Armando Vara será o único na cadeia por tráfico de influência
Juíza contrariou pedido do Ministério Público para que fosse emitido um mandado de condução do ex-ministro à cadeia, optando por dar a Vara três dias para se apresentar na prisão.
Neste momento, não há nenhum recluso nas cadeias portuguesas a cumprir pena pelo crime de tráfico de influência. A juíza Marta Carvalho do Tribunal de Aveiro deu esta segunda-feira três dias ao ex-ministro socialista Armando Vara para se apresentar num estabelecimento prisional para cumprir a pena de cinco anos de cadeia por três crimes de tráfico de influência, decretada no âmbito do processo Face Oculta. E ao entrar na prisão, Armando Vara vai tornar-se no único recluso nas cadeias nacionais por ter cometido este crime.
A informação foi enviada ao PÚBLICO pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), que não conseguiu esclarecer em tempo útil se, no passado, houve outros condenados a cumprir prisão efectiva por este crime, existente desde 1995 no Código Penal. “À presente data, não se encontra ninguém no sistema prisional em cumprimento de pena pelo crime de tráfico de influência”, respondem os serviços prisionais. A tal não será alheio o facto de este crime ter uma punição máxima de cinco anos de prisão e penas até este limite serem habitualmente suspensas.
A juíza Marta Carvalho determinou a emissão de mandados de condução à cadeia relativamente a dois outros arguidos do caso, mas não quanto ao antigo governante, que em Dezembro se mostrou disponível para se apresentar voluntariamente na prisão. "Se neste prazo o arguido não se apresentar na cadeia, o mandado será emitido", explicou ao PÚBLICO o juiz-presidente da comarca de Aveiro, Paulo Brandão.
A decisão de Marta Carvalho contraria o pedido do Ministério Público para que fosse emitido um mandado de condução de Vara à cadeia e vai ao encontro do que tinha sido solicitado pelos advogados do antigo governante.
Foi também a defesa de Armando Vara a pedir que este cumprisse a pena no Estabelecimento Prisional de Évora destinado a reclusos que exerceram funções em forças ou serviços de segurança ou a condenados que necessitem de especial protecção. No entanto, Paulo Brandão explicou que o arguido pode apresentar-se em qualquer cadeia, sendo responsabilidade dos serviços prisionais o transporte para a prisão que considerar mais conveniente para o arguido.
Contactado pelo PÚBLICO, o advogado de defesa de Vara, Tiago Bastos, recusou-se a precisar quando e onde é que o cliente se irá apresentar. Na cadeia de Évora, os guardas prisionais ainda não dispõem de qualquer informação oficial que confirme a ida de Vara para aquele estabelecimento prisional.
A pena de cinco anos de prisão efectiva foi determinada por um colectivo de juízes de Aveiro em Setembro de 2014, uma condenação confirmada em Abril de 2017 pelo Tribunal da Relação do Porto. A defesa ainda tentou recorrer para o Tribunal Constitucional, mas esta instância recusou-se, por duas vezes, pronunciar-se sobre as questões suscitadas pelos advogados do ex-ministro socialista. A última decisão do Constitucional foi tomada no final de Novembro passado e em meados de Dezembro a condenação de Vara tornou-se definitiva.
Apresentar-se-á voluntariamente
A 12 de Dezembro, segundo informação do Tribunal de Aveiro, a defesa do antigo governante apresentou um requerimento a declarar que este pretendia apresentar-se voluntariamente para iniciar o cumprimento da pena. Mas tal só pode acontecer agora, depois de uma decisão da juíza do Tribunal de Aveiro que tem o caso nas mãos.
No caso Face Oculta ficou provado que, a pedido do empresário das sucatas Manuel Godinho, Vara exerceu influência junto de Mário Lino, ex-ministro das Obras Públicas, para destituir a secretária de Estado Ana Paula Vitorino e o presidente do conselho de administração da Rede Ferroviária Nacional, Luís Pardal, com quem o empresário mantinha um diferendo. Em contrapartida, Vara recebeu de Godinho 25 mil euros e várias prendas.
Foi também o antigo ministro socialista que apresentou Paiva Nunes, administrador da EDP Imobiliária, ao empresário das sucatas. Paiva Nunes terá favorecido Godinho em vários negócios a troco de um Mercedes topo de gama.
Além de Vara, há mais três arguidos com penas de prisão efectiva que já não podem recorrer das respectivas condenações, mas um deles levantou há dias a questão da prescrição de crimes. Trata-se do ex-funcionário da Lisnave Manuel Gomes, condenado a cinco anos de prisão efectiva por um crime de corrupção e dois de burla. Quanto a este arguido, a juíza reconheceu a prescrição de um crime, o que vai obrigá-la a determinar uma nova pena. Quanto aos outros dois arguidos mandou emitir os respectivos mandados de condução à cadeia.
Nesta situação está o primeiro arguido do Face Oculta para quem a pena de prisão efectiva se tornou definitiva: João Tavares, um ex-funcionário da Petrogal, que foi condenado a cinco anos e nove meses de cadeia. As hipóteses de novos recursos já terminaram em Novembro de 2017, mas o facto de o processo físico não se encontrar em Aveiro (chegou há uns dias) impedia a juíza que tem competência para emitir os mandados de comprovar o trânsito em julgado da condenação.
Tal obrigou a que fossem pedidas ao Tribunal da Relação do Porto cópias certificadas do acórdão que, em Abril de 2017, confirmaram a condenação do ex-funcionário da Petrogal e a pedir informações aos tribunais para confirmar que não contestara essa decisão.
Ao mesmo tempo que a condenação de Vara se tornava definitiva, o mesmo acontecida à do arguido Manuel Guiomar, um antigo quadro da Refer, condenado a seis anos e meio de prisão efectiva, por um crime de corrupção e quatro de burla. Também este foi visado por um mandado de condução à cadeia emitido esta segunda-feira.
Entretanto ainda estão pendentes vários recursos no Tribunal Constitucional, nomeadamente, os que dizem respeito ao empresário Manuel Godinho, ao sobrinho Hugo, ao antigo presidente da REN (Redes Energéticas Nacionais) José Penedos, ao seu filho Paulo Penedos, ao antigo funcionário da Lisnave Figueiredo Costa e a Paiva Nunes.