Aznavour, a segunda visita de “um trabalhador incansável da canção”
Quase uma década depois, Charles Aznavour volta ao mesmo palco para mostrar, aos 92 anos, que não quer parar. De cantar e de viver. Este sábado, no Meo Arena, em Lisboa, às 21h30.
A vida tem destas surpresas. Quando Charles Aznavour actuou em Lisboa, em Fevereiro de 2008, escrevemos que vê-lo seria “uma oportunidade única”. Ele estava em “tournée” de despedida desde o Outono de 2006, naquela que seria a sua última digressão mundial, e não se previa que a “tournée” durasse anos. Mas durou uma década, e continua. O que faz com que Aznavour regresse ao mesmo palco, este sábado, numa sala que mudou de nome (quando cá esteve, em 2008, era Pavilhão Atlântico, agora é Meo Arena) enquanto ele mudava de idade. Hoje, Aznavour tem 92 anos mas não parou, nos palcos ou nos estúdios. Depois de Lisboa, e até Abril de 2017, já tem concertos marcados em Paris (três no Palais des Sports, no fim de Dezembro), Madrid, Santiago do Chile, São Paulo, Rio de Janeiro e Moscovo. Em 2015 lançou um novo disco de originais, Encores, com onze canções da sua autoria, uma das quais em homenagem a Édith Piaf (De la môme à Édith), além de uma versão de um original de Nina Simone, You've Got to Learn, que Aznavour cantou no inglês original. Um ano antes, em 2014, foi editada pela Universal a integral dos seus álbuns de estúdio, numa caixa com 60 CD, a que foi dado o nome de Anthologie.
Nascido em Paris, 22 de Maio de 1924, filho de emigrantes arménios (o seu verdadeiro nome é Shahnour Vaghinagh Aznavourian), Aznavour empreendeu nesta sua “tournée” de despedida uma luta contra a idade e contra o tempo. Em 2008, aos que arriscaram ir vê-lo actuar em Lisboa, Aznavour mostrou-se sem qualquer sinal de decrepitude. A voz, embora não fosse já a mesma dos seus anos áureos, elevava-se sempre que as canções o exigiam, num canto expressivo, permitindo-se dançar, gesticular, gracejar, dramatizar. Estrela que nega sê-lo, preferindo ser visto como “trabalhador incansável da canção”, Charles Aznavour tornou-se um símbolo de longevidade numa carreira que exige entrega, abnegação e esforço. E se é verdade que cada vez mais cantores têm vindo a arriscar para lá da barreira dos 70 (como Dylan) ou mesmo 80 anos (como Cohen, que morreu recentemente mas sem nunca deixar de cantar), Aznavour entrou na barreira dos 90 sem um prazo para deixar os palcos, pisando-os com invejável desenvoltura, como se pode confirmar nos vídeos de actuações mais recentes, como as de Yerevan, na Arménia (Fevereiro), de Verona, Itália (Setembro) ou de Antuérpia, Bélgica (4 de Dezembro).
Em 2008, Aznavour cantou Les emigrants, Paris au mois d’Août, La terre meurt, Que c’est triste, Venise, Je t’aime A.I.M.E., Une vie d’amour, Moi, je vis en banlieue, Fado (onde enfatizou “os amores ardentes de Portugal”), Je voyage, Sa jeunesse, La bohème, Emmenez-moi ou J’abdiquerai, onde ele canta que dizer adeus ao público é como dizer adeus às armas. Talvez por isso ele adie esse adeus, uma vez mais. A fechar a biografia que está no seu site oficial, Aznavour escreveu estas palavras: “Ao longo de oitenta anos de carreira participei em mais de sessenta filmes, compus mais de 800 canções, cantei em seis línguas diferentes. Mas, sobretudo, aquilo que fiz fi-lo com amor e seriedade, embora me tenha sempre divertido, e fi-lo respeitando o meu público e os meus valores.” É com este espírito que Aznavour sobe este sábado a mais um palco, no Meo Arena, em Lisboa, às 21h30. Como se fosse a primeira vez, porque a última só o destino a decidirá.