaliação disponível no seu site, 42% dos centros com nota Bom (ou seja, que “chumbaram” na primeira fase) deverão beneficiar de uma parte dessas verbas adicionais.
Mas mesmo assim, o montante global destinado aos 89 centros que tiveram Bom será de apenas 3,8 milhões de euros por ano, o que corresponde em média a uns 40.000 euros anuais por centro.
Os 97 centros que tiveram Muito Bom recebem 22,05 milhões de euros por ano (em média, 230.000 euros); os 60 que tiveram Excelente têm direito a 37,78 milhões de euros por ano (em média, 630.000 euros); e os 11 centros com nota Excepcional vão dispor de 13,53 milhões de euros anuais (em média, 1,23 milhões de euros).
Chumbados a priori
Para as vozes críticas, o que está em causa na avaliação da FCT não é o apenas o facto de tantos centros terem sido desqualificados, pondo em causa o futuro do sistema científico nacional. A acusação é mais grave: a FCT terá condenado a priori, deliberadamente, metade do sistema científico português ao desaparecimento. Isto porque, no contrato entre a FCT e ESF, descobriu-se que tinham sido definidas quotas à partida, que iriam necessariamente fazer com que só uns 50% dos centros conseguissem passar à segunda fase.
Esta terça-feira, perante cerca de duas dezenas de cientistas, de responsáveis da FCT e da secretária de Estado da Ciência, Leonor Parreira – e na ausência quase total de jornalistas (o convite para a reunião chegou à redacção do PÚBLICO na véspera, uns minutos antes das 20h) –, Nicolas Walter fez, ao longo de mais de uma hora e meia, uma revisitação aprofundada do processo de avaliação, dos diversos problemas que tinham surgido e das lições a tirar. Aliás, como fez notar ironicamente alguém na assistência no fim da “palestra”, ela durou mais de metade do tempo atribuído, durante a segunda fase da avaliação, às visitas dos avaliadores a cada centro de investigação.
Em particular, Nicolas Walter tentou desmontar a questão das quotas estipuladas no contrato: “Escrevi isso no contrato, a culpa foi minha”, declarou com ar arrependido. “Só pedimos à FCT uma estimativa [da taxa previsível de sucesso], baseada na avaliação de 2007. Eu deveria ter especificado que se tratava de uma estimativa”, acrescentou.
“Os recursos necessários foram calculados com base nesses 50%”, rematou Martin Hynes, responsável máximo pela avaliação do lado da ESF, também presente na reunião. “Se 70% dos centros tivessem passado para a segunda fase, isso teria sido um verdadeiro problema, porque teríamos tido de renegociar com a FCT os recursos externos.” Uma declaração que, talvez ao contrário do pretendido, não parece deixar lugar para dúvidas: o chumbo de metade dos centros de investigação era preferível ao incómodo de uma renegociação do contrato com a FCT.
No fim da apresentação, a investigadora Ana Cristina Santos, do Centro de Estudos Sociais de Coimbra, perguntou aos elementos da ESF: “Como é que avaliam o impacto da [vossa] avaliação na ciência deste país? O exercício teve consequências, teve impactos muito directos nas pessoas, nos nossos colegas, em nós próprios; levou a que áreas inteiras do conhecimento fossem apagadas. A quem cabe a responsabilidade final deste exercício?”
Mais uma vez, a posição de Martin Hynes foi clara: “Nós fornecemos uma opinião especializada, mas em última análise a responsabilidade das decisões tomadas é da FCT.”
Ao encerrar a sessão, a actual presidente da FCT, Maria Arménia Carrondo, aproveitou para lembrar que só entrou em funções (em substituição de Miguel Seabra, que se demitiu em Abril) já no fim da avaliação – não tendo, por isso, tido grande envolvimento na maior parte do processo.
Apesar de terem sido apresentados como finais, estes resultados poderão ainda sofrer alterações. Pode ler-se ainda, no resumo da FCT acima referido, que estão neste momento a ser analisados 53 pedidos de reclamação (28 dos quais provenientes de centros com nota Bom) relativos a questões de natureza científica, tais como erros na avaliação. Os pedidos foram submetidos a um “novo painel de reclamação”, composto por peritos internacionais. E os resultados, segundo uma porta-voz da FCT contactada pelo PÚBLICO, deverão ser conhecidos em Novembro.