As drogas estão mais puras e isso é pior para os consumidores

Relatório anual do Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência apresentado nesta quinta-feira em Lisboa.

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A cannabis nunca foi tão potente, a heroína nunca foi tão pura, o ecstasy nunca teve tanto MDMA. As drogas ilícitas que circulam na Europa estão mais fortes e isso aumenta os riscos para quem as consome, alerta o relatório anual do Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (OEDT).

A potência e a pureza dependem de que droga se está a falar, diz André Noor, perito do OEDT, mas a tendência está a afectar todas as de uso comum na Europa.

Não são suaves os 130 canabinóides sintéticos até agora detectados pelo sistema de alerta rápido da União Europeia. A cannabis herbácea que se produz, a nível doméstico, na Europa, tem maior teor de THC. E, em resposta, Marrocos, de onde provém a maior parte do haxixe, está a intensificar o seu produto.

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As últimas estimativas das Nações Unidas continuam a sugerir um aumento substancial de produção de ópio e é de lá que vem a maior parte da heroína consumida no espaço comunitário. Há sinais evidentes de alteração de rotas e de inovação técnica, de que o exemplo mais flagrante é a detecção de dois laboratórios de transformação de ópio em heroína em Espanha.

Até agora, nada indica que o aumento do ópio disponível esteja a fazer reverter a quebra no consumo de heroína iniciada já há alguns anos. Contudo, o facto de haver mais produto disponível no mercado suscita maior preocupação com a saúde dos consumidores, já que faz crescer o risco de overdose entre quem está habituado a usar uma determinada dose de pior qualidade. E o perigo aumenta quando se combina com benzodiazepinas ou outros depressores do sistema nervoso central.

Até o ecstasy, de produção interna, está a chegar aos mercados europeus com uma maior percentagem de MDMA. Pela má fama que este tipo de substância tem, os novos comprimidos são vendidos com diferentes cores e desenhos para se distinguirem. Na sequência de uma série de mortes, o OEDT e a Interpol emitiram no ano passado vários alertas de saúde pública.

O aumento da pureza e da potência das drogas ilícitas mereceu diversos comentários na apresentação do relatório anual, que decorreu durante a manhã desta quinta-feira, em Lisboa. Atrás desse fenómeno estão a inovação e a concorrência, resumiu Wolfgang Gotz, director do OEDT.

“A qualidade das drogas sintéticas é fortemente conduzida pela disponibilidade de químicos precursores”, explicou. “Pela primeira vez, temos dados sobre apreensões e carregamentos abortados. Os dados confirmam que quer substâncias controladas, quer não controladas são usadas na produção de drogas sintéticas. No que diz respeito à concorrência, a disponibilidade de novas substâncias parece desempenhar um papel. Nalguns países, a alta qualidade das catinonas e canabinóides sintéticos representam uma alternativa real às drogas tradicionais de baixa qualidade e mais elevado preço.”

“Estamos confrontados com um mercado de drogas globalizado, em rápida mudança; e, por isso, é necessário estarmos unidos, sermos rápidos e determinados na nossa resposta face a esta ameaça”, diz o comissário europeu responsável pelas Migrações, os Assuntos Internos e a Cidadania, Dimitris Avramopoulos.

Só no ano passado, o sistema de alerta rápido da União Europeia detectou 101 novas substâncias psicoactivas — 31 catinonas sintéticas e 30 canabinóides sintéticos. Ainda um ano antes contara 81. Isto eleva o número de substâncias detectadas para 401, lembrou o comissário.

“A velocidade com que as novas substâncias podem aparecer e ser distribuídas é particularmente desafiante”, comentou. “Para lidar com essas substâncias, a Comissão Europeia avançou com uma proposta que irá reforçar o actual quadro legal. É essencial que o Conselho e o Parlamento Europeu se movimentem no sentido de adoptar essa legislação; irá reforçar as nossas respostas e equipar-nos com melhores instrumentos para lidar com estas drogas.”

Na mesa também estava João Goulão, presidente daquela agência europeia. “Esta 20.ª análise do fenómeno da droga na Europa revela as mudanças que ocorreram desde o primeiro relatório do OEDT, publicado em 1996, e mostra até que ponto a agência melhorou o seu conhecimento desta questão”, disse, em jeito de balanço. “A complexidade do fenómeno da droga é agora muito maior, com muitas das substâncias que estão hoje em destaque a serem praticamente desconhecidas dos consumidores há duas décadas.”

Segundo explicou o médico, as fronteiras entre novas e velhas drogas são cada vez mais ténues. “As novas substâncias imitam cada vez mais as drogas controladas.” Tudo isto lhe parece importante para saber a “política de que iremos necessitar amanhã”.

 

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