Algarve: Ordem dos Médicos cria comissão de peritos para avaliar alegada negligência
Ministério da Saúde pediu avaliação pericial e Ministério Público já abriu um inquérito. Na sexta-feira a Ordem dos Médicos tem uma reunião com os responsáveis do hospital.
A Ordem dos Médicos vai criar uma comissão de peritos para avaliar os alegados casos de erro e negligência no serviço de cirurgia geral do Hospital de Faro denunciados por uma médica interna. O Ministério Público já abriu um inquérito e na próxima sexta-feira a Secção Regional do Sul da Ordem dos Médicos tem uma reunião com os responsáveis do hospital.
O caso tornou-se público depois de a médica interna de cirurgia geral ter revelado nas suas redes sociais que tinha apresentado uma queixa junto da directoria Sul da Polícia Judiciária contra o ex-orientador de formação e o director do serviço, neste último caso por conivência, alegando que sabia das situações e que não agiu.
"Relatei onze casos ocorridos entre Janeiro e Março deste ano daquilo que considero erro/negligência e que estão neste momento a ser investigados pelo MP. Dos onze doentes: três morreram, dois estão internados nos cuidados intermédios, os restantes tiveram lesão corporal associada a erro médico, que variam desde a castração acidental, perda de rins ou necessidade de colostomia para o resto da vida", contou a médica na rede social em que tomou pública a denúncia de alegados erros.
O bastonário da Ordem dos Médicos, que esta tarde realiza uma conferência de imprensa para falar sobre a situação, disse ao PÚBLICO que a queixa foi recebida na última quarta-feira e que de imediato foram tomadas diligências. “Desencadeámos logo tudo o que estava ao nosso alcance. Primeiro comunicámos ao conselho disciplinar [da secção Sul da Ordem dos Médicos], ao Ministério Público, à Inspecção-Geral das Actividades em Saúde, ao ministério da Saúde, à Administração Regional de Saúde do Algarve e à Entidade Reguladora da Saúde”, explicou, referindo que durante o fim-de-semana falou com a médica que fez a denúncia “para perceber o que estava a acontecer”.
Através do conselho regional do Sul, haverá uma reunião no hospital esta sexta-feira. “Vai ser uma primeira abordagem junto dos responsáveis clínico e do serviço e para falar com médicos do serviço. Esta é uma matéria sensível e queremos ter a certeza do que está a acontecer. Se houver má prática, a Ordem tem órgãos próprios para tomar decisões”, afirmou o bastonário Carlos Cortes, referindo que colocaram “toda a urgência possível sobre o tema”.
Esta terça-feira de manhã, o bastonário reuniu-se com o ministro da Saúde e, embora este não fosse o motivo do encontro, a situação do Hospital de Faro foi abordada. “Ficou acertada a constituição de uma comissão de peritos da Ordem dos Médicos para avaliar a situação”, explicou Carlos Cortes, acrescentando que a Ordem terá uma reunião esta tarde na qual deverá decidir quem são os peritos que vão fazer parte desta comissão.
“Esta avaliação tem de ser cuidada. São acusações graves que podem ter um impacto grande e que têm de ser analisadas à luz da leges artis [boas práticas médicas] e das normas”, concluiu.
Também Diogo Pais, presidente do conselho disciplinar do Sul, disse ao PÚBLICO que a informação que chegou “vai seguir os trâmites normais no conselho regional do Sul e no conselho disciplinar” e que “o assunto está a ser tratado”.
Inquérito aberto
Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério da Saúde adiantou que “não recebeu nenhuma denúncia de alegadas más práticas no Centro Hospitalar Universitário de Faro (CHUA)”. “Perante as informações veiculadas na comunicação social, o Ministro da Saúde definiu como orientação ao Conselho de Administração do CHUA a solicitação à Ordem dos Médicos da realização de uma avaliação pericial sobre a qualidade do serviço de cirurgia do Hospital de Faro”, acrescentou.
O ministério afirmou ainda que “está firmemente comprometido com a melhoria da satisfação, motivação e liderança técnica dos profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) que, pela natureza da profissão, exercem a suas funções em condições de grande exigência”. “Simultaneamente, é preocupação permanente da tutela fomentar a humanização, qualidade e inovação dos cuidados de saúde que o SNS presta a todos os utentes.”
Ao PÚBLICO, a Procuradoria-Geral da República confirmou “a instauração de inquérito relacionado com a matéria em referência” e que “o mesmo corre termos no DIAP [Departamento de Investigação e Acção Penal] de Faro”.
Também a a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) e a Inspecção Geral das Actividades em Saúde (IGAS) após terem tido conhecimento dos factos supracitados "decidiram, no quadro das suas competências, abrir respectivamente um processo de investigação e um processo de inquérito que permita o cabal esclarecimento destas acusações", esclarecem as duas entidades em resposta escrita enviada ao PÚBLICO.
"A ERS e o IGAS decidiram cooperar de modo a obter todos os esclarecimentos necessários de forma complementar", dão também nota. com Daniela Carmo
Esta notícia foi actualizada às 18h05 do dia 11 de Abril de 2023 com a resposta da ERS e da IGAS.