Dois sindicatos de enfermeiros mantêm suspensão da greve até ao final do mês, um avança com paralisação

Após uma reunião de quatro horas, a Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros e o Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal decidem manter a suspensão esperando mais negociações. Já o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses avança com paralisação.

Foto
Mario Lopes Pereira

A Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE) e o Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor) vão manter até 30 de Janeiro a suspensão da greve cirúrgica, convocada para sete centros hospitalares. A decisão foi tomada esta quinta-feira, depois de uma reunião com a ministra da Saúde e representantes do Ministério das Finanças. No final de todos os encontros, Marta Temido falou em aproximações, mas afirmou que "não é possível corrigir 20 anos numa legislatura".

A paralisação tinha início previsto para o dia 14 e já tinha sido suspensa até à realização do encontro do Ministério da Saúde que decorreu esta quinta-feira. A decisão das duas estruturas sindicais foi conhecida ao final da tarde depois de os dirigentes sindicais terem estado numa reunião com a ministra da saúde e representantes do Ministério das Finanças durante quatro horas.

Lúcia Leite, presidente da ASPE, adiantou que haverá que uma nova reunião com o Governo no dia 30 de Janeiro e que se nessa altura não se verificarem avanços na negociação avançará então a greve cujo pré-aviso se mantém tendo fim marcado para o dia 28 de Fevereiro. Nessa reunião estará presente a ministra da Saúde e a secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, Maria de Fátima Fonseca, em representação do Ministério das Finanças.

"Conseguimos agendar uma negociação suplementar para dia 30 e ficou assumido que teríamos um novo protocolo negocial para negociar o acordo colectivo de trabalho (ACT). Será em ACT que matérias como a avaliação de desempenho, a penosidade da profissão, a idade de aposentação ou condições mais favoráveis aos enfermeiros para aposentação voluntária serão discutidas. Para nós também é muito importante a matéria sobre a transição desta carreira para a próxima e as condições de transição que podem de facto compensar algumas injustiças que os enfermeiros foram sujeitos ao longo destes anos", disse Lúcia Leite.

"Não vamos cancelar a greve, que é até ao dia 28 de Fevereiro. O que posso dizer é que se no dia 30 não chegarmos a um acordo que seja aceitável para os enfermeiros, iniciaremos a greve e convocaremos nova greve para outras instituições e reforçaremos a nossa posição", acrescentou.

A avançar, a paralisação terá especial incidência nos blocos operatórios, seguindo o modelo praticado na greve que se realizou entre 22 de Novembro e 31 de Dezembro de 2018. O pré-aviso de greve inclui os centros hospitalares do Porto, São João, Braga, Tondela-Viseu, Gaia/Espinho, Tâmega e Sousa e Hospital Garcia de Orta. E abrange todos os enfermeiros de todos os turnos e assegura serviços mínimos, ficando garantida a urgência, tratamentos e cirurgias oncológicas e hemodiálise.

O Movimento Greve Cirúrgica tem a decorrer uma angariação de fundos para apoiar os enfermeiros que aderirem à paralisação. Até ao momento foram angariados mais de 421 mil euros.

À saída da reunião também o presidente do Sindepor, Carlos Ramalho, insistiu na necessidade de avançar mais nas negociações. "As conclusões ainda não são aquelas que gostaríamos que fossem e vai haver uma nova reunião para acertar os restantes detalhes. Vamos suspender a greve até à próxima reunião, marcada para dia 30", disse.

O dirigente salientou ainda que os enfermeiros “conseguiram garantir o que já estava em aberto: a certeza de que vai haver uma carreira com três categorias, um justo descongelamento das progressões” e a um subsídio de função para todos os enfermeiros especialistas a exercer funções. “O que continua em causa é a compensação do especial desgaste e da penosidade da profissão e também a questão da tabela salarial."

Terminadas as negociações?

Ao mesmo tempo que estas estruturas decidiram manter a suspensão da greve, outro sindicato com abrangência nacional decidiu avançar. Esta quinta-feira de manhã, os ministérios da Saúde e das Finanças reuniram-se com o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) que anunciou a realização de uma greve de quatro dias na próxima semana. No final do encontro, o presidente do SEP referiu que o Governo deu por terminadas as negociações, sem responder às reivindicações relacionadas com a idade de aposentação e revisão da grelha salarial. Outro ponto de discórdia é a contagem dos pontos para progressão na carreira no caso dos enfermeiros que entre 2011 e 2015 sofreram uma melhoria salarial, fruto de uma revisão que estipulou os 1200 euros como valor mínimo da carreira de enfermagem.

A greve tem início a 22, na região de Lisboa e Vale do Tejo, passando depois para a zona Centro (dia 23), Norte (dia 24) e Alentejo, Algarve e Açores (dia 25). Na reunião também esteve o Sindicato dos Enfermeiros da Madeira que avança igualmente para a greve.

