Esclerose lateral amiotrófica melhorou com mutação genética desactivada
A doença neurodegenerativa surgiu mais tarde, a função motora melhorou, a atrofia muscular abrandou e a sobrevivência aumentou – são os resultados de experiências de edição genética em ratinhos.
Uma equipa de cientistas dos Estados Unidos usou a técnica de edição de genes CRISPR-Cas9 para desactivar, em ratinhos recém-nascidos, uma mutação genética que está associada a 20% das formas hereditárias da esclerose lateral amiotrófica (ELA, na sigla em inglês). As experiências, in vivo, tiveram como alvo uma mutação dominante (no gene SOD1) e os resultados publicados na revista Science Advances permitem encarar esta abordagem como uma estratégia viável para tratar a ELA, que é uma doença neurodegenerativa progressiva, rara e sem cura.
David Schaffer, do Departamento de Bioengenharia da Universidade da Califórnia, em Berkeley (nos EUA), coordenou o projecto que mostra como a edição genética pode melhorar a função motora e aumentar a sobrevivência de ratinhos com ELA. Não se trata de uma cura mas de um possível tratamento que parece atenuar os sintomas desta doença incapacitante, que é caracterizada por um progressivo enfraquecimento muscular que acaba por levar à paralisia e morte. Apesar de ser uma doença rara, em Portugal é conhecida por ter sido esta a doença que teve o cantor Zeca Afonso. Mas, talvez mais do que essa ligação com o compositor português, a ELA ficou conhecida mundialmente através do desafio do “balde de gelo”, que “gelou” figuras públicas em muitos países para chamar a atenção para esta doença e angariar apoios para as associações que apoiam os doentes.
Neste estudo, os cientistas usaram um vírus como “meio de transporte” da tesoura molecular (Cas9), que conseguiu penetrar na espinal medula até chegar aos neurónios motores afectados pela mutação genética. Assim, no final da experiência, os ratinhos recém-nascidos com ELA e com a mutação no gene SOD1 desactivada tinham mais 50% de neurónios motores, a doença surgiu mais tarde e registou-se um aumento médio de 25% na sobrevivência dos animais quando comparados com o grupo de controlo.
Os bons resultados obtidos não impedem, no entanto, que os próprios autores do artigo científico admitam algumas das limitações deste trabalho que, antes de passar para uma fase pré-clínica ou clínica, terá ainda de esclarecer alguns problemas detectados nesta fase. Além de alguns efeitos por explicar, faltou ainda testar algumas variáveis importantes como, por exemplo, a administração desta terapia genética em ratinhos adultos. Já para não falar nas muitas e diversas experiências que terão de ser feitas com outros modelos animais até chegarmos perto das pessoas e de uma possível aplicação da técnica na prática clínica. Porém, notam os cientistas, o benefício terapêutico da CRISPR-Cas9 na ELA ficou demonstrado em ratinhos e está aberto o caminho para explorar esta abordagem nesta e noutras mutações associadas à doença.