Juízes poderão ver salários aumentados no máximo em 500 euros brutos por mês
Se proposta do PS avançar, magistrados do Supremo vão ficar a ganhar 6630 euros brutos. Medida deve ser aprovada com votos do PS, PCP e CDS.
Se o fim do tecto máximo que impede os juízes de ganharem mais do que o primeiro-ministro for aprovado pelo Parlamento, os magistrados vão ver os seus salários aumentados num máximo de cerca de 500 euros brutos por mês. Os juízes que mais beneficiarão com a medida, se ela for aprovada, serão os conselheiros, que estão no topo da carreira, que passarão a receber 6630 euros brutos, contra os 6130 que auferem actualmente.
Os juízes dos cinco tribunais da Relação e dos dois tribunais centrais administrativos deverão ver subir o salário bruto em 340 euros, passando de 5780 para 6120 euros. Neste momento, os juízes estagiários recebem 2530 euros, um valor que, na primeira instância, pode chegar a 5600 euros. Os valores líquidos são substancialmente inferiores, já que alguns magistrados chegam a reter na fonte 37% do salário, além dos descontos para o sistema de pensões.
As contas são do PÚBLICO e foram feitas com base na diferença das remunerações brutas que os juízes recebem actualmente, dados disponibilizados pelo Conselho Superior da Magistratura, e o valor do índice que serve de referência aos salários dos magistrados judiciais, indicado pelo presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP).
Os 35.700 euros do salário anual mínimo dos juízes fica abaixo da média dos países europeus, segundo dados de um relatório publicado o ano passado pela Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça, uma estrutura inserida no Conselho da Europa, que indica os 50.530 euros como o valor médio de mais de 40 países. Nos tribunais superiores, onde o tecto sobe para os 85.820 euros anuais, o valor também fica abaixo da média europeia, mas mais próxima da mesma (96.100 euros). Em termos relativos, no entanto, o peso da remuneração dos juízes no topo da carreira fica 5,34 pontos acima do salário bruto anual médio, o que é mais do que o que acontece em média nos países europeus (4,53 pontos).
Tudo indica que as propostas do PS vão ser aprovadas no Parlamento, já que na ronda que o PÚBLICO fez aos vários grupos parlamentares só o Bloco de Esquerda apresentou reservas a que se acabe com o tecto que impede aos juízes receberem mais do que o primeiro-ministro. O PSD não se compromete para já com uma posição, apesar de esta quarta-feira o seu líder ter acusado o Governo de estar a promover desigualdades no descongelamento de carreiras na função pública para tentar “contentar todos por causa das eleições”. Rio falava aos jornalistas à margem da apresentação de um livro.
Questionado pelos jornalistas sobre o projecto de lei do PS que propõe que os magistrados ganhem mais do que o primeiro-ministro, noticiado pelo PÚBLICO, Rui Rio disse ter defendido sempre que o salário do Presidente da República e do chefe de Governo deve ser o limite máximo e que ninguém deve ganhar mais. “O Governo está a descongelar as carreiras especiais da função pública, o Governo está à deriva, não é igual para todos. O Governo quer contentar todos por causa das eleições”, disse, assumindo que este comportamento “é mau” e que “jamais faria isso”.
O presidente da ASJP, Manuel Ramos Soares, ficou surpreendido com a posição de Rio, sublinhando que quando foi ouvido pelo grupo parlamentar do PSD e quando falou com deputados sociais-democratas estes sempre se mostraram disponíveis para viabilizar um eventual acordo entre os juízes e o Governo.
Ao PÚBLICO, o deputado social-democrata Carlos Peixoto, realçou que o PSD já tinha pedido acesso aos termos do acordo entre o Governo e a ASJP e que só esta terça-feira ao fim da tarde, com a apresentação da proposta do PS na Assembleia da República, foi possível perceber exactamente qual era o seu conteúdo. “Ainda não temos uma posição definida. Vamos discutir a questão internamente, com a direcção política do partido e do grupo parlamentar”, afirmou.
O deputado bloquista, José Manuel Pureza, explica porque não concorda com a proposta do PS. “Temos sempre defendido que o salário do primeiro-ministro deve ser o limite máximo na Administração Pública”, justifica Pureza. O bloquista diz que ao ultrapassar esse tecto cria-se o problema de saber que outros profissionais devem poder ultrapassar esse limite e qual o critério.
Posição diferente tem o PCP e o CDS, dois extremos, que neste ponto concordam. O deputado comunista António Filipe defende que a criação do tecto salarial resultou de uma “medida avulsa do então primeiro-ministro Cavaco Silva” que provocou uma distorção na carreira dos juízes, já que impediu a progressão que já estava prevista na lei. “Isso levou a uma aproximação salarial entre as remunerações dos juízes da primeira instância e dos tribunais superiores”, afirma.
O mesmo diz Vânia Dias da Silva, do CDS, que acredita que o fim do tecto permitirá resolver um problema antigo. “Os juízes com mais de 10 anos de serviço não têm praticamente nenhuma progressão salarial por causa deste tecto”, considera.
A ministra da Justiça insistiu esta quarta-feira que a medida visa repor uma remuneração a que os juízes “já tinham direito”. “Aquilo que se trata não é de aumentar ou diminuir a remuneração. Aquilo que se trata é de atribuir, a partir de agora, aos magistrados a remuneração a que eles tinham direito e que não recebiam em virtude de uma norma que prevê que o limite máximo da remuneração é a remuneração do primeiro-ministro”, argumentou Francisca Van Dunem em declarações à margem de uma conferência em Lisboa.