Do Curdistão para o Porto, a Caravana Feminista atravessou meia Europa
Activistas organizaram diversas iniciativas para reforçar a ligação entre os movimentos feministas espalhados pela Europa.
O relógio marcava as 17h22 quando a carrinha estacionou finalmente no Porto. Vindas da Galiza, as mulheres que compõem a Caravana Feminista chegaram a Portugal, a última etapa de uma longa viagem que se iniciou na região curda da Turquia, no Dia Internacional da Mulher, a 8 de Março. Durante mais de sete meses, percorreram a Europa, alertando não só para as questões associadas à discriminação das mulheres, mas também para questões humanitárias que afectam diversos países.
“É uma caravana itinerante que faz a ligação entre os diversos eventos e faz a documentação das lutas que são travadas a nível local, nos diversos países”, explica ao PÚBLICO Sara Leão, activista da Marcha Mundial das Mulheres em Portugal, e uma das participantes da Caravana Feminista. Numa mistura de convívio e protesto, estas mulheres participaram em diversas iniciativas nos países por onde passaram, lutando pela igualdade de direitos nas mulheres, e reforçando também a ligação entre os movimentos feministas espalhados pela Europa. Nos países onde paravam, procuravam “recolher depoimentos, fotografias, vídeos”, que seriam depois mostrados nos convívios entre as activistas, “mostrando às pessoas presentes um bocadinho do percurso anterior”, explica Sara Leão.
Durante todos estes meses, foram várias as activistas que fizeram parte desta viagem. Em grupos que variavam entre cinco e 10 mulheres, percorreram milhares de quilómetros, deste a fronteira entre a Turquia e a Síria, passando pelo norte da Europa, e descendo depois rumo a sul. A viagem foi “uma aprendizagem muito dura, mas está a ser muito rica”, confessou Carolina Moreira na apresentação desta acção, no âmbito do Festival Feminista, acrescentando que o mais gratificante foi ter “conseguido dar e receber muita energia às mulheres que encontrámos nesta viagem”.
Sara Leão lembra que, apesar de “existirem lutas muito específicas, porque a situação política e cultural é muito diversa”, o objectivo desta iniciativa é também “mostrar que há assuntos que são transversais apesar de todas estas diferenças”. Em Portugal, o tema que merece mais destaque é a influência das políticas de austeridade na vida dos portugueses, em particular “nas lutas que as mulheres portuguesas estão a travar”. De entre vários temas, as activistas querem recordar a polémica sobre as alterações à lei do aborto: “Existe uma vontade de fazer regredir uma lei que foi muito batalhada pelas mulheres portuguesas. Foram precisos muitos anos para conseguirmos ter esse direito, e sentimos que é um direito frágil e que precisamos de continuar atentas e impedir que haja um avanço dessa vontade política”, alerta Sara Leão
No Porto, esta caravana é recebida no âmbito do Festival Feminista, organizado pela Marcha Mundial das Mulheres em Portugal, que se realiza durante todo o mês de Outubro. Com um programa repleto de eventos diversos - desde performances, concertos, tertúlias ou projecções de filmes -, um dos momentos mais aguardados acontece esta terça-feira com uma marcha “contra a violência machista”. Com início na Praça Gomes Teixeira – mais conhecida como Praça dos Leões -, a partir das 15h, as activistas vão de seguida dirigir-se para a Avenida dos Aliados, terminando a acção na Praça dos Poveiros. A marcha tem como objectivo “homenagear as 44 mulheres assassinadas pelos companheiros em 2014” e ainda “marcar uma posição contra este tipo de violência que continua a existir em Portugal”, explica Sara Leão, acrescentando também que querem alertar para “outro tipo de violências machistas que vamos vivendo todos os dias, enquanto mulheres portuguesas”.
Depois do Porto, a Caravana Feminista desloca-se para Coimbra, na quarta-feira, e segue para Lisboa, na quinta-feira, ficando aí até 17 de Outubro, data em que se assinala o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Iniciada no Dia Internacional da Mulher, a escolha das datas para a viagem desta caravana não foi feita por acaso: “São duas datas simbólicas para a marcha, porque a marcha é um movimento que luta pela autonomia das mulheres, pelo acesso aos recursos”, explica Sara Leão.