Um verão lituano

A nostalgia evocativa de um amor de juventude: O Verão de Sangaile é um filme melódico, escorreito, num tom menor tão franco que toda a simpatia é permitida.

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Uma sensualidade eficazmente captada: O Verão de Sangaile

É entre as alturas, os aviões de acrobacia aérea com que o filme começa e a protagonista Sangaile sonha, e as profundezas, a canção que fala do fundo do lago, o lago propriamente dito, o peixe a que um grupo de adolescentes saca as entranhas, que se joga O Verão de Sangaile, segunda longa-metragem da lituana Alante Kavaite. Esta dicotomia, discretamente sugerida pelo filme, representa porventura aquele momento em que a adolescência se ganha ou se perde, e se se “passa” bem à idade adulta ou não. Mas esse é o tema do filme de Kavaite, muito típico na sua explanação, mas feito com a delicadeza suficiente para que a sua menoridade e, de certa forma, previsibilidade, se vejam mais como atributos de carácter do que como defeitos.

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O laconismo, os diálogos por norma breves e cheios de silêncios e não ditos, a livrar o filme de efeitos retóricos, e uma sensualidade eficazmente captada, que tanto tem a ver com as personagens, as duas raparigas que vivem um amor de verão (cuja inconsequência assinala, por assim dizer, a despedida da adolescência), como com a maneira como o filme integra a indolência tristonha do “verão lituano”, aquela espécie de meia-luz feita de dourados pálidos.

Kavaite, que até já viveu e filmou em França, parece situar o seu filme algures entre Mia Hansen-Love (a nostalgia evocativa de Um Amor de Juventude, por exemplo) e  A Vida de Adèle, de Kechiche, pela relação homossexual, bem menos “bruta” mas certamente mais púdica (ou, pelo menos, mais tímida, como se vê nos planos de sexo propriamente dito), tudo unido pela forma como constrói, em filigrana, o que parece ser um olhar sobre esse estranho país que é a Lituânia pós-soviética (as alusões às questões de classe, a presença da arquitectura, etc).

Enfim, resulta num filme bastante melódico, bastante escorreito, num tom menor tão franco que toda a simpatia é permitida.

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