“A França não chora, mantém-se de pé”, diz Hollande nos funerais dos polícias mortos
Homenagens em Paris e em Jerusalém às vítimas dos atentados da última semana. "Judeus não podem ter medo de andar na rua na Europa", diz Presidente israelita.
Na sede da polícia parisiense, o Presidente François Hollande concedeu a Legião de Honra a título póstumo – a mais alta condecoração da República – aos três agentes mortos nos ataques da última semana. Ahmed Merabet e Franck Brinsolaro, mortos pelos irmãos Kouachi durante o ataque ao Charlie Hebdo, e Clarissa Jean-Philippe, abatida por Amedi Coulibaly num tiroteio em Montrouge no dia seguinte, foram elogiados por Hollande. “Eles morreram no cumprimento da sua missão, com coragem, bravura e dignidade. Eles morreram para que pudéssemos viver em liberdade.”
No discurso que proferiu no pátio da Prefeitura da Polícia – “local que simboliza a ligação entre a República e a polícia” – Hollande dirigiu-se também aos familiares das vítimas para dizer que “toda a França partilha” a sua dor.
Às homenagens seguiram-se as declarações de força, dirigidas a um país em sobressalto e em alerta perante possíveis novas ameaças, mas mais forte e unido depois das marchas de domingo. “A França mostrou a sua força face aos fanáticos, a sua unidade face aos divisores, a sua solidariedade às vítimas do terrorismo”, disse Hollande.
“A nossa bela e grandiosa França não chora nunca, mantém-se de pé”, garantiu o Presidente, voltando a insistir na união, “a arma mais sólida [dos franceses]”.
Nos arredores de Paris, o cemitério muçulmano de Bobigny recebeu uma cerimónia mais modesta, mas igualmente emotiva. Ahmed Merabet, o polícia muçulmano de 40 anos que foi morto à queima-roupa por Said Kouachi, foi homenageado por centenas de pessoas que gritavam “Allahu Akbar” – ironicamente, o mesmo grito lançado pelos irmãos Kouachi enquanto matavam o agente.
Não escolher Israel pelo medo
Em Jerusalém, os quatro judeus mortos durante o ataque à mercearia kosher (que vende alimentos que respeitam a lei judaica) também foram homenageados. Cerca de duas mil pessoas compareceram ao funeral no cemitério de Har HaMenuhot. O Presidente israelita, Reuven Rivlin, adoptou uma postura mais moderada em comparação com o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, notava o Le Figaro.
Em causa estão as declarações de Netanyahu, também presente na cerimónia, que no fim-de-semana encorajou os judeus que vivem em França a emigrarem para Israel, para fugir à ameaça do extremismo islamita. Rivlin, por contraponto, apresentou Israel como uma terra que deve ser escolhida pelo amor e não pelo medo.
“A terra dos vossos antepassados não deve ser alcançada no desespero ou na aflição, como consequência das destruições, do terrorismo ou do medo. A terra de Israel é a terra da fé, queremos que a escolham pelo amor”, afirmou o Presidente durante a cerimónia fúnebre no cemitério de Har HaMenuhot.
França tornou-se em 2014 no país de onde o maior número de judeus tem partido para Israel. No ano passado um número recorde de sete mil judeus franceses emigraram para Israel – o dobro do registado em 2013, segundo a Agência Judaica, e o dobro dos judeus norte-americanos que fizeram o mesmo. A organização previa, ainda antes dos ataques, que durante este ano perto de dez mil judeus franceses rumassem a Israel.
No ataque à mercearia judaica na Porta de Vencennes, na sexta-feira, foram mortos quatro judeus: Yoav Hattab, Phillipe Braham, Yohan Cohen e François-Michel Saada, cujos corpos chegaram durante a madrugada a Israel.
A comunidade judaica em França tem merecido uma atenção especial por parte das autoridades, que receiam novos ataques. Na segunda-feira, o Ministério do Interior mobilizou milhares de soldados para reforçarem a segurança das mais de 700 escolas judaicas e lugares de culto em todo o território.
“Não podemos permitir-nos que em 2015, 70 anos depois do fim da II Guerra Mundial, os judeus tenham medo de andar na rua na Europa com a kippah [adereço para cobrir a cabeça utilizado pelos judeus praticantes] ou os tzitzit [franjas do talit que representam os mandamentos]”, declarou Rivlin. Em representação do Governo francês, a ministra Ségolène Royal afirmou que o anti-semitismo “não tem lugar em França”.