Grupo de 44 cidadãos propõe sistema de saúde que articule público, privado e social

Subscritores defendem que para o financiamento do SNS seja desenvolvida uma lei de meios que preveja as despesas e as receitas correntes.

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Paulo Pimenta

Um sistema de saúde centrado no utente, com o Serviço Nacional de Saúde como "espinha dorsal", mas articulado com os sectores privado e social é o que 44 cidadãos propõem para uma nova lei de bases da saúde. Os dez princípios orientadores foram apresentados esta segunda-feira, em Lisboa, e são subscritos por várias pessoas entre as quais Alexandre Castro Caldas, Bagão Félix, Guilherme d'Oliveira Martins, Germano de Sousa ou Vítor Melícias.

Em declarações aos jornalistas, no final da apresentação pública, o professor e antigo ministro da Economia Augusto Mateus defendeu que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem sido uma peça fundamental na construção da democracia, mas que o país ganharia se soubesse "fazer futuro" e pensasse estrategicamente os próximos 20 anos.

"A saúde é tão importante que nós não podemos tolerar na saúde ineficiências, desigualdades, iniquidades, e, portanto, o que nós propomos são dez princípios para tentar dar um sentido mais estratégico, de mudança tranquila, mas forte, em direcção a melhor satisfação", explicou.

Segundo Augusto Mateus, o princípio base são os serviços de saúde e os seus destinatários, que são os doentes. "Doentes que são cidadãos portadores de direitos e não meros consumidores", sublinhou, acrescentando que isso justifica a construção de um sistema mais coerente, com o SNS no "coração".

Augusto Mateus adiantou que esta proposta visa "aproveitar tudo aquilo que o país tem de bom", seja no sector privado, no sector social ou até mesmo no voluntariado.

Os dez princípios orientadores vão desde um sistema de saúde centrado no cidadão, a cidadãos e representantes dos doentes com maior participação ou a maior ênfase à educação para a saúde e prevenção da doença. Os 44 subscritores defendem, por outro lado, que para o financiamento do SNS seja desenvolvida uma lei de meios que preveja as despesas e as receitas correntes, apontando que o subfinanciamento "crónico" exige orçamentos plurianuais.

Sugerem que sejam alargadas as formas de prestação e de gestão dos serviços de saúde e que, apesar da primazia do sector público, as instituições privadas e sociais continuem a contribuir em complementaridade. "Na efectivação do direito à saúde, o Estado deve actuar através de serviços próprios e por via de acordos com entidades privadas e sociais e complementar a sua actividade com o restante sector privado e social da área da saúde", lê-se no documento que foi distribuído.

Defendem também o apoio ao envelhecimento activo, o acompanhamento e tratamento das doenças crónica e mental, bem como o apoio à investigação e desenvolvimento científico.

Questionado sobre de que forma este sistema de saúde seria financiado, Augusto Mateus apontou que o cidadão já paga cerca de dois terços por via os impostos e o restante directamente. Sublinhou, por outro lado, a necessidade de orçamentos plurianuais, "que permitam que haja mais equidade, mais eficiência e menos desperdício". "E mais liberdade para os cidadãos no exacto momento em que eles também têm de se tornar mais responsáveis pela sua própria saúde", defendeu o antigo ministro.

Durante a apresentação, a presidente da EVITA - Associação de Apoio a Portadores de Alterações nos Genes Relacionados com Cancro Hereditário, Tamara Milagre, defendeu que as futuras alterações à lei de bases não sejam feitas sem ouvir os doentes e que o financiamento vise, em primeiro lugar, a prevenção.

O ex-ministro do Trabalho Bagão Félix, por seu lado, apontou que o excesso de ideologia é que tem tornado a saúde refém do imobilismo, defendendo que o Estado seja o garante do sistema de saúde, mas não seja o seu único fornecedor.

Várias propostas

Esta iniciativa vem juntar-se a outras já conhecidas, como a promovida por um grupo de personalidades de esquerda que defende o fim das taxas moderadoras e financiamento adaptado às necessidades comunicadas pelos hospitais e centros de saúde. Já antes António Arnauth, histórico do PS e autor da lei que criou o SNS em 1979, e João Semeado, médico e ex-dirigente do Bloco de Esquerda, tinham apresentado uma proposta de lei de bases da saúde em forma de livro e onde defendiam também o fim das taxas moderadoras e das parcerias público-privadas (PPP).

Na sequência deste livro, o Ministério da Saúde criou um grupo liderado pela ex-ministra da Saúde Maria de Belém Roseira com o objectivo de rever a lei de bases da saúde.

Em Abril o Bloco de Esquerda apresentou uma proposta que defende a exclusividade dos profissionais, o fim das PPP e das taxas moderadoras. Entre as medidas inscritas está a ainda uma que pretende assegurar que os tratamentos iniciados não são interrompidos caso os plafonds dos seguros de saúde se esgotem.

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