Lei da rádio impõe entre 25 a 40 por cento de música portuguesa
Sessenta por cento da música portuguesa a difundir tem que ser composta ou interpretada por cidadãos da União Europeia em língua portuguesa
Ao contrário do que estava previsto, a percentagem de música portuguesa que as rádios generalistas têm de passar não é de 25, mas de entre 25 a 40 por cento, uma taxa que será definida anualmente pelo Governo. Esta foi a grande surpresa da nova lei da rádio votada e aprovada ontem à noite na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura. Daqui a lei seguirá para votação global em plenário da Assembleia da República na próxima semana.
A definição de quotas não teve a aprovação do PSD, que queria, em vez da imposição, um regime de incentivos às rádios que preenchessem uma percentagem da sua programação com música portuguesa.
A obrigatoriedade de as rádios passarem entre 25 e 40 por cento de música portuguesa das 7h às 20h (a excepção é a Antena 1, que já cumpre uma quota de 60 por cento), uma definição mais abrangente de música portuguesa (que inclui criações de cidadãos estrangeiros residentes em Portugal, de cidadãos portugueses em língua estrangeira e todo o universo da lusofonia) é outra das novidades da lei. Novidade é também o facto de 60 por cento da música portuguesa a difundir ter que ser composta ou interpretada por cidadãos da União Europeia em língua portuguesa. Trinta e cinco por cento terá de ser preenchida por novidades (editadas nos seis meses anteriores).
As infracções à lei implicam multas que variam entre três mil e 50 mil euros.
A lei deveria ter sido aprovada a 20 de Dezembro, mas o PSD atrasou a aprovação alegando necessidade de um parecer jurídico que verificasse a compatibilidade do novo texto com o direito comunitário e o apuramento sobre se iria provocar um aumento de despesa da Entidade Reguladora da Comunicação Social levou ao seu adiamento.
50 por cento de portugueses nos tops de vendasOntem, no mesmo dia em que a lei foi aprovada, a Associação Fonográfica Portuguesa, uma das que mais têm lutado pela imposição de quotas, publicou um estudo da empresa Nielsen onde revela que, dos 30 álbuns mais vendidos em 2005, 53,3 por cento são de expressão portuguesa. É uma ligeira subida em relação a 2004, quando esta percentagem foi de 46,6 por cento.
Em contrapartida, a percentagem de música de expressão portuguesa que passa nas rádios é de 14,2 por cento.
O álbum dos D"Zert, o mais bem sucedido grupo português da actualidade, está no top, seguido dos Humanos, Escolinha da Música, Adriana Partimpim. Mariza está no nono lugar, à frente dos U2, em 20.º, Rui Veloso está em 16.º à frente de Robbie Williams, em 18.º.
Para a AFP, os dados mostram que "há um grande desfasamento entre o que os portugueses compram e o que ouvem nas rádios", disse Eduardo Simões, presidente, antes da aprovação da lei. "São boas notícias para a música portuguesa, mas também mostra que é preciso fazer alguma coisa para alterar a situação."
Já José Faustino, presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR), contra as quotas, diz que a publicação dos dados é "uma forma de pressão da indústria para apressar a Assembleia a aprovar a lei".
Faustino diz que desconhece que tipo de estudo foi pedido e considera "estranho" que apareça no mesmo dia da votação.
A APR considera que "não vale a pena alterar a lei da rádio só por causa das quotas", que interferem na liberdade das rádios. "Somos contra as quotas, porque esta medida é avulsa e não resolve o problema", que passa, por exemplo, pela alteração do IVA nos discos, que deveria ser igual ao dos livros, e nos instrumentos musicais. Faustino considera que esta lei protege a indústria fonográfica, que fez das rádios o "bode expiatório" da crise.
Também David Ferreira, porta-voz da Plataforma pela Música - que inclui a FNAC, a AFP, a Associação Fonográfica Independente, Associação Venham Mais Cinco, Sociedade Portuguesa de Autores e Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes - lê os dados da mesma forma que a AFP. E acrescenta: "Os dados mostram que há muitas oportunidades que a rádio não explora".
Defensor das quotas, o porta-voz e administrador da EMI diz ainda que os dados "mostram também que a introdução de quotas vai ser estimulante para a música portuguesa e não vai ser prejudicial para as rádios, que temiam perder audiências".
David Ferreira considera que o aumento da presença portuguesa no top 30 teve a "ajuda" do fenómeno dos D"Zert: "Quando há um grande fenómeno na música portuguesa, isso ajuda toda a música portuguesa".