Catástrofe no Iémen agrava-se enquanto ACNUR teme ficar sem fundos para ajudar o país
ACNUR diz que está a atingir “ponto de ruptura” financeira para ajudar o Iémen, onde 80% da população depende de assistência humanitária. Pandemia de covid-19 veio agravar as condições sanitárias de um país destroçado por uma guerra sangrenta que dura desde 2015.
Depois de as Nações Unidas já terem chamado a atenção para o colapso do sistema de saúde do Iémen, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) alertou esta terça-feira que a organização está a atingir um ponto de ruptura financeira e que milhões de iemenitas correm o risco de ficar sem qualquer ajuda, num país devastado por uma longa guerra civil e, agora, pela propagação da covid-19.
“Estamos a atingir um potencial ponto de ruptura nos nossos programas. Se não recebermos financiamento muito em breve, muitos dos nossos programas, particularmente os de assistência financeira para os iemenitas deslocados internamente, podem parar”, avisou Charlie Yaxley, porta-voz do ACNUR, numa conferência de imprensa virtual.
Mesmo antes de a covid-19 ter chegado ao país, o Iémen já estava no limite. Cerca de 80% da população - cerca de 24 milhões de pessoas - depende de ajuda humanitária e milhares de pessoas, incluindo crianças, passam fome. Além disso, o país enfrenta surtos de várias doenças, como cólera e difteria.
Na origem desta catástrofe humanitária está uma sangrenta guerra que dura desde 2015 e que opõe os rebeldes Houthi, apoiados pelo Irão, e uma coligação internacional liderada pela Arábia Saudita, numa autêntica guerra por procuração entre Teerão e Riade que já causou milhares de mortos e milhões de deslocados, destruindo as estruturas médicas e sanitárias do país.
Perante o agravar da situação humanitária no Iémen, muitas famílias começaram a recorrer a todos os meios possíveis para sobreviver. De acordo com o ACNUR, nos últimos meses aumentou o número de pessoas a mendigar no país, com muitas famílias a recorreram ao trabalho infantil e a casamentos forçados de crianças para tentar arranjar dinheiro para sobreviver.
O ACNUR presta auxílio a mais um milhão de deslocados internos, que dependem da ajuda da organização para conseguir abrigo e dinheiro para comida e medicamentos. No entanto, este ano, o ACNUR apenas recebeu 15% dos mais 3.3 mil milhões de dólares anuais destinados ao Iémen.
No próximo dia 2 de Junho está prevista uma conferência organizada pela Arábia Saudita e pela ONU para angariar fundos para o Iémen. No entanto, têm surgido vozes críticas do papel de Riade na reunião, devido às acusações de possíveis crimes de guerra cometidos pela Arábia Saudita.
Covid-19 agravou catástrofe humanitária
Várias organizações humanitárias que desenvolvem missões no Iémen acreditam que o coronavírus já está disseminado no país. Segundo os dados da Universidade Johns Hopkins, o Iémen regista apenas 233 casos de covid-19 e 44 mortos. No entanto, devido ao insignificante número de testes realizados e ao colapso das estruturas médicas do país, teme-se que o número real seja muito maior e que seja impossível de controlar.
Os Médicos Sem Fronteiras (MSF), que apoiam 17 hospitais no Iémen, incluindo dois centros destinados ao tratamento da covid-19, em Sanaa e em Aden, alertam que os hospitais estão completamento cheios e muitos doentes não conseguem receber tratamento.
“A situação em Aden é má, por falta de outras palavras. Já não temos camas”, afirmou Claire Ha-Duong, responsável dos MSF pela missão no país, à CBS News. “O problema é que nos hospitais privados, os doentes [com covid-19] são recusados e existe pouca capacidade de outros hospitais receberem mais doentes”, acrescentou.
“A situação humanitária no Iémen pode ficar fora de controlo à medida que a covid-19 ameaça uma população já enfraquecida por vários anos de conflito”, alertou Elizabeth Byrs, porta-voz do Programa Alimentar Mundial.