Em prova: Brancos com madeira, harmonizações fantásticas

O potencial para grandes brancos é, cada vez mais, uma assinatura da região dos Vinhos Verdes. Quando a passagem por barrica entra na equação, mais se intensifica a sua aptidão gastronómica.

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Há já muitos anos que acho que a região dos Vinhos Verdes é aquela com maior potencial para fazer grandes vinhos brancos. Os solos e o clima associados a castas únicas no mundo têm todo o potencial para que assim seja. Conforme os anos vão passando e os vinhos evoluem, com vinhas cada vez melhores e enologia moderna e actual, mais me convenço de que assim é, ao provar dezenas e dezenas de Vinhos Verdes que me enchem o palato, que me invadem o nariz com aromas fantásticos e tão diversos.

As principais castas brancas – alvarinho, loureiro, avesso, azal e arinto – dão resultados fantásticos, com vinhos cada vez mais conhecidos e apreciados. A que se juntam algumas outras castas mais raras, mas que têm vindo a surpreender mesmo alguns produtores.

A jovem vaga de viticultores e enólogos tem sido fundamental na pesquisa e experimentação, com belíssimos resultados. Mas já há alguns anos que muitos produtores e enólogos optaram também por estagiar vinhos brancos em madeira, ou mesmo fermentá-los em barrica, com resultados muitas vezes surpreendentes. Com adegas muito bem equipadas, para onde são encaminhadas uvas de qualidade cada vez melhor, a partir duma viticultura moderna – mas apoiada no conhecimento da grande tradição da região, que tem passado de geração em geração –, atingem-se hoje patamares de qualidade ao nível de qualquer outra região.

Não é por acaso que as vendas dos Vinhos Verdes, quer no mercado nacional, quer na exportação, têm vindo a subir de ano para ano, mesmo durante a pandemia. Abrindo novos mercados a cada ano que passa e sedimentando os já tradicionais – com Brasil e Estados Unidos à cabeça. Muito também pela dinâmica de muitos e muitos produtores, com visitas e participação em feiras e outros eventos, acompanhamento de clientes e visitas a mercados específicos, com o apoio da Comissão de Viticultura da Região.

A partir de vinhos-base com grande frescura e acidez, bastante fáceis de produzir na região, parte-se também para a elaboração de cada vez melhores espumantes, outro dos produtos de enorme sucesso da região. E não esqueçamos a grande tradição na produção de aguardentes vínicas e bagaceiras que, quando envelhecidas com tempo, muito tempo, em barricas velhas de madeira, atingem patamares fantásticos de qualidade.

Os brancos com madeira e a mesa

Ainda existe uma conotação negativa em relação aos Vinhos Verdes, quase como um carimbo de falta de qualidade. O que, além de injusto, é completamente falso. Gosto de fazer provas cegas com amigos e colegas, e, quando se trata de Vinhos Verdes, o gozo é ainda maior, pois a cada revelação as surpresas são imensas. As coisas estão a mudar e a evoluir, e graças a algumas destas castas, com alvarinho e loureiro à cabeça, cada vez mais consumidores têm sido atraídos e conquistados para o consumo de Vinhos Verdes. Então à mesa, estes são companhia acertada, até excelente, para uma cada vez maior variedade de pratos, entre cozinha tradicional e cozinha moderna.

Os Verdes com madeira, então, fazem harmonizações fantásticas, quer a acompanhar peixe fresco e mariscos simples ou cozinhados, como arroz ou açorda de marisco, quer como companhia tradicional de tantas e tantas receitas de bacalhau. Mas também como companhia de certas carnes conseguem ligações deliciosas. Por exemplo a tradição de bebê-los com fumeiro, umas azeitonas e broa de milho é algo que vem de trás e se vai perpetuar, tal a perfeição da companhia. Um alvarinho ou um avesso fermentados em barricas novas, a acompanhar cabrito ou anho assados no forno, é já bastante comum e só quem ainda não experimentou poderá achar estranho.

Os Vinhos Verdes, sobretudo estes trabalhados na madeira, são também óptima companhia para pratos de cozinha indiana ou tailandesa. E mesmo para pratos mais condimentados ou picantes, da variada cozinha mexicana ou brasileira, lá estão tantas soluções neste tipo de Vinhos Verdes. E o que dizer da comida japonesa, com sushi e sashimi à cabeça? Um avesso ou um azal, com alguns meses de estágio em madeira, poderão surpreender muitos apreciadores.

Para sobremesas doces, como a doçaria de ovos minhota, principalmente, que tal uma aguardente velha de Vinho Verde, com longo estágio em madeira, das melhores que se produzem por cá? Levemente refrescadas, dão maridagens a roçar a perfeição.

Até na noite de Natal, com o bacalhau e o polvo, batata com a pele, cenoura, couve troncha, grelos e ovos, tudo cozido, muito alho, azeite farto e toque de vinagre, são escolha acertada alguns destes Verdes de eleição. À vossa saúde!


Este artigo foi publicado no n.º 7 da revista Singular.

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