Câmara quer pavilhão do Areeiro aberto para sem-abrigo. Junta lança petição para que seja “restituído à cidade”

Pavilhão desportivo municipal do Casal Vistoso está aberto há mais de um ano para acolher pessoas em situação de sem-abrigo. Câmara chegou a dizer que este pavilhão fecharia e que os utentes seriam transferidos para o Quartel de Santa Bárbara, em Arroios, mas voltou agora atrás. Junta avançou com uma petição contra a decisão.

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O pavilhão desportivo do Casal Vistoso foi transformado em centro de emergência em Março de 2020 Nuno Ferreira Santos

Na noite de 17 de Março de 2020, o pavilhão municipal do Casal Vistoso deixou de ser um recinto desportivo para passar a ser casa de muitas pessoas que pernoitavam nas ruas de Lisboa e se assustaram com o vírus. A Câmara de Lisboa montou um centro de acolhimento de emergência temporário que, desde então, se mantém de portas abertas, acolhendo em permanência cerca de 90 utentes. Por ali, a convivência entre utentes — e várias pessoas sem casa que acabam por ali acorrer, mesmo não estando alojadas no pavilhão — e vizinhos não tem sido fácil, com estes a reclamarem do lixo que se acumula à entrada dos prédios, do aumento da mendicidade e de não poderem utilizar o espaço para a prática de exercício físico. 

Ora, a Junta de Freguesia do Areeiro considera que o prolongamento desta solução de emergência por mais de um ano é “insustentável” e, por isso, lançou uma petição online em que apela à “restituição do Complexo Desportivo Municipal do Casal Vistoso à cidade de Lisboa”.

“A situação, que era temporária, arrastou-se até ao dia de hoje. Apesar de compreender a situação de emergência que se vivia devido à pandemia, a Junta de Freguesia do Areeiro procurou, por vários meios, que a Câmara Municipal de Lisboa percebesse que aquela não era uma situação sustentável a médio e longo prazo. E isto porque o pavilhão não tem condições condignas para os sem-abrigo, além de que a sua utilização como centro de acolhimento impede a prática de desporto (com prejuízo óbvio para os fregueses e para todos aqueles que utilizavam o espaço)”, refere a junta de freguesia em comunicado.

Esta tomada de posição mais firme por parte do presidente da junta, Fernando Braamcamp (PSD), surge depois de o vereador dos Direitos Sociais, Manuel Grilo (BE), ter revelado que seria criado um novo centro de acolhimento no antigo Quartel de Santa Bárbara, na freguesia de Arroios. Em meados de Março, o vereador anunciou que este novo centro teria mais capacidade e maior conforto para acolher a população sem-abrigo que está há um ano a dormir em camas improvisadas. Dessa forma, o centro montado no pavilhão do Casal Vistoso encerraria, passando os seus utentes para o antigo quartel.

No entanto, no início desta semana, Manuel Grilo veio clarificar que o centro de acolhimento do Areeiro não iria afinal encerrar, antecipando os tempos difíceis que se avizinham com o fim das moratórias de crédito e o previsível aumento do desemprego. “Precisamos de ter lugares de reserva para quem chegar à rua”, salientou o autarca à agência Lusa. 

A ideia é, assim, que o Casal Vistoso continue em funcionamento e o Quartel de Santa Bárbara seja reabilitado para poder depois receber cerca de 130 utentes identificados na zona de Arroios. Estas obras deverão estar concluídas em Junho, depois de quase um milhão de euros de investimento, e, segundo o vereador, estão já sinalizadas “55 pessoas em situação de sem-abrigo”. 

No entanto, a notícia de que o antigo quartel seria transformado num centro de acolhimento também não agradou à presidente da Junta de Freguesia de Arroios, Margarida Martins (PS), que disse não ter sido consultada sobre essa decisão, expressando o receio de que essa solução pudesse levar para a sua freguesia mais pessoas sem tecto. 

A Junta do Areeiro disse já ter solicitado uma reunião de emergência com o presidente da câmara e que levará o assunto à Assembleia Municipal de Lisboa e à Assembleia de Freguesia.

“Ao longo deste ano temos sido pacientes e tido boa-fé relativamente a este assunto. Fomos sensíveis à situação e compreendemos que vivíamos um momento de emergência, ao qual era preciso dar resposta imediata. Mas passou um ano e a situação permanece igual, sendo que não dão resposta aos nossos pedidos. Pior: divulgam uma informação e voltam com a palavra atrás. A situação tornou-se verdadeiramente insustentável e, por isso, seremos obrigados a agir, pois temos de defender os interesses dos nossos fregueses e, também, de garantir que a população sem-abrigo que se encontra no pavilhão tem acesso a condições mais condignas do que aquelas que tem actualmente”, refere Fernando Braamcamp, citado na nota em que anuncia o lançamento da petição

De acordo com a última contagem conhecida, feita nos meses de Outubro e Novembro pelo município, há 356 pessoas a pernoitar nas ruas da capital. Dessas, 140 tinham chegado à situação de sem-abrigo no último ano e 21 há mais de dez anos.

Além do Casal Vistoso, mantêm-se em funcionamento mais três centros de emergência criados para responder à pandemia de covid-19: a Casa do Lago, a Pousada da Juventude do Parque das Nações e a Casa dos Direitos Sociais da autarquia (para onde foram transferidas no início de Outubro as pessoas que estavam no centro instalado no Clube Nacional de Natação).

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