São já 320 os infectados nas cadeias: agora há 65 reclusos e um trabalhador no EP de Lisboa; e 11 em Alcoentre
Serviços prisionais não estão a conseguir detectar surtos com antecedência nas cadeias. Estão infectados 239 reclusos, 79 profissionais (dos quais 52 guardas) e duas crianças. Direcção-geral vai testar todos os 900 reclusos e 240 trabalhadores do EPL.
Depois de Tires, Lisboa. Na terça-feira à tarde eram 250 as pessoas infectadas em todo o sistema prisional, entre reclusos e trabalhadores, mas nesta quinta-feira até meio da tarde eram já pelo menos mais 70. Depois da primeira remessa de resultados dos testes a cerca de 200 reclusos e 30 trabalhadores, o Estabelecimento Prisional de Lisboa (EPL) tem, para já, 65 reclusos (contando com os seis detectados na quarta-feira) e um trabalhador infectados.
Mas ainda falta saber o resultado de cerca de 50 dos 230 testes feitos na quarta-feira e os serviços prisionais já decidiram testar os restantes reclusos do EPL (são, ao todo, cerca de 900) e todos os trabalhadores (cerca de 240) nos próximos dias.
E, depois da prisão de Lisboa, junta-se agora à lista a de Alcoentre, com onze casos positivos, soube o PÚBLICO que confirmou depois a informação com a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP). Esta entidade recusa, porém, tratar-se de um surto, já que foram onze reclusos que regressaram da rua, de “saídas jurisdicionais” em altura distintas, e foram testados quando estavam a fazer a quarentena. Embora estivessem assintomáticos, foram encaminhados para a unidade de saúde prisional.
Questionada pelo PÚBLICO, a DGRSP conta que além destas três cadeias, “há registo de reclusos positivos à covid-19, genericamente vindos da rua, noutros quatro estabelecimentos prisionais”. O que faz com que no conjunto das 49 cadeias do país já 42 onde não se regista qualquer infecção, vinca a direcção-geral.
147 recuperados
Na contabilização geral, há 320 casos de infecção nos serviços prisionais: 239 reclusos, 79 profissionais (52 guardas, 14 profissionais de saúde, seis técnicos de reinserção social, três auxiliares técnicos, dois professores, uma cozinheira e um segurança), e duas crianças que estão com as mães em Tires. “Informa-se igualmente que há, desde o início da pandemia, 147 casos recuperados, sendo 79 de trabalhadores, 64 de reclusos e quatro de jovens internados em centros educativos”, especifica a DGRSP.
Os números da última semana mostram que os serviços prisionais não estão a conseguir conter os surtos quando aparecem os primeiros sintomas em alguns reclusos. Para isso também contribui o facto de se terem feito poucos testes desde o início da pandemia. Na semana passada, a propósito do surto de Tires - cadeia feminina onde desde o início da pandemia só se tinham feito 13 testes, todos a reclusas que tinham entrado na prisão -, a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais dizia ao PÚBLICO que estava a fazer 320 naquele estabelecimento e, desde a pandemia, registava 6783 testes em todo o sistema prisional. Refira-se que em todo o país há cerca de 12.500 reclusos - a que é preciso somar os guardas prisionais e outros trabalhadores.
O surto no EPLisboa foi detectado depois de um recluso que trabalha na enfermaria ter dado positivo num teste por apresentar sintomas. Foram isolados os serviços clínicos e duas alas da prisão (a H, a denominada zona livre de drogas, e a C), com as quais esse recluso teve contacto.
Os reclusos da enfermaria foram testados no início da semana e na terça-feira foram dados como positivos à covid-19 seis dos 19 reclusos. De acordo com informação da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, os testes realizados na quarta-feira aos reclusos das alas H e C (cerca de 200) e aos trabalhadores identificados (cerca de 30) como tendo tido contactos susceptíveis de risco de contágio registaram, para já, 59 reclusos e um trabalhador infectados. No entanto, ainda só estão disponíveis 172 dos cerca de 230 efectuados.
“Neste quadro e no âmbito do plano de contingência, a DGRSP determinou a afectação dos reclusos positivos, genericamente assintomáticos, a uma única ala do Estabelecimento Prisional de Lisboa onde permanecerão em isolamento, separados da restante população prisional e sob vigilância e acompanhamento de pessoal clínico” da própria cadeia.
Perante este cenário, a direcção da prisão decidiu suspender as visitas, com excepção das dos advogados, assim como as actividades de formação escolar e profissional e de trabalho. Mas os reclusos mantêm o “direito legalmente consagrado a recreio a céu aberto e a telefonar”, garantem os serviços prisionais.
“A DGRSP, em articulação estreita com a saúde pública e seguindo os seus planos de contingência, está empenhada na contenção deste surto no Estabelecimento Prisional de Lisboa, tendo em vista a salvaguarda da saúde dos reclusos e dos trabalhadores”, garante aquela entidade.
Demora na resposta a casos suspeitos
Na cadeia de Tires, o surto começou com uma reclusa que, por outra doença, saía com frequência da prisão para tratamentos e consultas mas que, segundo informação recolhida pelo PÚBLICO, não era sujeita a quarentenas. Quando foi internada em Caxias na última semana de Outubro foi diagnosticada com covid-19. Apesar de ter sabido do resultado no dia 29, a direcção da cadeia mando as guardas prisionais fazerem uma busca geral, o que implica maior contacto com as reclusas e mexer nos seus pertences. Nos dias seguintes, apesar de haver pelo menos duas dezenas de reclusas com sintomas ligados à covid-19, como falta de paladar e olfacto, febre, dores de cabeça e corpo, só foram testadas três presas quatro e cinco dias depois.
Canceladas as actividades e as visitas (estas de forma parcial), as reclusas foram colocadas nas celas 23 horas por dia, tendo sido igualmente suspensas as refeições no refeitório e as compras na “cantina”. Ao PÚBLICO houve relatos de falta de medicação para quem estava com sintomas, queixas de falta de material de limpeza das celas e de produtos de higiene íntima para as reclusas, que ficaram também sem acesso a bens que compram na cantina como água engarrafada (essencial para as grávidas), alimentação extra como cereais, ou tabaco. Os advogados queixaram-se que não conseguiam ter acesso às reclusas, já que tanto o pavilhão das condenadas como o das preventivas foram colocados em isolamento. As reclusas queixaram-se que estavam numa situação “desumana".
Advogados aconselhados a usarem videoconferência para falarem com reclusos
Apesar deste cenário, a ministra da Justiça garantiu nesta segunda-feira no Parlamento que as reclusas estavam a receber os cuidados de que precisavam e congratulou-se com a inexistência de surtos de covid-19 no sistema prisional - mas sem referir que já tinha havido outros de menor dimensão em Chaves (Setembro) e Leiria (Outubro).
Entretanto, a Ordem dos Advogados, que já na terça-feira aconselhara os advogados a privilegiarem o contacto com as reclusas de Tires por videoconferência e só usarem o parlatório, onde há barreiras acrílicas entre os interlocutores, em casos “absolutamente excepcionais”, veio defender o mesmo método para os contactos com o EPLisboa.
Notícia actualizada às 19h com os últimos dados da DGRSP.