"Estas alterações não satisfazem as reivindicações"

A Federação Nacional dos Sindicatos dos Enfermeiros (Fense), que junta o Sindicato Independente dos Profissionais de Enfermagem (SIPE) e o Sindicato dos Enfermeiros (SE), deixou o Ministério da Saúde antes das 20h. No final do encontro, Fernando Parreira, presidente do SIPE, disse que a tutela lhes apresentou uma proposta que consideram que não satisfaz os enfermeiros e que querem continuar a negociar a proposta de acordo colectivo de trabalho que apresentaram ao Governo em Agosto de 2017.

“Nesta reunião foi-nos apresentado um projecto de diploma para alterar a carreira de 2009, projecto que não teve a negociação nem a participação da Fense. Motivo pelo qual a rejeitamos. Estas alterações não satisfazem as reivindicações dos enfermeiros, não melhora o exercício profissional, não melhora as remunerações dos enfermeiros, anula a possibilidade de negociação colectiva. Ou seja, o ministério da saúde quer manter a situação actual e hipotecar o futuro dos enfermeiros. Foi informada a senhora ministra que o que nós queremos é negociar o nosso acordo de colectivo de trabalho, pois é este que satisfaz os enfermeiros”, afirmou.

Se a negociação não decorrer como o esperado, a Fense admite poder adiar greves já marcadas ou marcar ela uma paralisação. O assunto será debatido agora debatido internamente. A nova ronda negocial ainda não tem data marcada.

Ministério fala em aproximação

No final, a ministra da Saúde falou em aproximações, mas afirmou que "não é possível corrigir 20 anos numa legislatura". “Foi um conjunto das aproximações das partes. Tem sido um caminho longo e na reunião de hoje, que foi de natureza política, permitiu perceber tudo o que temos andado desde o início deste processo e o que foram as evoluções do último mês em relação às reivindicações dos enfermeiros”, começou por dizer.

Num balanço das negociações, Marta Temido salientou que está em cima da mesa a constituição da categoria de enfermeiro especialista, a categoria de enfermeiro de topo com funções de gestão, a transição de antigas categorias subsistentes para a categoria de topo e a assunção de que os descongelamentos para os enfermeiros que não tiveram outras valorizações têm uma contagem de um ponto e meio desde 2004 até 2014. Regras aplicadas aos contratos em funções públicas e aos contratos individuais de trabalho.

“Não nos aproximamos numa matéria que nos tem sido colocada de apagar o efeito de um reposicionamento remuneratório em 2011, 2012, 2013 e 2015 para alguns enfermeiros. Nestes anos um conjunto de enfermeiros passou de ganhar 1020 euros para 1200 euros. Temos de contar os pontos a partir daí”, explicou Marta Temido. Esta matéria levou vários enfermeiros a apresentaram acções em tribunal contra as unidades onde trabalham.

Questionada sobre se passariam a existir enfermeiros com menos anos de carreira a receber mais e a progredir mais cedo que outros com mais tempo de enfermagem, a ministra disse que não. “Vamos ter provavelmente a impossibilidade de corrigir hoje, por uma revisão da carreira ou por efeito de descongelamento, um histórico de congelamentos nesta profissão. Estamos muito empenhados em conseguir valorizar as profissões, mas não podemos corrigir 20 anos numa legislatura”.

Questionada sobre as diferentes posições dos sindicatos, a ministra explicou que embora existam pontos comuns nos cadernos reivindicativos, mas nem todas as estruturas sindicais têm as mesmas prioridades. Já sobre a suspensão da greve cirúrgica até ao dia 30 de Janeiro e sobre o que falta para que esta paralisação possa ser desconvocada, Marta Temido disse que “é prematuro” dizê-lo.

De manhã, a ministra da Saúde esteve no Parlamento a explicar a proposta de lei de Bases da Saúde do Governo aos deputados do PS. Depois aos jornalistas disse contabilizar em 200 milhões de euros as reivindicações que o Governo já satisfez aos enfermeiros e disse que não é possível dar resposta a tudo o que pedem porque isso implicaria uma despesa de 500 milhões de euros.

O caminho que nós já andámos importa em 200 milhões de euros só para esta profissão. O caminho que agora nos pedem vai além dos 500 milhões de euros em efeitos remuneratórios se todas as reivindicações fossem atendidas”, disse.

Sublinhou ainda que existem várias razões para não atender a todas as reivindicações, entre elas esta: “A ministra da Saúde não é apenas ministra dos profissionais de Saúde e o Governo não é apenas Governo das reivindicações profissionais; têm de, em primeira mão, satisfazer o interesse público e dos cidadãos. E têm também de garantir equidade de tratamento entre as várias profissões e a sustentabilidade [do sistema] a longo prazo."

Sugerir correcção
Comentar