ADSE conta com sector social para contornar saída de privados

Hospitais das Misericórdias, Hospital da Cruz Vermelha e Hospital das Forças Armadas podem ser alternativas às unidades de saúde privadas que ameaçam deixar de trabalhar com a ADSE.

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A ADSE tem mais de 1,2 milhões de beneficiários Miguel Manso

A direcção da ADSE está a contar com os hospitais do sector social, como o Hospital a Cruz Vermelha ou as unidades de saúde geridas pelas Misericórdias, e com o Hospital das Forças Armadas para garantir que os beneficiários não serão prejudicados pela eventual saída de quatro grandes grupos de saúde da rede de prestadores do sistema de assistência na doença da função pública. À partida, tanto as Misericórdias como o Hospital da Cruz Vermelha estão disponíveis para reforçarem a cooperação com a ADSE, mas estas soluções podem não conseguir responder às dificuldades que se abrirão na área das grandes cirurgias.

O PÚBLICO apurou junto de fonte próxima do processo que a ADSE está a colocar em cima da mesa várias alternativas para fazer frente à eventual denúncia das convenções por parte dos grupos Hospital Particular do Algarve, José de Mello Saúde, Luz Saúde e Trofa, reforçando as convenções que já têm com alguns operadores e assinando novas convenções. “A ADSE está a contar com o Hospital da Cruz Vermelha, com o Hospital das Forças Armadas e com o Hospital dos Lusíadas”, adianta a mesma fonte.

O assunto será abordado na reunião desta terça-feira do Conselho Geral e de Supervisão da ADSE (onde têm assento representantes dos beneficiários, dos sindicatos, das associações de reformados e do Governo). Uma das preocupações deste órgão, que até já foi abordada em reuniões anteriores, é a necessidade de diversificar as convenções para que a ADSE não fique refém dos grandes grupos privados. Mas, tal como o PÚBLICO noticiou, o presidente do conselho, João Proença, também reconhece a importância dos privados de maior dimensão na área das grandes cirurgias.

Do lado das Misericórdias há disponibilidade para reforçar a cooperação com a ADSE. “Temos disponibilidade para fazer mais convenções, mas ao que julgo saber o grande volume da ADSE é em Lisboa. E, em Lisboa, o hospital mais perto que temos é Benavente ou Entroncamento”, adiantou Manuel Lemos, presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP).

“Faz um ano que assinámos um protocolo com a ADSE para permitir que as Misericórdias possam prestar serviços de atendimento em cuidados de saúde aos utentes deste sistema de assistência médica”, lembra, acrescentando que os hospitais de Anadia, Fafe, Póvoa do Lanhoso e Lousada tinham manifestado interesse em estabelecer convenções com a ADSE. “Havia essa expectativa, mas depois nada avançou”, lamenta Manuel Lemos.

Neste momento, a ADSE já tem convenção com os hospitais geridos pelas Misericórdias em Vila Verde, Mealhada, Riba de Ave, Felgueiras, Esposende, Prelada (Porto) e Entroncamento. A tabela de preços que se aplica é a das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), que é 15% mais barata do que a tabela do sector privado.

É ao abrigo da tabela das IPSS que o Hospital da Cruz Vermelha trabalha com a ADSE há já vários anos. “A convenção está aberta a todas as especialidades, trabalhamos bem com a ADSE”, adianta fonte da direcção do hospital, acrescentando que o subsistema da função pública “é um cliente importante”.

E haverá disponibilidade para receber mais beneficiários da ADSE? “Dentro da capacidade", responde a mesma fonte, notando que não fazem distinção entre clientes. 

Não há situações extremas, diz ministra

No comunicado que fez na semana passada, negando que os grupos privados já tivessem pedido “formalmente” a denúncia das convenções, o conselho directivo da ADSE garantia que estava disponível para celebrar “novas convenções com outros prestadores”. E, no sábado, em declarações ao Expresso, a presidente da ADSE, Sofia Portela, garantia que “existem grupos em expansão que aproveitarão a oportunidade”. Já nesta segunda-feira, o PÚBLICO perguntou à responsável a que grupos se estava a referir, mas não teve resposta.

Nesta segunda-feira, a ministra da Saúde, Marta Temido, desvalorizou o braço-de-ferro entre os privados e subsistema de saúde da função pública e reforçou a posição defendida pela direcção da ADSE. “Se isso acontecer em relação a alguns prestadores, outros existirão que manter-se-ão disponíveis para continuar a trabalhar com a ADSE. Não se coloca nenhuma situação extrema, é natural que, num contrato que tem duas partes, uma das partes considere que manter o serviço naquelas condições não é desejável, não é aceitável”, afirmou.

Negociação individual com cada privado

O PÚBLICO sabe que além de estar a trabalhar em soluções alternativas, o conselho directivo da ADSE está também a preparar uma base de entendimento que permita relançar o diálogo com os grupos privados que, na semana passada, ameaçaram deixar o sistema.

“É importante criar estabilidade e retomar a confiança”, adianta ao PÚBLICO fonte que tem acompanhado o processo, acrescentando que a negociação será feita com cada um dos grupos e não por intermédio da associação que os representa.

A intenção é, durante a primeira quinzena de Março, apresentar aos grupos privados uma proposta de entendimento, para depois se reatar a negociação dos limites aos preços dos medicamentos, próteses e cirurgias, uma obrigação que está prevista no decreto-lei de execução orçamental de 2018 e que não chegou a concretizar-se.

Caso este plano vá por diante e caso os privados aceitem ficar com preços máximos, a necessidade de fazer regularizações de preços retroactivamente deixaria de fazer sentido.

Os grupos privados ameaçaram deixar a ADSE depois de em Dezembro terem sido confrontados por esta entidade com a necessidade de devolver 38 milhões de euros que terão sido facturados a mais em 2015 e em 2016. Mais de 80% deste valor diz respeito aos grandes hospitais que agora ameaçam denunciar as convenções. E que contestam a forma como se chegou a estes montantes e a correcção retroactiva de preços.

A ADSE tem mais de 1,2 milhões de beneficiários, e, em 2018, cerca de 900 mil recorreram às mais de 1600 entidades que têm convenção com a ADSE entre hospitais privados, clínicas, laboratórios de análises ou centros de reabilitação.

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