Catapulta: uma mostra de cinema para devolver “o lugar de fala” à comunidade LGBTQIA+

É a mais recente mostra de cinema queer da capital e quer pôr a comunidade a pensar sobre si própria. A programação estende-se por dois dias, 30 de Junho e 1 de Julho.

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Frame de Indianara em exibição no dia 1 de Julho DR
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Chama-se Catapulta e é a mais recente mostra de cinema LGBTQIA+ da capital. Ao longo de dois dias, 30 de Junho e 1 de Julho, vão ver-se e ouvir-se as perspectivas da comunidade sobre si própria, no cinema Fernando Lopes, dentro do campus da Universidade Lusófona.

É uma iniciativa da plataforma Queer Art Lab, de apoio, capacitação e empoderamento de artistas LGBTQIA+, criada em 2021 e que faz parte da empresa Trumps – sim, o mítico bar da noite lisboeta.

Esta mostra nasceu da “necessidade de representação de pessoas queer no cinema” porque “grande parte destas histórias é contada por pessoas cis, por pessoas que não pertencem à comunidade, então acabam por ser olhares externos sobre estas histórias” e fomenta a alteridade, justifica ao P3 Ary Zara, realizador e activista trans responsável pela curadoria da mostra.

Aqui, são as pessoas queer que tomam as rédeas das próprias histórias, a partir da “experiência” e não da “observação”, sem “perpetuar estereótipos”. “Nós olhamos para algumas coisas que estão feitas e, com base nesses filmes, desenvolvemos conversas, pensamos de que forma é que o cinema pode ser uma catapulta para a nossa vivência e [para a] criação de novas possibilidades e narrativas”, resume o cineasta.

Para o primeiro dia, 30 de Junho, está agendada a exibição do filme The Alexander Ball de Jessica Magro, que celebra a cultura de ballroom na Austrália. Segue-se uma conversa focada na história e origens do ballroom em Portugal.

No sábado, 1 de Julho, serão exibidos três filmes, duas longas-metragens e uma curta. A tarde começa com Before you know it, de PJ Raval, que acompanha pessoas LGBTQIA+ idosas nos Estados Unidos, e Chá da Meia Noite, da ex-jornalista do PÚBLICO Sibila Lind, que conta a história de Jó Bernardo, figura seminal dos direitos trans em Portugal, na primeira pessoa. Segue-se uma conversa sobre envelhecimento, que vai incidir em temas como “envelhecer sendo pan, não-binário, pessoa que vive com HIV”, de acordo com o comunicado de imprensa.

O dia termina com a exibição de Indianara, de Aude Chevalier-Beaumel e Marcelo Barbosa, documentário que acompanha Indianara e Alves Siqueira, activista trans no Brasil. Segue-se um debate sobre pessoas trans migrantes em Portugal.

Os bilhetes custam 3 euros por sessão ou 5 euros pelo passe para toda a programação.

O holofote nas diferentes experiências

Ao contrário do que já acontece com alguns festivais de cinema queer em Lisboa, o objectivo aqui não é a competição, mas sim “fazer a comunidade pensar sobre aquilo que quer que seja criado sobre si e quais são os assuntos importantes e como eles devem ser trazidos para o cinema”, sintetiza Ary Zara.

E como criar uma mostra de cinema do zero nem sempre é fácil, esta também teve os seus desafios. O primeiro foi o espaço: “Conseguimos um espaço dentro da Universidade Lusófona porque estudei lá e sei que a universidade tem muito interesse nos projectos de alunos formados lá”, afirma o curador.

A preocupação com a interseccionalidade também esteve presente no momento da curadoria: “Para saber que filmes devíamos trazer para a comunidade contactei Lu Loução, pessoa não-binária, racializada, que também trabalha no cinema, para me ajudar a pensar e [para] termos diferentes experiências.”

No meio da programação, Ary Zara não esconde que é difícil escolher um destaque. Opta por referir dois filmes: o primeiro, Indianara é “um filme muito forte, especialmente quando visto por pessoas trans migrantes em Portugal”, que “cria a sensação de que as pessoas estão aqui porque tiveram de sair do Brasil, mas sentem que fazem parte de uma luta que já não conseguem mais carregar”.

O outro destaque vai para Chá da Meia-Noite, de Sibila Lind, porque “tem Jó Bernardo, que é um ícone, uma figura da luta trans em Portugal”, alguém que “lá atrás trazia as questões que estamos a debater agora”.

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